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Filippo Fontana


O cheiro de água marinha estava impregnado em minhas narinas. A minha garganta queimava muito e nunca havia me sentido tão desnorteado quanto estava. Não conseguia me lembrar muito do que tinha acontecido depois do tiro, mas lembro do baque na água e que lutei com todas as forças pra me manter acordado e nadar em busca de terra firme. A dor do tiro era insuportável e a cada braçada minha contra as ondas que me acertavam, tornavam a batalha por me manter consciente ainda mais difícil.

Moretti estava com grandes problemas agora. Não sabia com quem estava se metendo e seria um prazer ter de acabar com ele. A quantidade de ilhas que ele comandava não chegava a um terço do número de homens que eu tinha só em Nápoles. 
Eu o destruiria.

Quando abri os olhos, um cheiro adocicado diferente daquele que estava grudado em mim, me invadiu. Era delicado, era floral, era... feminino.

Eu estava numa cama pequena, num cômodo pequeno e bastante simples. Tinha um guarda-roupas ali, uma pequena penteadeira com inúmeros produtos de beleza e algumas fotos penduradas num arame cheio de luzes LED. 

Uma dor intensa e aguda fez com que eu voltasse a atenção para a minha barriga e surpreso, caí em mim. Tinha conseguido nadar o suficiente para me salvar e me encontraram!

Com uma certa dificuldade, fui me sentando cautelosamente, vendo que o ferimento estava sendo tratado e uma gaze o cobria. Estava vestido com outras roupas, um pouco mais largas do que as minhas e olhei em volta mais uma vez, buscando em minha mente algo que me lembrasse aquela casa.

Uma vertigem me tomou quando me coloquei de pé e tive de me apoiar nos móveis e paredes, até conseguir alcançar uma porta. Uma mulher loira estava de costas pra mim e fazia seus afazeres domésticos, sem notar que eu estava ali. Limpei a garganta, tentando aplacar um pouco da sensação de formigamento da água salgada que sentia e disse:

- Onde eu...

O grito dela me assustou e estremeci, sentindo ainda mais dor no local do tiro. Levei a mão livre até a área, enquanto a mulher deixava um prato cair e se estilhaçar inteiro sobre seus pés. Seus olhos me encararam desconfiados, preocupados e ouvi passos ansiosos se aproximando, então uma outra mulher apareceu e mais do que prontamente, se colocou diante da outra, erguendo o queixo e me fazendo piscar surpreso.
A loira era linda pra caralho e por mais delicada que fosse, não pensou duas vezes antes de proteger a outra, que notei terem traços parecidos com os dela. Imaginei que fossem irmãs ou até mãe e filha, dependendo da idade da outra.

- Onde... onde eu estou?

Dei mais um passo na direção delas, mas a dor piorou e me apoiei na parede. A vertigem também se intensificou e fechei os olhos, respirando fundo e soltando um gemido dolorido. A loira se aproximou, tocando em meu peito, espalmando sua mão macia na altura do meu coração e encontrou meus olhos. 
O cheiro do quarto definitivamente era o cheiro dela e combinava com o que parecia ser. Seus olhos eram azuis, azuis como o céu e não consegui desviar os meus:

- A febre voltou. - Sua voz soou preocupada - Volte pra cama.

- O que?

Aquilo soou como ordem.

 Será que não sabiam quem eu era? Onde diabos eu estava? Ainda era dentro da Itália, já que falava comigo na minha língua natal. A maneira com que a mulher atrás dela tinha me olhado, demonstrou um certo receio, um certo... medo. Até pensei que soubesse que eu era um Fontana, mas aquela loirinha mandona ali, não tinha o mínimo de desconfiança no olhar.

Mais que Negócios - Duologia Família Fontana - Livro IIOnde histórias criam vida. Descubra agora