03 | só me ligar.

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Pablo Gavi

Já era a décima quarta vez que eu buzinava e nada de Vacchiano aparecer.

Buzinei pela décima quinta vez, e vi uma figura magra saindo do portão de sua casa.

Ela abriu a porta do carro, se sentou ao meu lado e colocou o cinto. A encarei desconfiado.

– Estava arrumando meu cabelo – se defendeu e eu revirei os olhos. – Você entenderia se fosse mulher.

– Arrumou tanto que ele está igual – dei de ombros, senti seu olhar pesar em mim.

Não falamos mais nada no resto da viagem e sinceramente eu não fazia questão nenhuma de mudar isso. Já estava estressado por ter que sair com ela, e depois precisei esperar mais de meia hora na porta de sua casa.

Estacionei na frente de um restaurante de esquina. Foi o mais encondido que encontramos no centro de Barcelona. Saímos do carro e entramos de cabeça baixa.

Ela usava um vestido marrom muito colado, com listras de diversas tons de marrom, ainda usando as botas rosas, mas eram de um tom que favorecia a roupa que estava usando. Tinha se maquiado e tentava parecer o mais confortável possível com a minha companhia.

Eu usava uma camisa social branca, e uma calça preta. Basicamente era o que eu usava frequentemente e eu não ligava muito.

– Sabe que horas eles vão chegar com os fotógrafos? – ela falou pela primeira vez desde que chegamos.

Estava sentada bem á minha frente e tinha seus cotovelos em cima da mesa.

– Eles não vão avisar. A tarefa é parecer o mais natural possível, não? – ela pareceu pensar.

– Isso que é difícil. Eles facilmente poderiam tirar fotos onde eu estou com aparência de quem te mataria.

– Só relaxa – falei o óbvio.

– Ai, me desculpa, senhor super relaxado – bradou. – Está me olhando com essa cara esquisita desde que chegamos e quer dar show de simpatia.

– É pura curiosidade – me defendi. – Como uma pessoa pode usar as mesmas botas desde que nasceu?

– Mas não são as mesmas. Meu pé cresceu bastante ao longo da minha vida – falou e eu arqueei as sobrancelhas.

– Pensei que já tinha esses pés enormes desde bebê – ela me olhou irritada, mas não parecia surpresa, por outro lado, parecia estar esperando justamente isso.

E isso é uma das coisas que me irritava nela. Quando me encarava como se eu fosse uma criança previsível, e ela fosse muito melhor do que eu.

– Você continua igual, Gavira.

– Isso é música para os meus ouvidos, Vacchiani. Sempre fui o máximo – ela sorriu ironicamente, e eu continuei a falar. – Agora você... só piorando – provoquei.

– Não ruim ao ponto de quase perder o emprego.

– Vai ser assim?

– Você fala, fala e não gosta de ouvir – arqueei o cenho. – A mesma criança de sempre.

– Tem uma diferença entre não ouvir os outros e não ouvir você – apontei para seu peito ao dizer.

E ficamos em silêncio até a comida chegar. Comemos sem ao menos se olhar e então ela pigarreou.

– Sim? – questionei.

– Tem algo que eu acho que deveriamos discutir – assenti. – É fato que não estamos juntos de verdade, e eu não quero passar meses sem me relacionar com ninguém. 

lie to me - pablo gaviOnde histórias criam vida. Descubra agora