Estava em frente ao espelho quando Hanna notara sua feição paralisada.
Seus cabelos estavam engrenhados, espalhados pelo redemoinho do vento que se formara ao redor dela quando a mesma correra ao banheiro do hospital. Os fios negros caiam sobre seus olhos, bocas e testa, mas ainda havia uma breve aparição de seu nariz, que tinha sua ponta vermelha de tanto coçá-lo.
Seus lábios mantinham-se entreabertos desde que ouvira morte. Não foram essas as palavras do Doutor, mas ela estava lá, entre os miúdos espaços das letras, se escondendo, como se a verdade fosse um crime.
E era o que Hanna queria, na verdade. Queria que fosse um crime sussurrar tal... tal abominação por debaixo e entre as linhas, passando batido, como se estivesse tudo bem.
Não estava tudo bem.
Seus olhos verdes com uma fina película de água entregavam isso. Entregavam todo seu sentimento apreendido até aquele maldito momento.
Apoiara ambas as mãos na pia e encarava-se com pertinência, sem desviar o olhar, até vê-los derramarem gotas e mais gotas de uma chuva salgada.
Sim, estava chovendo. E dentro de sua cabeça, Hanna passava por uma tempestade.
Seus ombros começam a tremer e seus joelhos fraquejam. Há um deslize de segundo e Hanna vai parar no chão, ajoelhada e com os punhos cerrados enquanto soca o ar e a cerâmica que apoia seu corpo.
O grito que escapara de sua garganta era tão doloroso e angustiante que a própria, ao soltá-lo, ficou assustada, mas o ato se repetia, repetia e repetia.
Não se sabe o que aconteceu. Hanna apenas escuta o barulho da porta sendo aberta com brutalidade e, em seguida, ser acolhida pelos braços carinhosos de alguém.
Provavelmente era sua mãe, mas nem isso seu subconsciente conseguia raciocinar direito.
Enquanto gritava, berrava e agarrava-se ao que restava, contra o peito da mãe, chamou em desespero:
- Mãe...!
Seus ombros tremiam muito. Não paravam. Suas mãos também. Sua cabeça estourava em dor com a enxaqueca que começara, mas nem isso fez deixar de ser possível gritar em agonia o nome daquele que presava:
- Peter!
Peter, Peter, Peter! Não importava quantas vezes repetisse, cada vez mais parecia que sua presença ia se distanciando.
A dor em seu peito aumentava e aumentava, dilacerando todo o resquício de paz que sobrara dentro si desde que sentira que estava livre. Sentia que estava começando tudo do zero novamente. Saíra de uma prisão para cair em um abismo maior ainda.
Nem mesmo a dor fora capaz de impedir o agoniante grito escapulir de sua garganta. Hanna estava desesperada.
E Peter morrendo.
***
Num corredor qualquer, sentada numa cadeira qualquer, respirando um ar qualquer, com seus olhos vazios, Hanna encara o chão. Uma mecha de cabelo escuro de sua franja caia sobre seu rosto, mas não fazia questão de tirá-la.
Depois da crise no banheiro, sua mãe deixou-a na cadeira mais próxima, tentando acalmá-la. Apenas horas depois, Agatha pode deixá-la sozinha por um tempo para ir à cafeteria mais perto para comprar algo para que Hanna pudesse comer e beber, talvez a tranquilizando mais.
Hanna sente uma presença se aproximando, mas não desgrudar os olhos do chão até a pessoa sentar-se na cadeira ao seu lado. Com a posição petrificada - punhos entrelaçados um no outro, pernas largadas e com o tronco quase deitado sobre a cadeira -, Hanna mexe minimamente a cabeça para o lado, movimentando os olhos sobre a imagem.
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Só Agora Eu Sei ✓
RomansaDuas almas, dois destinos separados pelo tempo e circunstâncias, mas o fio sempre volta a aproximá-los. Duas almas, agora no mesmo destino. Hanna é uma jovem aprisionada pelos traumas e sentimentos do passado que tenta, a todo custo, sufocá-los e se...