Dívidas

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Draco não conseguia acreditar em como as coisas se resolveram tão facilmente. É por isso que Potter era um auror e ele não. Enquanto Draco se desesperava e puxava os cabelos, gritava com Pippa e exigia que ela achasse Astória, Potter simplesmente revirou os bolsos do cadáver de seu pai, onde achou uma carta endereçada ao filho com o endereço de onde eles se esconderiam e avisos que ele não poderia chegar aparatando, que o local era protegido até contra a magia de elfos, exigindo que Draco repassasse todo o controle da fortuna da família para ele.
Potter mandou patronos para o QG, pedindo reforços e tão logo eles chegaram, invadiram o local com um simples alorromorra. Tão fácil, tão simples. E quase tinham chegado tarde demais.
Draco sequer percebeu as lágrimas em seu rosto quando correu à sua esposa, desmaiada caída em cima de Goyle, sem sentidos. Ele conjurou uma capa e a cobriu, mas antes pousou a mão em seu ventre, sentindo a movimentação de seu filho e exalando de alívio. Astória tinha um rosto muito machucado, mas ele achou que eles ficariam bem.
- Malfoy – Potter ergueu o rosto para ele – que feitiço usou nele?
Os outros aurores faziam um limpa na sala, recolhendo provas e evidencias, tirando fotos e colocando pequenas setas de papel no chão.
- Eu não me lembro – respondeu o homem com sinceridade- sequer me recordo de ter pensado em um.
- Bom, vamos ter que levá-lo ao st. Mungus antes de Azkaban – disse Harry, passando a mão no rosto- lá eles descobrirão.
- O que acontecerá com ele? – Draco perguntou em voz baixa, enquanto desembaraçava o punho de Goyle dos cabelos de Astória gentilmente.
- Bom, dessa vez ele pegará perpétua. Sequestro e morte de dois puro-sangue.
- Achei que você não ligasse para essa besteira de purismo de sangue...
Harry conseguiu sorrir, “desde quando Malfoy achava isso uma besteira?”
- Eu não ligo, mas o Wizengamot liga... – ele pareceu um pouco ríspido e estalou os lábios – ainda faz muita diferença na suprema corte.
- Mude isso então – disse Draco, como se estivesse pedindo a Harry para acender uma lâmpada – assuma sua cadeira e...
- Eu não tenho cadeira lá – ele disse, frustrado.
- É claro que tem, seu avô, Fleamont, foi o presidente do Wizengamot por anos...
Harry levantou as sobrancelhas, surpreso, depois murmurou para si mesmo “por que todos parecem conhecer mais da minha família do que eu...”
- Weasley também tem uma cadeira lá, e Longbotton também – Draco disse, passando a mão no rosto de sua mulher. Ele pensou “eu também tenho”, mas não disse nada, só assumiria aquela cadeira se Potter exigisse.
Harry suspirou e apontou a varinha para ela, fazendo um rápido feitiço de diagnóstico.
- É melhor você levá-la ao hospital, Malfoy, ela está fisicamente bem, mas ...
- Certo – Draco engoliu em seco, estava pensando em levá-la direto para casa, mas talvez o homem moreno tivesse razão.
- A patrulha já suspendeu o anti-desaparatamento que estava aqui, está seguro.
Harry olhou para o rosto pálido do seu ex- inimigo de escola e não sentia nada, a não ser pena e uma leve curiosidade.
- Posso, er..., posso te mandar uma coruja sobre esse assunto, da suprema corte? – Harry perguntou, inseguro.
- Se você quiser, eu vou fazer da minha missão de vida fazer você o presidente daquela porcaria – Draco disse, com rigidez – um Malfoy sempre paga suas dívidas e por Merlim, como estou em dívidas com você, Potter. – Draco esfregou o rosto com as mãos sujas, deixando um rastro de lama nas bochechas.
Harry balançou a cabeça sem afetação – você não me deve nada, homem. Eu sou auror, é meu trabalho. – Harry se adiantou e apertou a mão que lhe foi oferecida, reparando que ela tremia bastante – e eu não sei o que você estava fazendo antes de me chamar, mas você é um funcionário do ministério, pelas cuecas meladas de Merlim, pare de usar aquela porcaria – ele não se conteve e passou um sermão em Draco, que aceitou de cabeça baixa e até mesmo deu um sorrisinho.
- Ok, chefe. – e sem mais uma palavra, desaparatou, usando toda sua concentração para não acabar estrunchando a si mesmo ou a mulher que tinha enrolado nos braços.
Mais tarde, quando Astória estava segura em um quarto, já assistida por vários curandeiros, mas ainda dormindo, Draco gemeu, com raiva. Astória teve dois dedos quebrados, um supercílio aberto, o lábio inferior partido e uma pequena concussão. Ele pensou seriamente em matar seu ex-amigo de escola.pensando que teria que contar a sua mãe que Astória estava gravida e que ele escondeu isso dela por mais de três meses, “porra, ela vai me matar”.
oOo
Sendo o grande covarde que era, Draco esperou sua mãe sair do quarto de hospital e fingiu estar dormindo em uma das cadeiras, para não ter que falar com ela.
Foi “acordado” com um tapa na nuca, que lançou sua cabeça para frente e ele quase caiu de choque.
- Mamãe! – Draco estava positivamente chocado, nunca tinha levado um tapa antes.
- Sabe... – as mãos brancas e pequenas de sua mãe estavam fechadas em punhos apertados e ela dava grandes passadas no corredor, indo até a janela de vitrais coloridos para depois voltar – presenciei Molly Weasley fazer isso com um de seus filhos uma vez, não posso me lembrar qual deles, ela tem uma ninhada. – Narcisa encontrou os olhos de seu filho e desviou os seus - E naquela vez, pensei comigo mesmo “minha nossa, que medieval. Veja como são os plebeus, tão sem classe. Eu nunca faria isso com um filho meu em público”. E veja os filhos dessa mulher agora, aposto que nenhum deles fugiu para as drogas com amigos de escola traficantes enquanto deixavam a mulher grávida em casa, depois de terem ordenado um aborto. – Draco sentia como se estivesse recebendo um berrador, ela com certeza falava alto o suficiente - Eu devia ter sido mais enérgica, eu devia... – ela parou em frente ao filho, tremendo de indignação – peça desculpas à sua mulher, rasteje, implore seu perdão.
- Isso estava em meus planos, mamãe – disse Draco, humilde.
- Bom – a mulher pareceu se acalmar um pouco mais – vejo vocês no sábado.
- Mamãe, receio não poder fazer planos com você, estou a encargo de Astória. Se ela decidir que eu passe o fim de semana nu marchando com os guardas de Elizabeth no palácio de Buckingham, é o que farei.
Narcisa seu uma risadinha que apertou os cantos de seus olhos azuis e a remoçou alguns anos.
- Por favor, não esqueça de me chamar. Gostaria muito de ver isso.
E com dois tapinhas em seu rosto, ela partiu em uma nuvem azul, suas vestes finas fluindo atrás dela, muito elegante.
Draco suspirou fundo mais algumas vezes e tentou se acalmar. Precisava vê-la algora, precisava falar com ela, mas não sabia o que o esperava atrás daquela porta. Ela seria receptiva? Estaria fria novamente? Ele já sabia que estava muito machucada fisicamente, mas estaria traumatizada para sempre? Esfregando as mãos suadas no tecido das vestes, ele engoliu em seco e bateu baixinho na porta, com uma ligeira esperança de que ela estivesse dormindo e não o escutasse, então essa conversa seria adiada, talvez até para sempre.
Ela estava acordada e ouviu sua batida. A porta se abriu e ele ainda pode sentir o murmúrio que ela usou para isso.
Ela parecia tão pequena em meio aquela cama de hospital. De repente, era como se os anos não tivessem passado e ela ainda estava morrendo da maldição do sangue, se segurando em fios ralos para continuar viva. Draco sacudiu a cabeça e o momento passou. Conseguia vê-la como estava agora. Pálida, os cabelos negros mais compridos e se enrolando nas pontas, a barriga parecia engolfar toda sua figura.
- Oi – ela disse, roubando a primeira fala.
- Oi – ele enxergou isso como uma permissão para entrar no quarto e entrou andando na ponta dos pés, parando à beira de sua cama – como você está?
- Bem- ela olhou para baixo e passou a mão na barriga com carinho. Draco pôde ver a sombra de um olho roxo e uma ferida recentemente curada em seu lábio inferior. Ódio borbulhou dentro dele e por um momento se pegou pensando em planos reais para matar Goyle.
- Se eu estivesse em casa...
- Você pediu para voltar e eu não deixei...
- Mas você estava certa de não me perdoar, falei coisas tão terrível-
- Você estava com raiva, aquilo que você falou, sobre como te enganei por quase um ano, é verdade, é tudo verdade eu só imaginei que-
- Astória, não há desculpa para meu comp-
- Deixe-me terminar de falar – ela agitava as mãos, febris – resolvi tentar um bebê logo depois do aniversário de Teddy, eram tantas crianças e você parecia tão feliz, enrolado no dedinho daquela menina Weasley veela. Eu já tinha visto um curandeiro que me avisou que a maldição estava dormindo agora, se ela acordará ou não, é impossível dizer. Ter um filho seria tão perigoso quanto cortar um dedo, os dois eventos tinham a mesma probabilidade de desencadeá-la.
- Por que não me contou, Tory? – Draco passou a mão no rosto, sentindo um nó no estômago.
- Você teria acreditado? – Astória virou a cabeça para olhar em seus olhos, e algo ali respondeu sua pergunta. Ela deu de ombros e murmurou – como eu pensava.
- De qualquer jeito, não sabia se seria capaz de conceber e passou tanto tempo depois que tirei o dispositivo trouxa que achei que isso não aconteceria – ela continuou sem olhá-lo, fazendo pequenos círculos na barriga – mas aconteceu e eu fiquei tão feliz, fiquei tão feliz e tive medo de te contar e me fazer tirá-lo. Eu o amava antes mesmo de conhecê-lo. Como não poderia? Era um pedacinho seu...- Draco engoliu em seco, sentiu as bochechas queimando de vergonha -Eu continuei postergando, querendo que a hora certa chegasse. Na minha cabeça, se eu conseguisse achar o momento ideal, eu contaria e você ficaria feliz junto comigo.
- Quando foi, você sabe? – Draco havia se sentado em uma cadeira conjurada ao lado da cama e tentava não reagir com raiva ao que ela contava.
- Sim – Astória sorriu e o encarou, logo desviando o olhar novamente – foi naquela noite da aurora boreal. Compartilhamos mais que nossos corpos aquele dia.
- Eu me lembro – ele murmurou – aquela noite foi... mágica.
- Fizemos Hyperion – Draco ergueu as sobrancelhas, mas ela não viu e continuou falando - a medibruxa já falou que ele tem uma assinatura mágica muito forte. Ele é todo magia.
Eles ficaram em silencio por um tempo e Draco engoliu e seco umas três vezes antes de finalmente conseguir colocar pra fora o que queria.
- Posso passar a mão em sua barriga?
Ela o olhou com os olhos trêmulos e assentiu com a cabeça. Draco estendeu a mão e pousou a mão em seu ventre, coberto com a feia camisola lilás do hospital – e esperou. Sentia a própria presença mágica, a de Astória e... algo mais. De repente, algo o cutucou por dentro e ele retirou a mão, assustado.
Astória tinha a voz embargada quando ralhou.
- Não seja grosseiro com o papai – e esfregou o local onde o bebê havia chutado.
- Posso tentar de novo? – Draco pediu, ansioso.
A mulher somente se recostou aos travesseiros da cabeceira, permitindo a ele um acesso maior.
O homem se sentiu tímido, mas mesmo assim avançou com as duas mãos, acariciando seu abdômen inchado, sentindo uma ligeira movimentação por baixo e, movido por um impulso, aproximou seu rosto e falou com a barriga.
- Olá Hyperion, você não me conhece. Eu sou seu pai. – ele escutou Astória fungando ao fundo – eu fui um idiota e acabei colocando você e sua mãe em um enorme perigo. Eu gostaria enormemente de conhecê-lo, de fazer parte da sua vida, e estou disposto a pedir perdão pela minha babaquice todos os dias pelo resto da minha vida. E então, você me perdoa?
Ele encostou o ouvido na pele esticada, como para ouvir melhor e relanceou um olhar para a mulher chorosa na ponta da cama.
- Estou disposto a lhe comprar a melhor vassoura de corrida do mercado.
Draco olhou Astória mais uma vez.
- E você? Você me perdoa?
Astória escondeu o rosto nas mãos e chorou.
- Tenho pensado nisso desde que você pediu pela primeira vez. Ainda tenho minhas reservas, mas não estou disposta a desistir da nossa vida, desistir de você... Gostaria de nos dar uma segunda chance. Volta pra casa?
Draco deixou suas lagrimas caírem na camisola feia do hospital. Sentia como se um enorme peso houvesse sido retirado de suas costas, sentia como o sol tivesse nascido de novo, dentro dele. Ele balançou com a cabeça, concordando, inseguro de beijá-la depois de tantos meses longe.
Ele limpou a garganta e desviou o assunto:
- Então... Hyperion...
- Eu me lembro de sua constelação, você me mostrou no dia que...
-É...eu me lembro. Eu realmente gosto daquela. É só que...
- Que?
- Ele vai apanhar tanto na escola...
Astória sorriu e suas mãos encontraram as dele e apertaram forte.

                                                         



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