Capítulo 2.1 - "Nesta casa não existem julgamentos..."

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Foi há dez anos atrás, exatamente.

Eu não sabia em que buraco entre minhas roupas jogadas no chão, e na cama — ou as enfiadas no armário — eu tinha enfiado a minha maldita chave.

— Não enfiou no cu? — San perguntou.
Ele riu do próprio comentário.

— Você é muito engraçado — Quando disse, estava afogado em ironia.

Ele riu baixinho. Continuou mexendo no celular enquanto eu me perdia no meu próprio quarto. Foi quando ele reproduziu um áudio, e seu celular estava no volume máximo, que minha carranca se formou mesmo no início do que a noite prometia.

"Eu estou te dizendo, cara. Ele era simplesmente muito bonito. Não me lembro de ter visto um par de peitos mais atraente do que aquele par de coxas".

Os olhos de San saltaram do rosto, a cor drenando sob sua pele repentinamente mais pálida. Ele me olhou com medo, e eu fiz de tudo para que tivesse certeza de que realmente deveria estar.

Não entenda mal. Não era nada contra a linguagem vulgar. Naqueles dias, qualquer par de peitos me faria gozar em minhas roupas com um mínimo toque. Par de peitos era algo perfeito, quem diria um bom par de coxas.

O problema era o comentário ter vindo na voz de um homem, que supostamente falava de alguém do mesmo sexo.

— Não brinque com isso. — Apontei, sério. — Se quiser pode responder seu amigo lá fora.  Sabe que eu no gosto nada disso.

— Claro. — Ele ergueu as sobrancelhas. — Claro que sei. — Houve um suspiro.

Ele sussurrou algo que não ouvi direito. A não ser uma palavra em específico.

— "Pena" de quem? — perguntei. Meu tom tão irritado que o fez se encolher. — O quê você disse?

— Nada cara. — Ele ergueu as palmas. — Relaxa, caralho! Vamos nos atrasar para a festa. Procura logo suas malditas chaves.

— Mãe! — desistindo, eu gritei por final. — Você viu minha chave?!

— No móvel da copa! — A resposta veio abafada pela porta pesada do meu quarto.

Eu entreguei meu olhar lerdo para San. Ele rolou os olhos, irritado.

— Vamos logo! — praticamente gritou. — Se me fizer perder tempo por mais um segundo, eu juro que te afogo no seu mar de roupas.

Nós fomos, então. Com a promessa de que voltaríamos para a casa de meu amigo antes das três da madrugada, mas os pais de San estavam viajando e na verdade não tinha ninguém nos esperando.

— Desembucha. — Ele me empurrou com um dos ombros. — Qual é o problema?
Estava tão óbvio?

Sempre fui tão transparente?

— Meus pais não estão em seu melhor momento — admiti. Mas não precisava admitir, porque isso sim era visível.

— Eu realmente não estou afim de ouvir seu choro por causa dos seus pais — San fez uma careta. Chutou uma pedra no meio do caminho e quase se desequilibrou.

— Meus pais vão se divorciar — continuei.

— Sinto em dizer que eu já esperava.

— Vamos nos mudar.

Oh, sim. Então não houve mais som de pedrinha nenhuma sendo chutada. Sequer um passo de San esmagando o asfalto úmido pela chuva da última noite. Quando não o notei ao meu lado, também parei de caminhar.

— Como assim? — ele perguntou.

— A casa é do meu pai, minha mãe é orgulhosa demais para ficar por mais tempo. O único lugar que temos pra ir é a casa da vovó.

Modo Índigo |• MinSeongJoong (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora