Capítulo 206

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- Não, não! Você não sai do meu lado! Nós cozinhamos para todo mundo, Caio preparou bebida para todo mundo. Então, a limpeza e organização ficam com o Mathéo, Gael, Timéo, Laurent, Jules, Céline e Élodie! - eu tratei logo de colocar ordem, porque aquele povo estava folgado demais.

- Acho justo! - Gael disse - Vamos, pessoal! - ele se levantou e botou todo mundo para trabalhar ao dividir as tarefas

- Eu amo seu jeito brasileiro! - Gregoire falou rindo

- Não deixaria você cozinhar sozinho e ainda ter que limpar tudo...

Ficamos nós três lá fora enquanto o restante do pessoal limpava tudo. Nós conversamos o tempo inteiro e o pessoal demorou uma vida inteira para limpar tudo. Grégoire se interessou bastante pelo Brasil e nossa conversa foi 100% sobre a cultura brasileira. Ele me fez falar cada detalhe sobre o carnaval carioca. Ele ficou encantado!

Naquela primeira viagem, eu aprendi como, às vezes, as pessoas têm um olhar mais carinhoso para cultura e para o português brasileiro. Nós, aqui no nosso país, muitas vezes preferimos a cultura e a língua de outros, a tal da crise de identidade é coisa séria.

Abrindo parênteses aqui rapidinho... O que eu vou falar agora, não tem de forma alguma a intenção de ofender ou machucar alguém, é só mesmo um ponto de reflexão. Quando eu falo sobre isso, geralmente as pessoas se doem, pois é dificil a gente sair da zona de conforto dos pensamentos e ações protegidos e privilegiados da nossa bolinha (geralmente branca, geralmente hetero, geralmente cis). Se você se identificar com algo, eu te convido a refletir e não a me enviar mensagens grosseiras, tá? Uma outra chamada de atenção, eu falarei muito sobre pessoas heterossexuais, gostaria de deixar que não tenho nada contra. Falo aqui de pessoas heteros, pois em sua grande maioria, são os principais agentes de violências e preconceitos, pois o mundo moderno foi estruturado sobre a heteronormatividade e o patriarcalismo/machismo. Não estou criticando a sexualidade em si, mas sim o poder opressivo que ela tem sobre quem não é hetero. ... Fechando os parênteses.

Enquanto brasileiros presos a ideia da colonização (que na verdade foi uma invasão recheada de estupros, subalternizações, escravização, exploração de corpos e recursos naturais), às vezes, valorizamos mais Portugal do que o nosso próprio país. Esquecemos que Portugal invadiu, explorou, roubou, matou, estuprou, exterminou e escravizou povos indígenas e pessoas africanas. Portugal não é nem de longe uma referência para nós brasileiros (desculpem aos leitores portugueses, não se sintam ofendidos por isso, mas é a realidade). Já tive a oportunidade de conviver com alguns portugueses e eu fiquei besta de ver como eles viam o Brasil (novamente aos leitores portugueses, não estou generalizando, se você não pensa e não age dessa maneira, não estou falando de você). Convivi/convivo com franceses e belgas, a maneira com eles olham o Brasil também não é muito diferente de como os portugueses nos olham, mas, pela minha experiência, Portugal olha com um arzinho de superioridade, com orgulho por eles terem "descoberto" o Brasil. O território brasileiro nunca esteve perdido/escondido para ser descoberto! Eu, sinceramente, teria vergonha de sentir orgulho de uma das maiores crueldades que a humanidade já cometeu. Com os portugueses que eu convivi, todos olhavam o Brasil como o lugar do caos, da putaria, da corrupção, da bandidagem... a mulher brasileira é objetificada. No meu caso, até o corpo do homem gay é objetificado, pois acham que gay brasileiro é fácil de pegar/comprar (e aqui eu não generalizo, essa foi somente uma experiência pessoal). A única coisa que valorizam da mulher brasileira é a bunda, como se ela fosse inteira feita de bunda. Portugal consome a cultura brasileira, música, literatura, novelas, etc... Muito dessa visão estereotipada e negativa que as pessoas têm do Brasil é creditada ao próprio brasileiro que não valoriza nada do que é produzido aqui e é super valorizado fora do Brasil. Aqui, música boa só se for a música da elite. Literatura boa, só se for os grandes escritores (e pasmem, grande parte dos escritores são o quê? Portugueses!). Teatro, só se for grandes peças apreciadas e valorizadas pela elite (que em sua grande maioria é formada por pessoas brancas e heteros). Poesia, só se for os grandes clássicos. Deus nos livre se considerar o slam, a poesia produzida nas favelas. Deus nos livre considerar o funk como música popular brasileira. Deus nos livre considerar a arte de rua como arte. Isso tudo é uma afronta aos grandes e renomados críticos de arte e cultura (de merda!). O Brasil é de uma riqueza dificilmente encontrada em outro lugar! Cabe a nós, brasileiros, valorizar tudo o que é produzido por nós! Cabe a nós não aceitar a maneira como os europeus nos vêem (com um Genocida no "poder" fica difícil, eu sei, maaaas).

Amor que nunca acabará - PARTE 2Onde histórias criam vida. Descubra agora