Capítulo 1 Parte 1 (Rascunho)

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"E as trevas, a decadência e a morte vermelha detinham domínio ilimitado sobre todos."

Edgar Allan Poe.

O pequeno Pedro perambulava pelas ruas da cidade, ignorando o vento gelado que o açoitava. Como sempre, quase não havia pessoas andando e, muitos dos que passavam, pareciam-lhe bastante estranhos, caminhando sem vontade, sem energia, imersos em uma apatia completa e isso lembrou o garoto de apenas cinco anos que não estava nada feliz com o rumo da sua vida.

O pai também mudara, começando a ficar desse jeito apático. A criança era o oposto disso, enérgica, altiva e muito ativa. Gostava de sair, em especial quando os pais ficavam em casa conectados ao computador sem fazerem mais nada; isso, naqueles dias, era uma constante.

Nessas horas, preferia passear pelo bairro nas ruas quase desertas, em geral indo para o espaçoporto olhar alguma das raríssimas naves que pousavam na Terra. Em uma semana ele faria seis anos e teria de ir à primeira visita no centro genético e de treino. Lá, seria avaliado e receberia os conhecimentos da escrita, tanto a terráquea quanto a língua galáctica. No entanto, já sabia ler há mais de um ano. Ele via livros no computador de mão da mãe; gostava tanto que aprendeu sozinho.

A sua mãe, quando o viu lendo – naquele tempo ainda não vivia tão apática –, ficou assustada e pediu ao filho que jamais revelasse o seu saber. Pedro não sabia o motivo, mas acatou o desejo da mãe sem pensar duas vezes porque confiava nela.

Já havia percorrido quatro quarteirões e faltavam dois para chegar à periferia do espaçoporto. Olhava os caminhos desoladores, lugares feios e descuidados, canteiros cheios de ervas daninhas ou tão espezinhados que não passavam de um pedaço de terra batida no calçamento em mau estado. Passou à frente de um mercado que, como todos os locais desse gênero era mais conservado, em especial pelos robôs das lojas. Entrou, uma vez que estava com sede. Pegou uma garrafa de água e dirigiu-se para a saída. No caminho, viu um refrigerante que gostava muito, mas aquele não era um item livre e ficava no setor que exigia confirmação por bracelete. Desde que o pai perdera o emprego, eles só tinham direito aos itens livres. Encolheu os ombros e, altivo, foi para o espaçoporto. Teve sorte porque, naquele momento, uma nave pousava a menos de cinquenta metros da cerca. Era grande, talvez umas dez vezes maior que a casa dele e, também, bem alta, umas três vezes a sua casa, no mínimo. O formato era estranho, como um corpo que lembraria uma águia com asas curtas e um bico inclinado para baixo, onde, na parte superior, estava uma janela grande e que devia, segundo Pedro imaginou, ser de onde se pilotava aquela nave. Havia três foguetes, um em cada asa e um na cauda, que se moviam apontando para trás, para baixo ou para a frente. Mas o que o menino não entendia − e quebrava a cabeça para compreender –, era como a nave descia devagar e não caía, se estava com os foguetes desligados. A sua curiosidade nata fê-lo imaginar como isso podia acontecer e procurou possíveis soluções, mas os parcos conhecimentos que possuía eram incapazes de lhe dar alguma luz a respeito, deixando-o mais curioso do que nunca. Ouviu um suspiro e olhou para o lado, onde um senhor de barba branca também observava a nave descer. Imaginou que o velho teria os seus duzentos anos; ele olhou para Pedro e, sorrindo, disse:

– É linda, não é, meu garoto? – perguntou, bonachão. Não esperou resposta e continuou, com um tom de saudades. – Quando eu era mais jovem, pilotava uma dessas. Eu adorava voar entre os mundos, levando mercadorias pelo espaço e conhecendo todo tipo de planetas e pessoas.

– Por que ela não cai se os motores estão desligados? – perguntou o pequeno, sem se conter.

– Você é esperto e observador, garoto. – O velho riu. – Não cai porque esse modelo tem controle da gravidade. No meu tempo não era assim.

– Gravidade? – Pedro olhou para ele, espantado. – O que é isso?

– Gravidade é como uma força que nos puxa para baixo, mas essa nave sabe reduzir essa força e não cai.

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