Capítulo 41 - Lorenzo

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Meus pés doíam demais.

O caminho descrito no mapa era dentro de uma mata densa, da possível ilha em que estava.

Encontrei algumas surpresas no caminho, me deparei com duas cobras, uma caindo de uma arvore quase que em cima de mim, a outra próxima do lamaçal pelo qual tive que passar e quase não consegui sair.

A da arvore foi fácil me livrar, mas a que estava próxima ao lamaçal parecia mais um cipó e por pouco não me segurei nela pra sair dali.

Precisei bater nela com a mochila. Nessa brincadeira, a cobra voou e a mochila foi junto. Não que tivessem itens de primeiros socorros lá dentro, mas a única garrafa de água potável que tinha estava lá.

A dor no pé, me consumia e o ódio que eu sentia de tudo e de todos também.

Eu sabia que isso provavelmente era a porra de um teste, mas cacete eu já tinha quase morrido por daqueles putos e ainda faziam isso comigo.

Passar na porra desse teste, era agora uma questão de honra.

Eu passaria, nem que fosse a última coisa a fazer, na merda dessa vida.

Meia hora depois de ter saído do lamaçal, cheguei a uma clareira, já estava quase anoitecendo, corri e encontrei no meio da lareira um saco plástico com uma espécie de controle, um par de sapatilhas propé descartáveis e outro bilhete dizendo:

"Antes de tirar os sapatos, utilize o controle e desative a ignição. Os sapatos de hospitais são opcionais. Você pode ficar na clareira e descansar ou seguir rumo ao seu destino. Você tem até o amanhecer para chegar e precisará da canoa ou do barco para atravessar o rio, que te levará ao seu resgate.

A essa altura, já deve ter percebido que a mata tem seus mistérios, então boa sorte.

Nos vemos ao amanhecer, ou não, quem sabe."

Sentei-me no chão e desativei a porra das botas, que fez um clique simplesmente. Tirei com uma dose extra de cuidado.

Primeiro, porque sabe-se lá se, a merda estava realmente desativada. Depois, meus pés doíam demais e deveriam estar super castigados.

Olhei as bolhas e os vermelhões nos meus pés e quase chorei de alívio.

Isso até tentar levantar e colocar os pés no chão novamente, uma tarefa para dizer no mínimo, difícil.

Doía muito mais agora, do que quando eu estava com ele totalmente apertado dentro das botas.

Me arrastei até o saco com as sapatilhas hospitalar e vi que minhas chances diminuiriam a cada segundo que eu ficasse por ali.

Ao invés de me desesperar, liguei meu modo frio e calculista. Era ele quem me socorria, nessas horas de aperto.

Parei e olhei com mais atenção tudo ao meu redor.

Havia uma espécie de formação de fogueira meio pronta feita com pedras e madeiras já usadas, provavelmente colhidas ao redor.

Havia um tipo de grade e duas vasilhas sobre ela.

Havia um banco de pedra ao lado.

Isso era bom. Eu ainda tinha o isqueiro e a faca e apesar de estar com muita fome minha última preocupação agora, era comida.

Ainda tinha um pouco de luz do dia e teria que acender a fogueira e pegar o que precisasse antes da completa escuridão.

Eu entendia alguma coisa de plantas.

Luna era obcecada por essas coisas de aromaterapia e cromoterapia e diversas outras terapias. E eu tinha que comprar os óleos e tudo que tivesse a ver com esses lances. E eu claro, lia tudo que chegava até mim, sempre adorei bulas de remédios e receitas, cultura inútil que agora iria valer a pena.

Eu conhecia os tipos de arvores, plantas e o poder delas na cura de muitas doenças do corpo e da alma, como dizia Luna.

Claro que tudo que eu conhecia era em forma de óleos e tinha uma bula, ou um livro para seguir, mas eu sabia que A+B poderia dar um resultado bom ou quase isso e foi o que me propus a fazer.

Juntei mais uns galhos secos e coloquei na fogueira, demorou um pouco, mas o isqueiro resolveu me ajudar e finalmente acendeu a fogueira.

Alimentei mais o fogo, afinal precisava de uma boa claridade por ali pra fazer o que era necessário.

Ambas as vasilhas estavam tampadas e tinham água que aparentavam estar limpa, embora parecessem estar li há um bom tempo.

Mesmo que as vasilhas estivessem tampadas, coloquei ambas no fogo para ferver. Dependendo de como elas se pareceriam depois, daria quem sabe até para beber.

Mais ao lado, havia uma carreta em pé, próxima à uma arvore.

Próximo a ela, havia um barco e uma canoa, ambos virados de lado e cobertos por um tipo de tecido, já velho e desgastado.

Me arrastei até lá e rasguei um bom pedaço daquele tecido.

Peguei uma tora grande que havia separado. Enrolei um pedaço do pano e pus no fogo, fazendo uma tocha.

Comecei a me arrastar atrás dos materiais que eu precisava.

Antes de chegar à clareira, tinha passado por uma porção de flores, tinha certeza de que tinha visto margaridas entre elas. Ou como minha irmã dizia, calêndulas. Deveria servir.

Ali naquela clareira, tinha uma arvore de barbatimão, ou pelo menos pra mim, parecia com uma.

Recolhi muitas flores e com a faca tirei um pedaço da casca, que parecia estar mais seca, do barbatimão e me arrastei de volta a clareira.

Tudo o que eu sabia que daria certo exigia óleo, essências ou algo que eu não tinha ali disponível. Então pensei em fazer um tipo de chá e colocar nas bolhas dos pés. Barbatimão e calêndula juntos, eu sabia, era um excelente anti-inflamatório.

Luna usava muito nas meninas da boate e o pior que podia acontecer era não dar certo.

Rasguei outro pedaço de tecido e comecei a amassar o barbatimão. Tentei deixá-lo o mais moído possível, tirei um pouco da água da vasilha e coloquei na outra que ainda fervia. Coloquei o barbatimão na vasilha com pouca água e todas as pétalas das flores e deixei ferver, formou um tipo de pasta bem mole. Coloquei a pasta mole ao lado e molhei um pedaço do pano com a água que ainda estava fervendo e comecei a limpar meus pés como dava.

Usei quase toda a água nessa limpeza, mas parecia ter ficado bom.

Peguei o saco plástico que tinha vindo as coisas e rasguei ao meio, coloquei cada metade dos sacos dentro das sapatilhas formando um tipo de proteção. Espalhei a pasta neles, coloquei nos pés. Por baixo do calcanhar e no peito dos pés, joguei o restante da pasta. Ainda estava morno e a dor e o alívio foram instantâneos. Amarrei com os cadarços da bota, o tecido em torno do pé, principalmente na sola, deixei firme para o saco não me fazer escorregar. Não seguraria o líquido que ainda tinha, mas manteria úmido por um tempo maior e eu não colocaria os pés diretamente no chão.

Depois de ambos bem firmes, tomei o restante de água que havia sobrado. Estava morna e tinha um gosto horrível, mas meu estomago estava feliz pois já estava há quase 24 horas sem nada.

A escuridão já havia tomado toda a mata, mas a clareira se mantinha clara e aquecida pela fogueira, que estava bem alimentada de madeiras e gravetos.

Mulheres Poderosas III - PietraOnde histórias criam vida. Descubra agora