Eu odeio me atrasar pros lugares — na teoria — mas eu sempre acabo cometendo esse mesmo erro, em todos os lugares.
Assim que voltei de viagem, me prometi que faria diferente dessa vez: sem medo, sem autosabotagem e... sem atrasos. Aparentemente, já comecei errado, né?
Meu ciclo vivendo de dança no circo, pelos Estados Unidos, se encerrou já faz uma semana. Desde que cheguei, não consigo parar de pensar em como vai ser minha vida daqui pra frente. Eu sei que tenho apoio financeiro e familiar pra isso, mas sempre fui muito independente em relação a dinheiro. Fora que eu amo viver da dança, amo trabalhar e a possibilidade de ficar parada me deixava aflita.
Mas, como amigos são anjos e eu confio plenamente nisso, eis que um amigo de uma antiga companhia de dança respondeu minha postagem no Facebook com o comentário: "Me chama no inbox que eu tenho a boa pra você! Bem-vinda de volta ❤️"
Mesmo sem saber o que era, enviei prontamente mensagem pra ele, que me trouxe uma proposta divina.
[Uma semana atrás]
— Brunekah, primeiramente: tô muito feliz em saber que você voltou pro Brasil e vamos poder tomar uns açaí atrás da sua casa de novo, como nos velhos temos.
Segundamente: caso você esteja voltando pra casa sem um emprego, eu tenho a boa pra você! Assim que ver essa mensagem, me dá um alô aqui.
Não perdi tempo e aproveitei que ele estava on-line pra dar o retorno a ele.
— Bibis, senti muito sua falta (e dos nossos açaís, claro!). Fico feliz que poderemos passar bastante tempo juntos agora que voltei!
Sobre emprego: voltei pro Brasil pobre & desempregada. Manda a boa! Tô precisando!
Suspirei aliviada quando vi que minha mensagem já havia sido visualizada por ele e que ele já estava digitando.
— Amiga, seguinte! Você lembra que eu fazia parte do ballet da Mc Beyonce? Então, eu fui promovido a coreógrafo dela e, além disso, ela está passando por uma mudança de nome e de marca, já que ela está crescendo bastante e quer ter algo mais parecido com quem ela é. Estamos precisando de bailarinas novas e eu acho que seria uma oportunidade foderosa de você crescer por aqui. E aí, o que acha?
Terminei de ler a mensagem de Bibiu em êxtase. Eu sabia quem era a Mc Beyonce e apesar de acompanhar muito pouco de música, sabia que ela era conhecida por aqui.
— Amigo, nossa! Eu tô muito feliz por ver você crescendo e mais ainda pela possibilidade de trabalharmos juntos. Tô mais certa que você nesse teste!
— Essa é a minha brunekah! Vou te passar as informações da audição pra você se programar, tá? Queria poder te dar uma carona pra facilitar a ida mas eu e a patroa temos algumas coisas pra resolver antes então acho melhor chegarmos separados.
Após Bibiu me passar todas as informações necessárias, vibrei com a possibilidade de conseguir um novo emprego e ainda mais do lado de um cara que admiro como amigo e profissional.
[Dia da audição]
Acordei cedo, organizei a roupa que iria usar e escolhi qual lace iria usar para a audição — afinal, eu quero que impressionar em tudo, né?
Tudo estava caminhando perfeitamente bem. Eu estava orgulhosa e mentalmente satisfeita que havia conseguido me planejar para chegar no horário, com tudo impecável. Mas, não seria Brunna Gonçalves se o improvável não rolasse, né?
Magicamente, todos os táxis desapareceram de Nilópolis. Todos. Eu andava de rua em rua e nada. Enquanto eu embarcava nessa saga do táxi, perdi a noção de horário e me deparei com o cenário que eu tanto temia: eu estava atrasada.
Ao notar o que estava acontecendo, só consegui correr até a estação de trem mais próxima — vulgo 15 minutos correndo porque andando como uma cidadã normal seria quase meia hora — para tentar chegar no local da ocorrência vulgo estúdio da audição.
Após longas crises de ansiedade no vagão, refazer passos cantarolando minha música e quase engolir minhas unha, eu finalmente cheguei. Desci da estação correndo e, pra minha sorte, o estúdio nem era tão longe assim.
Minha empolgação foi tão grande ao chegar que, entrei na sala que aconteceria a audição como um furacão e só notei quando olhei para a sala e vi diante de mim simplesmente ela: a minha futura patroa. Ela me encarava sem esboçar nos seus olhos um sentimento claro, mas dava pra notar que ela me analisava por inteira e que certamente estava dialogando com ela mesma dentro de sua cabeça.
Após me desculpar pela minha entrada, meu atraso e minha falta de educação ao não me apresentar — Sim, eu fui incapaz de falar MEU NOME pra mulher! Que vexame! — me posicionei junto as meninas para então iniciarmos todo o processo.
Eu sabia do meu potencial, sabia que havia ensaiado e que daria conta mas todo esse fuzuê de atraso me deixou desconsertada e apreensiva com o que viria.
Será que essa era a chance de tudo mudar? Ou eu teria estragado tudo?