eu posso te arranjar outra

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Eu odeio meus delírios, assim como odiei química básica no início do ensino médio. É se sentir traído por si mesmo. Sem explicações, sem motivos, sem mensagens. É como trocar seus anos de experiência por um par de lábios rosados e dedos melados de chocolate. Acho que meu sonho é vê-lo sorrir do outro lado da rua e não me sentir afetado, bulido. E eu não falo. Porque ele não entenderia.

— Cereja? — sua resposta vem mascarada de pergunta. Checo e confirmo comigo mesmo. Chegou a hora de eu parar de ficar tão próximo e finalmente me afastar. Eu estava segurando o ar.

— Parabéns — estico meus lábios num sorriso orgulhoso. — Eu tinha feito para saber se você iria gostar da ideia.

— Vai me dizer que é para aquela bobagem do Dia dos Namorados? — fala, e então morde outra vez e passa a degustar. — Mas está bom, mesmo assim. Ainda mais porque é surpresa, isso é legal.

— Não chame de bobagem, Minho! — eu reclamo, me esticando para pegar meu pendrive do balcão. — Já desistiu, foi?

— Obrigado por falar sem eu nem precisar explicar — ele faz um barulhinho com a língua no céu da boca e se apoia nos cotovelos.

Por um mísero segundo, fico tentado a acariciar seu cabelo.

— Caralho, Minho, eu vou te descer um soco! — rio para disfarçar minha real vontade de socar seu braço nu o mais forte que consigo. Porque eu estou muito puto com isso. Ou eu poderia simplesmente sacudi-lo até fazê-lo abrir os olhos para a vida.

Porque a desesperança de Minho sempre me encheu de ódio. Eu compreendia que antes era uma questão pessoal dele e que talvez eu não devesse me meter, mas tentei ajudar muitas vezes. E sinto que, por mais que ele tenha melhorado muito, ele ainda tem algumas coisinhas de antes e pouco a pouco, a cada sorriso e risada sua, vou percebendo que estive errado desde que cheguei na Coreia. Acho que o Minho não mudou tanto assim.

— Credo! — ele também ri. Está levando na esportiva.

— Mas faça! Não creio que você desistirá assim...

— É que não sei se vou ter tempo... — ele passa a observar os próprios estalos dos dedos das mãos.

— Vai, sim. Se você fizer depois do casamento, por exemplo, poderá ter tempo — observo suas mãos também, mas não porque quero segurá-las e andar por aí. Elas são bonitas, e me assusta a normalidade com que causa um "crack" nos nós dos dedos. Se eu pudesse segurar sua mão agora, acho que eu gostaria de acariciar. Só para fingir que nunca fiz isso antes.

— Não sei, não... — seu tom de dúvida e hesitação é tão típico que é basicamente um "bom dia" para mim.

— Eu posso te ajudar com o chocolate, então ambos podemos fazer isso dar certo. Você acha que não vai ser bom?

— Não é isso, Han... Tenho medo de não dar muito certo e eu ter gastado tempo com isso...

— Você quer fazer? — olho em seus olhos dessa vez, para que ele perceba que estou falando sério.

— Eu acho que...

— Nada de "acho", Minho — respiro fundo. — Você quer ou não?

— Quero.

— Então faça — e com isso, me movo um pouco para o lado e pego outro chocolate. — Experimente esse. Saiba que não pode desistir assim das coisas, tá? Qualquer coisa, é só me dizer.

Eu realmente espero que ele escute o que estou a dizer. De verdade. Porque eu sei como é pensar assim, acho que já o fiz inúmeras vezes. Eu não gostaria de vê-lo desistir das coisas. E o mínimo que posso fazer é oferecer — ou obrigar — a minha ajuda. Eu poderia fazer qualquer coisa que estivesse ao meu alcance. E eu tenho sérios problemas em não querer desapontar os outros, o que significa que não iria simplesmente jogar para cima, após ter alguma das suas responsabilidades.

thé et fleurs • minsungOnde histórias criam vida. Descubra agora