Diagnóstico

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Confusa e ainda um pouco tonta me esforcei em sentar para entender o que estava acontecendo.
— Olá Celeste, sou o Dr. Wilbert Clínico geral e Reumatologista. – disse um médico que estava cuidando de mim
— Muito prazer, dr. Wilbert. O que exatamente aconteceu? A última lembrança que tive era de estar na sala de aula.
— Há algo que você possa estar sentindo que talvez esteja se passando?
— Ainda cedo acredito ter tido um ataque de ansiedade. Me sentir   tonta e com dificuldade para respirar, nada fora do normal.
— Fizemos alguns exames em você, como hemograma e o FAN, acreditamos seja algo mais grave que um ataque de ansiedade.
— Mas.. o FAN é um exame útil para diagnosticar doenças autoimunes. – respondo preocupada
— Correto, percebemos que seu sistema imunológico está atacando as células do próprio corpo.  Gostaríamos da sua permissão para realizar uma biópsia renal, para identificar se existem lesões inflamatórias nos órgãos, que possam estar sendo causadas pelo lúpus.
— Irei te poupar, sou portadora do lúpus. — Me informe por favor quem é o médico responsável pela senhorita e como tem sido o tratamento.
— Recebi o diagnóstico há aproximadamente dois anos e meio. Preciso checar o nome do médico, na verdade não me recordo.
— Mas a senhorita não tem sido acompanhada?
— Cheguei a fazer uso de alguns medicamentos mas não levou muito tempo, os sintomas pararam de incomodar, eram suportáveis. Até pretendia voltar ao médico mas estourou a pandemia e fui deixando pra depois.
— São quase 2 anos.
— Exatamente.
— Agora que sabemos que você tem irei solicitar outros exames. Retorno em breve. Por ora peço que tente se acalmar.
— Vou tentar, desde já agradeço.
—  Tudo bem, posso autorizar que seu acompanhante entre?
— Acompanhante? – me pergunto quem pode ser, mas como desmaiei na faculdade suspeitei que fosse algum professor que veio me acompanhando. – Pode autorizar.

O acompanhante se tratava de uma pessoa inesperada, jamais relacionaria aquela  mensagem que recebi mais cedo com ele aqui agora.
— Olá Celeste. – disse o Alan preocupado – Que susto você me deu, estava te esperando no jardim da escola quando te vi passando desacordada em uma cadeira de rodas.
— Alan? Mas o que você faz aqui?
— Acredito que sou de longe a pessoa mais próxima a você aqui, ninguém melhor que eu para te acompanhar.
—  Claro que sim, obrigada. – segurei sua mão agradecida
— Agora me conta o que aconteceu. – mesmo não estando em meu estado perfeito era inevitável não notar o quanto o Alan estava ainda mais bonito
— Pensei que fosse um ataque de ansiedade mas provavelmente é algo que está se desencadeando por causa do lúpus, sou portadora.
— Já entraram em contato com seu médico?
— A única ocasião que tratei o lúpus foi quando o descobri, sei que fui irresponsável mas a pandemia se iniciou quase no mesmo momento que recebi o diagnóstico, deixei isso de lado por um tempo.
— Então não imagina exatamente o que ele está afetando?
— Não. – olhei para o lado envergonhada – É verdade quando dizem que os profissionais de saúde vivem no hospital mas não se cuidam como deveriam. – tento fazê-lo rir
— Quem é o médico da sua família?
— Meu pai. – sem me conter caio na gargalhada – Desculpe, foi inevitável. Mas não sou de ir a nenhum médico específico, geralmente eu só fico gripada.
— E como descobriu o lúpus?
— Precisei fazer exames para trabalhar.
— Ual, irei ligar para o seu pai.
— Por favor não, é que eles estão sobrecarregados, o Conner testou positivo para o covid e o meu pai está recusando fazer o teste. Vamos aguardar e ver como as coisas serão, tá bem?
— Tudo bem, irei tentar conversar com os médicos daqui enquanto isso.
— Faça isso.

Não se passou muito tempo até que o Alan voltasse, ficamos conversando sobre as coisas que aconteceram para ambos durante esse tempo distante. Assim que o médico retornou notei uma expressão nova em seu rosto.
— Boa tarde, Celeste. Não imaginava que estava tratando a filha de um querido amigo. – disse o doutor me deixando surpresa
— Então conhece o meu pai.
— Sim, eu e o Alan conversamos um pouco, foi então que me dei conta de quem você é.
— É um mundo pequeno.
— Exatamente! – disse ele apreensivo  – Felizmente já temos os resultados dos exames e podemos agir de forma objetiva.
— E então, como estão as coisas?
— Olha Celeste, você é portadora do lúpus tipo sistêmico quando ele afeta mais os órgãos internos, por isso deve ter aguentado esse tempo todo, por não ser algo mais visível como no caso do cutâneo.
— E quanto às suas suspeitas, qual resultado da biópsia renal?
— Temos um caso de inflamação, uma nefrite. Essas inflamações chegaram até os tecidos renais, a ação de filtragem de toxinas exercida pelos rins estão comprometida. Seu caso é delicado temos uma Classe IV, onde há danos ainda mais severos, com grandes alterações na função renal.
— Meu Deus! – disse Alan assustado
— Qual o tratamento?
— O tratamento da doença em casos mais graves é um pouco mais complexo na tentativa de ajudar a retardar a progressão da nefrite ou a lidar com a perda da função renal. Podemos optar em fazer isso através da diálise ou um transplante. A diálise pode não ser um tratamento definitivo, por outro lado o transplante de um rim saudável pode em certos casos ser uma alternativa ao tratamento de diálise.
— Mas não é algo que se consegue de um dia para o outro.
— Não, não é. Ainda mais aqui em um país diferente.
— Então a diálise é o que nos resta?
— Não exatamente, há uma chance de podermos adiantar o transplante. Em seu país há um projeto que tende a acelerar esse processo, chama-se transplante pareado. Enquanto você está recebendo um rim tem alguém disposto a fazer uma doação por você, trata-se de um transplante simultâneo, essa é uma exigência do transplante pareado justamente porque os pares que vão trocar os órgãos não tem vínculo de parentesco e mal se conhecem.
— Mas quem faria isso por mim? Ninguém além do Alan sabe o que estou passando. – assustada encarei o Alan preocupada – Alan.. você não… – comecei a chorar descontroladamente. Desde que conheci o Alan tem feito coisas por mim do qual jamais poderei retribuir, um transplante seria demais para mim.
— Sei que é um assunto delicado demais, mas o receptor que encontramos já está internado há 15 dias. Ele concordou a fazer isso, mas precisamos agir logo.
— Pode solicitar a transferência, irei conversar com ela. – disse o Alan

Levou um tempo até que eu conseguisse olhar para o Alan, ele esperou pacientemente.
—  Uma vez eu li que uma única pessoa pode salvar mais de oito vidas e desde então organizei alguns documentos autorizando para que caso ocorresse de não puder responder por mim que sou um doador de órgãos. Então se isso for te convencer, doar meu rim aconteceria mais cedo ou mais tarde. Mas a verdade é que saber que estarei fazendo isso por você me torna ainda mais feliz, então por favor aceite.
— Não é como se você estivesse me dando algo que eu possa te devolver mais tarde, jamais poderei retribuir.
— Sim você poderá, desde que me garanta que viverá sua vida da maior forma possível para mim estará retribuindo.
— Obrigada. – respondi imensamente grata

Através dos seus Olhos (2022)Onde histórias criam vida. Descubra agora