Capítulo Trinta e Seis

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— SUAS MÃOS ainda estão feridas, Alteza? — Vivian estava lá e tentava ao máximo não prestar atenção em minha nudez

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— SUAS MÃOS ainda estão feridas, Alteza? — Vivian estava lá e tentava ao máximo não prestar atenção em minha nudez.

Ficar longe do luxo do palácio me fez perceber o quão estranho era deixar que outras pessoas me banhassem e me vestissem e vissem minha nudez. Agora era tão desconfortável e desagradável. Não que antes fosse bom, mas agora eu tinha mais consciência da estranheza do hábito.

— Meu Deus! — Exclamou Carolina apertando o meio de minhas costas, gritei de dor. — Que mancha verde horrível!

— Não faça um escândalo, Carolina, pelo amor de Deus!

Carolina arregalou os olhos e eu a empurrei para longe, ela apertava meu ferimento com tanta força. Havia tanto tempo que eu tinha ganhado aquele machucado nas costas que tinha esquecido o motivo dele.

Maldito careca parrudo que me dobrou como papel na areia da praia.

— Como raios não farei um escândalo, Vivian? — Ela se aproximou para mostrar meu ferimento novamente mas Vivian a segurou pelo pulso.

— Você sabe que é grosseiro apontar os ferimentos alheios.

— Ela é uma princesa, não deveria parecer uma paleta de tinta com tantas marcas no corpo!

— É eu sei, mas isso não é da nossa conta!

Eu estava quase dizendo "ainda estou aqui", mas a discussão me parecia interessante de ouvir, nem em Calanthe nem em Anwar eu ouvia criados conversando com esse conforto ao redor de um membro da família real.

Carolina virou-se para mim com preocupação lhe molhando os olhos, suas sobrancelhas deixavam evidente sua aflição e seus lábios, retorcidos para baixo, continham-se no esforço de não permiti-la chorar na minha frente.

— Estão lhe ferindo, Princesa?

— Foi um acidente. — Nem ela nem Vivian pareciam acreditar em mim, Vivian, diferentemente de Carolina, manteve-se calada.

— Tem certeza?

— Tenho. — pigarrei e tive certeza que meu rosto estava vermelho.

Vivian mandou, com um olhar, que Carolina não falasse mais nada. Ela apenas assentiu e terminou de me banhar na água morna, enrolada na enorme toalha, fui até o quarto. Meu corpo doía por inteiro, minhas pernas já estavam fraquinhas e andar era um enorme sacrifício.

Elis estava me aguardando para começar a me vestir.

— Tudo bem se seus ombros e clavículas estiverem expostos? — Assenti e ela sorriu, percebi que tinha covinhas. — Então vamos nos vestir. Carolina, ajude-me com os laços do corpete por favor.

— Sim, madame... — Ela ainda me olhava desconfiada, mas não ousou abrir a boca novamente.

Uma hora depois eu estava sentada na varanda, observando aquela mesa redonda e tentando decidir qual fatia de bolo parecia mais agradável.

Koyran folheava um caderno e anotava algumas coisas, Vitoria estava parada atrás dele e Willian, atrás de mim, parecia um espectro na porta. De repente, senti vergonha de estar com os ombros, pescoço e nuca expostos, sentia-me sendo analisada por cada mínimo movimento que fazia. Provavelmente era o olhar gélido e penetrante de Vitoria encravado em meu rosto ou a respiração pesada de Willian.

Fosse o que fosse, meu único desejo era sair dali, daquela situação medonhamente desconfortável.

— Bem. — Vitoria e Willian arrumaram a postura quase que imediatamente e olharam para frente, Koyran tinha fechado o livro e eu aproveitei a oportunidade para finalmente pegar uma fatia de bolo de chocolate, rezando para que essa fosse tão boa quanto a outra. — Podem ir, vocês dois. — Percebi que quando ele estava de lentes seu rosto era muito diferente. — Preciso conversar em particular com a princesa.

— É? — Perguntei.

— Preciso.

Um pouco de silêncio enquanto os dois saíam e fechavam a porta. Finalmente comi um pedaço daquele bolo e quase chorei de emoção, meu Deus! É uma delícia incomparável.

— Gosta de bolo de chocolate?

— Odeio. — Comi outro pedaço.

— Em dois dias estaremos em Calanthe e no quinto chegaremos em Anwar com toda a carruagem, com Clarine e com meus pais, certo? — Assenti, eu não fazia ideia. — Você não passou um tempo significativo longe, mas certamente é o tempo mais longe que já passou do seu reino. — Comi outro pedaço de bolo e àquela altura eu já não tinha tanta certeza se estava ouvindo o que ele falava. — O nosso acordo não veio a público porque não permiti e... Você está sequer me ouvindo?

Comi o último pedaço da fatia de bolo, quando ia me preparando para pegar a outra fatia, ele puxou o prato para si e nosso olhar se encontrou.

— Nós chegaremos juntos em Calanthe e algumas pessoas ainda pensam que você é prostituta!

— E daí? Não é como se eu tivesse muita a coisa a zelar ainda, né?

— Do que raios você está falando?

— Eu quem pergunto! — Bati na mesa e o bolo virou no meu prato, segurei-o com um garfo e quase chorei só de pensar em perder aquele paraíso. — Do que raios você está falando? Eu nem sou mais princesa! Não cumpri a porcaria do acordo e não tenho como coroar o meu irmão!

Ele ficou calado e em silêncio, com ambos os olhos castanhos parecia ainda mais consternado. Ele olhou para longe e respirou fundo, levantou e foi até a porta.

— Vamos embora logo, não quero perder tempo e me atrasar pela primeira vez por culpa sua. — Sua voz irritadiça me deixou estressada.

Sacrificarei este bolo.

Peguei a fatia com as mãos nuas e joguei nele, acertando-o no meio das costas, diretamente na camiseta branca. Koyran ficou estático como uma pintura e demorou para se virar, talvez com medo do que fosse ver.

— Daryia, você não fez isso.

— Você começa a droga da discussão e depois foge como um maldito covarde! Se quer falar algo fale logo, inferno! — Ele virou e chutou a fatia para longe, manchando agora o sapato e o chão.

— Você ainda é princesa! — Reprimi os lábios. — Mas que saco! Nem Clarine é tão insuportável.

— Eu não achei a coroa!

— É! Literalmente! Jogou uma coroa de lata amassada nos meus pés e acha que está certa! — Ele bufou e abriu a porta com um puxão. — Mas ainda é princesa e sua honra está intacta.

Algo revirou-se no meu estômago e eu me fiz crer que era o remorso de ter arremessado a fatia mais recheada de bolo no príncipe.

— Vou me trocar. — Reclamou, resmungou, choramingou e de sua boca só saíram palavras ruins. — E vá para a carruagem!

— Você não manda em mim! — Coloquei o bolo dentro da cesta vazia, coloquei também todos os pães de queijo nela e passei por ele com um vulto.

Cinco minutos depois eu estava na carruagem.

O cocheiro estava no seu lugar, aguardando alguém, talvez uma das meninas e eu estava observando as colinas à minha frente, rezando apenas que a viagem começasse logo para que eu pudesse me perder em paz nos meus pensamentos e, se eu fosse sortuda, cair no sono e só acordar daqui dois dias.

Tinham só dois lugares, mas em cada banco cabiam pelo menos duas pessoas... Eu esperava que fosse Vivian quem viesse comigo como minha dama, ela era mais quieta que Elis e isso era tudo que eu precisava, silêncio.

Vi as duas paradas à porta com as mãos unidas em frente ao corpo, quando me viram pela janela, acenaram e sorriram, mas não saíram do seu lugar.

Quem veio viajar comigo, na verdade, não foi Vivian e tampouco Elis.

Foi o príncipe.

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