Na primeira vez que enfrentei uma crise ela havia deixado mais do que sequelas, perdi alguém importante para mim, o meu pai. E agora pela segunda vez a crise que enfrentamos está ameaçando tirar o meu melhor amigo de mim. Por um tempo acreditei que conseguir o cargo de diretor era tudo o que me interessava, mas cada segundo me provava o quanto estava errado. Queria estar perto do Miguel, tratá-lo e não parar enquanto ele não apresentasse melhoras.
Assim que recebi o resultado negativo fui visitá-lo, não esperava encontrá-lo tão desgastado e abatido era quase impossível o reconhecer.
— Que alívio te ver, estava preocupado em ter te contaminado. – disse ele com bastante dificuldade
— Você vai sair dessa, me de um tempo para estudar seu quadro. – comecei a examinar o prontuário
— Deixa isso no lugar que estava. – ele respirou fundo ficando irritado – Todos tem feito o seu melhor, a Audrey está me acompanhando e sabemos o quanto ela é capacitada.
— Tudo bem. – coloquei o prontuário no lugar que estava – Queria poder ajudar.
— Então deveria voltar ao trabalho, o desgraçado do Moura teve o mesmo privilégio que eu em se contaminar, garanto a você que ele não vai sair dessa. Esse cargo é seu, não vai precisar perder tempo com a insuportável da Celeste.
— Para com isso Miguel! – o censurei – Isso é coisa que se diga? Não quero esse cargo a custo da vida de uma pessoa, muito pelo contrário, espero consegui-lo de maneira justa. Estou tão preocupado com o Moura, quanto estou com você.
— O quê? A louca da Celeste fez lavagem cerebral em você? Não consigo acreditar no que estou ouvindo. – disse ele após apresentar ainda mais falta de ar
— Vamos ter que aumentar ainda mais o seu oxigênio, se continuar dessa maneira talvez seja preciso…
— Não! Já disse que não quero entrar em um coma induzido.
— Rejeitar opções que irão te proporcionar melhorias vai acabar te custando a vida. Por causa do seu quadro clínico, um infarto não está descartado. – acionei o botão de emergência para que a Audrey viesse cuidar dele – Volto mais tarde.Após sair da sala onde o Miguel estava, fiz uma breve visita ao Moura que não estava disposto a conversar. Ele claramente achava que eu me sentia satisfeito em vê-lo naquele estado. Caminhei por um pouco no hospital na esperança de que pudesse me sentir melhor, tentei voltar a trabalhar mas nada me fazia sentir mais leve. Estava me sentindo sufocado, prestes a explodir. Cheguei a conclusão de que voltar para casa seria o melhor a fazer nessa situação.
No estacionamento encontrei com a Celeste um pouco inquieta enquanto olhava o motor do seu carro.
— Está tudo bem aí? – perguntei ao me aproximar
— Está sim, é só um barulho estranho, irei resolver isso depois. – ela entrou no carro para ir embora
— Espera um pouco. – a impedir com um olhar mais do que cansativo, me sentia destruído – Pode ser perigoso dirigir com esse barulho, vamos no meu carro.
— Não precisa, já aconteceu outras vezes, não foi nada grave.
— Por favor.. – implorei com a voz cortada – Ainda está disposta a carregar esse fardo comigo? – chorei me sentindo arrasadoImediatamente a Celeste saiu do carro e foi até mim, mesmo ciente de todo risco e que deveríamos manter o distanciamento ela passou a mão em meus ombros ao me oferecer apoio, até que por fim me abraçou. Fazia um tempo que não sentia o toque de alguém, mesmo assim sentir a Celeste não era algo estranho, era consoladoramente confortável. As mãos que antes estavam nos meus ombros haviam repousado nas minhas costas e acariciava os meus cabelos levemente.
— Vamos sentar aqui um pouco. – disse ela ao me guiar até o capô do carro
— Me desculpa por antes, estou agindo feito um idiota. Você só estava tentando me ajudar, e como não sou do tipo que costuma receber ajuda não sabia como reagir, sem querer acabei te magoando.
— Você sempre age como um idiota mas é verdade dessa vez se superou. – ela me olhou doce – Vai mesmo ficar bem se voltar para casa? Tem certeza que não quer ficar aqui com o Miguel?
— Na verdade queria ficar aqui, só não gostaria de vê-lo morrendo e não poder fazer nada para mudar.
— Ele está tão mal assim?
— Ele está recusando os tratamentos mais agressivos, mesmo que os que ele tenha recebido apresentando alguma melhora não seja o suficiente.
— Talvez possa fazer ele mudar de ideia.
— O Miguel está irrefutável.
— Sendo assim, tenha em mente que você fez a sua parte, por mais difícil que seja agora não depende mais de você.
— Não consigo acreditar que ele está agindo assim. – olho para cima irritado
— Deveria, você é quem mais o conhece bem. Sabe o quanto ele é teimoso e determinado, ou já se esqueceu do plano de vocês?
— Miguel tem as melhores ideias, mesmo as vezes sendo um pouco absurdas.
— Eu sou um absurdo pra você?
— Não foi o que eu quis dizer. – me vejo rindo ao lado dela
— Não esqueça que ainda falta a sua segunda dose, não terei piedade dessa vez.
— Você não faria isso.
— Faria, e como faria. – ficamos em silêncio por um tempo enquanto nos olhávamosSe ela pudesse ver através daquela máscara, sem dúvida veria um homem corado e morrendo de vontade de poder beijá-la.
Logo nosso silêncio foi interrompido por passos pesados e nervosos, era a Audrey. Nos olhando assustados sem saber por onde começar a falar.
— Javier… – disse ela
— O que foi? Porque está assim?
— O Miguel…Nem foi preciso que ela terminasse de falar, as lágrimas que começaram a cair dos seus olhos denunciaram uma notícia triste. Sem sentir a força necessária em minhas pernas para me manter em pé, ajoelhei no chão e comecei a chorar e gritar. Ainda desesperado, vi a celeste fazer o mesmo, ela se ajoelhou de frente para mim e segurou as minhas mãos que batia fortemente no chão e chorou comigo. Mesmo não sendo amiga do Miguel, a Celeste estava sofrendo por me ver sofrer, a minha dor era a dor dela.
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Através dos seus Olhos (2022)
RomanceApós a crise econômica afetar a vida de muitos na Venezuela um médico ambicioso tem a oportunidade de conquistar a vida que tinha antes quando aceita a ajuda do seu antigo professor para se mudar para o Brasil. Quando tudo parece estar voltando aos...