I Helena

11.5K 621 478
                                    

      
Hera não tem filhos semideuses e esta história não irá alterar isso. Boa leitura.

I

      
Helena

Se alguém tivesse lhe avisado antes que ser atingida por um raio era tão ruim assim, Helena teria continuado trabalhando sem reclamar.

Era dia de visitação de escolas no museu de História Grega. Haviam várias crianças e adolescentes correndo de um lado para o outro enquanto seus professores gritavam por seus nomes.

Como inspetora do museu, Helena já devia estar acostumada com aquilo, mas hoje toda aquela confusão a estava irritando mais do que o normal. Ela já não gostava muito de trabalhar naquele lugar por conta das estátuas que sempre a deixavam desconfortável. O museu havia inaugurado há alguns meses e contava história da Grécia Antiga, de seus famosos deuses, alguns semideuses e mais um monte dessas coisas que só são legais em filme, depois que se é obrigada a ver aquilo todos os dias, fica um saco.

Helena andava pelo setor do Olimpo, uma sala espaçosa branca com pilastras de mármore no estilo grego que iam do chão ao teto alto. Organizadas em forma de semicírculo ficavam as tais estátuas do Olimpianos. Todos os doze, feitas também de mármore branco, sentadas em seus tronos com expressões sérias. Zeus, que ficava no meio, era o único que estava de pé, apontado seu Raio Mestre para frente, um pouco inclinado para baixo, como se fosse acertar quem se aproximasse demais.

Por algum motivo desconhecido essa estátua causava em Helena desconforto ainda maior que as outras. A barba, o cabelo longo, a toga grega e a expressão furiosa a deixava com vontade de vira-la de costas ou de jogar tomates no mármore. Ao seu lado, ficava a estátua de sua esposa, Hera, a Rainha do Olimpo e blá-blá-blá... Helena já estava cansada de tudo isso.

Começara a trabalhar ali logo depois do seu aniversário de dezoito anos. Sua tia Mel, que era uma das donas do museu, foi quem lhe arrumou o emprego "incrível". No começo Helena tinha ficado agradecida de verdade, mas na semana seguinte já torcia que alguém engasgasse na sua frente para que ela fosse demitida por não ter ajudado, felizmente ou infelizmente isso nunca aconteceu. "Pelo menos aqui eu fico de olho em você" dissera tia Mel. Agora com dezoito anos, não tinha mais como enfiar Helena em colégios internos por seu péssimo comportamento. Nem mesmo seus pais tinham mais paciência para ela, e já a alertavam desde o aniversário que se fosse presa ficaria na cadeia.

Helena encostou-se na entrada da sala do Olimpo e ficou observando os visitantes admirados com as estátuas: "Oh nossa como Zeus é belo!" "Oh vejam! A Deusa da Sabedoria!" "Não acredito! É Hefesto!" "Ah, essa é Hera, eu vi em desenho que ela é mãe de Hércules". Helena tinha certeza de que isso não era verdade, Hércules era um semideus, filho de Zeus com uma mortal e Hera só tinha Hefesto e Ares de filhos.

Já deviam ser umas quatro horas da tarde quando uma criança veio correndo até Helena. Lá vem, pensou ela.

— Tome cuidado — disse a criança. Devia ter uns sete anos e era um menino, tinha cabelo loiro e olhos azuis, não, verdes, ou seriam amarelos? A confusão fez Helena endireitar a postura. — Coisas que saem das regras, irritam bastante. — E saiu correndo.

Helena não teve nem tempo de se perguntar o que tinha sido aquilo quando um clarão juntamente com uma explosão elétrica vindo do céu a atingiu em cheio, arremessando a garota longe junto com outros visitantes.

Pessoas gritavam e corriam desesperadas enquanto barulhos pesados de coisas caindo estouravam no local. Os pulmões de Helena pareciam ter sido esmagados, ela tossia pesado e estava com dificuldade para respirar, sua visão havia ficado escura, ela não tinha nem ideia de como ainda estava viva. A garota conseguia sentir espasmos eletrizantes por todo seu corpo, era como se ela tivesse colocado um garfo em uma tomada (de novo), só que em uma tomada de um bilhão de volts de uma uzina elétrica. Ela mesma cheirava a queimado e todos os pelos de seu corpo estavam arrepiados, sua visão foi clareando, Helena estava caída de lado, aos poucos começou enxergar vários pares de pés correndo. Aparentemente, tirando o choque do raio, nada parecia errado com seu corpo, nada quebrado e nada cortado. Quando sua visão voltou 80%, Helena se sentou, sentindo o corpo duro, muito quente e dolorido. Suas roupas estavam queimadas e as partes que cobriam as pernas, a barriga e o braço esquerdo haviam sido pulverizadas.

Um segundo raio estrondoso veio do céu quebrando mais ainda o teto do museu. Dessa vez o raio atingiu com força a estátua de Hera e depois seguiu para ambos os lados, explodindo todas as outras estátuas em milhões de pedacinhos. Helena estava completamente em choque, não conseguia nem pensar muito menos correr. Saia daí! Gritou uma voz feminina em sua mente. Saia logo! Em outras condições, Helena teria gritado com essa voz por manda-lá fazer o que ela tinha acabado de dizer que não conseguiria.

De repente, um fumaça branca e luminosa surgiu na frente de Helena, indo em direção a saída de emergência. A garota olhou em volta, havia muitas pessoas machucadas no chão, mas nenhuma parecia ter sofrido nada muito grave. Um trovão rugiu no céu. Helena sabia que se ficasse ali seria atingida de novo.

Seguir uma fumaça estranha depois de ser atingida por um raio parecia péssima ideia, mas quando se deu conta, Helena já estava correndo. Ela abriu bruscamente as portas da saída e correu para fora do museu. Os trovões e relâmpagos pareciam segui-la a cada passo que dava, escurecendo o céu de Nova York com uma nuvem cinza bem escura. A tal fumaça branca continuava a frente, guiando Helena diretamente para o metrô, ela não pensou duas vezes e praticamente se jogou escadas a baixo.

Quando finalmente parou de correr, a garota encostou em uma parede para tentar recuperar o fôlego. Foi quando se deu conta de que estava completamente sozinha, o que era realmente estranho no metrô de Nova York, não haviam sequer seguranças ou faxineiros, nada. A fumaça branca também tinha desaparecido, Helena ainda conseguia ouvir os trovões lá em cima, pareciam estar na ponta da escada só esperando que ela saísse.

— Ela vai achar engraçado pedir ajuda para eles — disse uma voz de criança de repente.

Helena gritou e deu um pulo, era a mesma criança que falou com ela segundos antes do raio cair. Ele estava parado ao seu lado a encarando com um sorriso simpático.

— O que?! — Perguntou Helena completamente perdida. — O que foi aquilo? Quem é você? Ela quem?!

— Eles já devem estar chegando — a criança se virou para frente e magicamente os dois estavam na plataforma aguardando o metrô. Helena perdeu o fôlego, estava ficando completamente maluca, tinha certeza disso.

A criança, pelo contrário, estava bem tranquila, tinha as mãos pra trás e uma expressão calma.

— Eles quem? — Perguntou Helena com o que conseguiu por de firmeza na voz. — O que foi aquilo?

A criança riu e trocou o peso de um pé para outro:

— Na hora que eles começarem a perceber, você vai ter problemas lá também... Grandes problemas. Mas vai estar segura, Zeus não vai arriscar ir até lá, iria irritar os outros se machucasse os filhos deles. Hades, por exemplo, começaria uma guerra se machucassem seu filho de novo.

Se a cabeça de Helena não tinha explodido com o raio, agora sim que iria. Zeus? Hades? Filhos deles? Ir até onde?
O metrô chegou, a criança se virou para Helena.

— Boa sorte. — Ele sorriu e sumiu.

A porta do metrô se abriu, saindo de lá em seguida um garoto e uma garota, ambos de camiseta laranja com um escrito preto no meio: Acampamento Meio-Sangue, com um desenho preto de um cavalo com asas logo abaixo. Helena estava começando a ficar enjoada e se questionava se estava dormindo e sonhando até agora ou se tinha sido drogada em algum momento do dia.

A garota do metrô a encarou receosa e sacou uma faca do bolso, em outras circunstâncias, Helena a teria achado muito bonita, tinha cabelos longos castanhos, olhos que pareciam mudar de cor suavemente. Mas como a circunstância era essa, Helena não pensou duas vezes e saiu correndo largando os dois pra trás.

— Ei! — A garota gritou e correu atrás dela.

As pernas de Helena estavam começando a falhar, percebera agora que estava estado de choque, sua mente ainda não estava focada completamente e seu corpo começava a dar sinais de que iria apagar a qualquer momento. Dito e feito, Helena caiu de joelhos, a visão embaçada novamente, o corpo mole e trêmulo. Uma figura escura surgiu a sua frente, algo grande e com bafo gelado.

Depois disso, tudo o que Helena viu foram vultos: A garota de camisa laranja se arremessando na criatura, um rugido alto, o garoto com uma... Aquilo era uma espada? Mais criaturas estranhas aparecendo, e por fim, um garoto de camisa roxa. E água, muita água...

A Traição do Olimpo Onde histórias criam vida. Descubra agora