11 - A Tragédia

7 2 0
                                    

- Pretendemos todos fugir ainda hoje, essa noite iremos mudar nossas vidas. Não podemos viver assim, presos para sempre. Neity está morto, a guerra acabou.

Abaixei a cabeça conforme ela falava, sentia que seria uma ótima ideia, se manter em uma única situação para sempre não era adequado para ninguém, e aquele lugar não era confortável, antes até poderia ser, quando havia comida, um belo jardim e atividades para movimentar o corpo. Atualmente tudo estava parado, as plantações estavam morrendo e não estava restando nada para que eles pudessem aproveitar. Ainda assim, eu pensei por um momento, e se desse tudo errado? E se eles não conseguissem? Iriam ficar presos aqui para sempre?

Isso ficou matutando em minha cabeça por muito tempo, mesmo depois quando cheguei em minha casa e deitei na minha cama, a preocupação estava evidente em meu rosto, pois assim quando me levantei e sentei na beirada do colchão, vi o meu reflexo pelo espelho. Pensei por um momento, em como me distrair daquele assunto quê estava matando meu brilho pouco a pouco. Sam fora levado junto com outras cobaias, Bennety e Kently também, eu não conseguia manter a calma sabendo quê eles poderiam estar até sendo torturados, mortos talvez.

Me levantei de impulso, com raiva, tanta raiva quê apenas levei minhas mãos até a borda de madeira do espelho e a puxei com força da parede, para poder jogar contra o chão e poder ao menos culpar o meu azar com aquela superstição idiota. No entanto agarrei aquele pedaço de vidro e não o deixei cair, apenas o abracei com cuidado quando vi. Preso na parede, onde estava o espelho anteriormente, estava um mural de fotos com legendas e anotações, a borda já estava amarelada e curvada, de qualidade antiga. Pisquei repetidas vezes enquanto encarava a parede decorada, encostei o espelho na lateral da cômoda onde eu guardava meus sapatos e partes baixas de tecidos grossos. Tateei as minhas anotações enquanto sentia meu coração bater com força dentro do peito.

Era uma parede na qual eu deixava todas as informações que eu tinha de Neity, e como poderia encontrá-lo para me vingar. Até a minha letra estava mais escura, depositada a caneta com tanta força, eu podia enxergar o ódio que tinha ali em cada ponto e vírgula. Se eu soubesse o que eu perderia ao longo do caminho para me vingar de Neity, eu ainda teria continuado? Tateei as folhas por mais alguns minutos, pensando em como tudo foi se transformar em como era agora, senti uma fisgada em meu coração quando lembrei da dor que senti quando o vazio me consumiu, a vingança nunca era uma solução para o luto. Comecei a arrancar os papeis sem nem pensar duas vezes, me ajoelhei no piso e usei minhas unhas pequenas para puxar cada pedaço de lembrança ruim da parede, até a velocidade em que eu as puxava fosse tomada pelo ódio, quando percebi que não restava mais nada na parede, eu estava apenas arranhando minhas unhas na cola que manchou o pedaço de concreto, senti o ardor nos dedos antes da consciência me dominar.

Sentei sobre os calcanhares e me permiti respirar fundo, um espaço para deixar que a dor saísse em um ar tóxico de meus pulmões. Minha visão ficou naquele piso sujo de pedaços de papéis picados enquanto minha respiração voltava ao normal. Limpei tudo logo depois, não queria manter aquela bagunça em meu quarto por mais nenhum minuto, então apenas dei uma boa varrida no cômodo e desci as escadas para me refrescar com um copo de água gelada.

— Pai? Eu vou assistir um pouco de TV, então...

Parei de falar quando me virei para a sala, com o copo de água em mãos, e percebi que ele não estava sentado no sofá, possivelmente já tinha ido se deitar para ter uma boa noite de sono. Suspirei fundo e com um sentimento de leveza, segui até a sala, onde me sentei no sofá e pela primeira vez em meses, liguei a tv para assistir alguma coisa, o canal que já estava passando era justamente um jornal de notícias do estado onde morávamos, suspirei mais uma vez, talvez por que eu não queria assistir nenhuma notícia ruim, porém apenas afundei no acolchoado do sofá e agarrei a almofada contra meu peito, eu estava cansada e precisava dormir, mas eu precisava gastar todas minhas energias para conseguir dormir, já que eu estava ainda elétrica. Pouco a pouco, enquanto a repórter falava de uma lavagem de dinheiro de outro estado, meu corpo ia ficando quente e se desligando, até que eu não o sentisse mais, fechei meus olhos sem nem mesmo perceber, me entregando ao sono, mesmo em um lugar nada bom para minha coluna. 

Poderes De Outra Dimensão - 2ª TemporadaOnde histórias criam vida. Descubra agora