Os primeiros dias do resto de nossas vidas

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Marina deu um sorriso e disse:

– Ué? O Flávio não era o seu melhor amigo na faculdade e você falou ontem que está inseguro com o lance de começar em uma turma nova no último ano. Lembra?

– Ah, sim! Eu nem lembrava disso. Acho que já estou começando a esquecer a vida que eu tinha no Paraná. – disfarçou Heitor.

– Esquecer, acho que ainda não. Mas, deixar para trás, com certeza! Agora, vou para a cozinha e te espero lá em 15 minutos. Quero sair, conhecer São Paulo... Vai logo!

Heitor pegou o celular, respondeu a algumas mensagens, foi para a cozinha, tomou café logo depois e tomou um banho rápido. Vestiu a primeira roupa que encontrou na mala, foi para a sala e encontrou a irmã o esperando.

– Tomem cuidado! – advertiu a mãe quando os dois estavam abrindo a porta da sala.

Os irmãos andaram por diversos pontos da nova cidade, tiraram diversas fotos e voltaram para casa quando a noite começou a cair. Os dias seguintes foram dedicados ao início da arrumação da casa e até o início das aulas, na segunda-feira da segunda semana de fevereiro, eles alternavam a rotina entre alguns passeios na cidade e conversas com os antigos amigos do Paraná nas redes sociais.

No último domingo antes do início da nova rotina, a família foi aproveitar a tarde em um shopping e, no início da noite, enquanto faziam um lanche antes de voltar para casa, Nelson disse:

– E então, meus filhos. Estão preparados para as aulas?

– Acho que o pessoal do Paraná está mais ansioso que a gente, pai. – disse Heitor – Falo todo dia com alguns amigos e eles vivem perguntando como estão as coisas por aqui.

– Meu Insta está bombando, pai! O pessoal curte, comenta, manda mensagem... – emendou Marina.

– Ah, meus filhos! – disse Rosana – Eu fico muito feliz que vocês tenham gostado da mudança. Amanhã começa uma nova fase para vocês e também para a gente, pois não vemos a nossa vida separada da de vocês.

– Então, vamos fazer um brinde aos primeiros dias do resto de nossas vidas! – convidou Nelson.

Todos pegaram os respectivos copos e brindaram dizendo de uma só vez:

– Aos primeiros dias do resto de nossas vidas!

No dia seguinte, os dois irmãos saíram no fim da tarde e foram juntos para a faculdade, chegando lá trinta minutos antes do início da aula. Os dois se separaram logo na entrada e cada um foi para a sua respectiva sala. Ele precisou subir uma escada até o terceiro andar pois o elevador estava lotado e, quando chegou, sentou-se em uma carteira quase no fundo e ficou mexendo no celular enquanto as pessoas que já tinham chegado conversavam animadamente. Heitor então olhou para o lado, reconheceu Caio, o jovem que ele visto na secretaria no dia em que foi visitar a faculdade com a irmã, e disse:

– Aí, cara! Acho que foi para você que eu pedi uma informação há algumas semanas.

– Putz, cara! Acho que foi mesmo!

– Prazer, Heitor! Eu sou novo aqui na cidade e acabei de chegar do Paraná.

– Meu nome é Caio e não vejo a hora de terminar a faculdade. – disse brincando – Vamos lá fora um pouco? Está muito barulho aqui.

Heitor seguiu Caio até o corredor e, no caminho, passaram por duas alunas. O anfitrião do momento cumprimentou-as e depois apresentou o novo colega de turma. Elas retribuíram e depois entraram na sala.

– Elas são amigas? – perguntou o aluno recém-chegado.

– Depende do dia. Hoje pode ser que sim, amanhã pode ser que não... Elas são daquelas que vivem juntas, mas brigam por tudo e qualquer coisa. Aliás, as duas são da Comissão de Formatura e certamente vão te procurar para falar da nossa festa de fim de ano. Eu já fiquei com a Bruna e meu irmão é louco pela Talita, apaixonadão mesmo! Ele é um pouco mais novo que eu e estuda aqui também, mas faz aula de manhã no curso de engenharia civil. Ele disse que ia dar um pulo hoje à noite por causa do trote, mas duvido. O cara é muito preguiçoso. Gente boa, mas muito preguiçoso.

– E o seu irmão namora a Talita?

– Não. Eles ficam de vez em quando, ela sai sem ele às vezes e dizem até que fica com outros caras, mas ele nunca viu nada e ela nega. Meu irmão que é muito certinho e só fica com ela. Eu falo que ele precisa deixar de ser assim, curtir mais, mas ele não ouve. E você, cara! Veio do Paraná para São Paulo?

– Meu pai veio trabalhar e trouxe toda a família. Vim com minha mãe e minha irmã.

– Aquela menina que estava com você?

– Isso mesmo. A Marina é minha irmã.

– Poxa, com todo o respeito, mas ela é bem bonita! – disse Caio bastante impressionado.

Heitor riu por dentro pois, por mais que Caio tivesse demonstrado interesse em Marina, ele, definitivamente, era o tipo que ela menos tinha atração: estatura mediana, branco, magro, cabelos pretos arrepiados, olhos pretos castanhos e poucos pelos no rosto, fazendo com que os pouco mais de 20 anos parecessem 17 ou 18, apesar da voz forte e grave.

– Gosto de gente da minha cor para cima! – dizia Marina sempre que comentava sobre garotos.

– Um dia eu tenho certeza que você ainda morde a língua! – devolvia a mãe em tom de provocação.

Aproveitando o comentário sobre a irmã, ele disse:

– Ela estuda aqui também. Qualquer dia te apresento ela.

– Você mudou para São Paulo quando?

– Ah, a gente está aqui tem umas duas semanas mais ou menos. A gente se mudou no final de janeiro.

– Já conhece a cidade?

– Um pouco. A gente foi em alguns lugares, fizemos algumas fotos...

Neste momento, um rapaz se aproximou e Caio apresentou:

– Esse aqui é o Marcelo. Tem mais uns caras no nosso grupinho, mas depois te apresento, pois acho que quase nenhum vem hoje. Na hora do trote, fica junto dele, pois eu vou na sala pegar a bicharada e levar para a praça onde a gente vai se concentrar, a Talita vai me ajudar. Passa seu número, pois vou colocar você no grupo da sala e no Grupinho Dos Caras.

– O Grupinho dos Caras é foda. Esse é top! – disse Marcelo dando uma gargalhada.

– Marcelão, esse aqui é o Heitor. Ele é novo, veio do Paraná e é gente boa. Vai sentar com a gente no fundão.

– Bem-vindo, Heitor! – disse o novo colega apertando a mão de Heitor.

Heitor olhou para o novo colega de classe, um jovem loiro, alto, olhos verdes, muita barba, corpo forte, um pouco gordo e voz bem máscula, e disse:

– Obrigado, cara!

Enquanto Caio anotava o número do telefone de Heitor, uma professora passou por eles e disse:

– Meninos, vamos entrar?

Menos de uma hora depois, todos os alunos saíram da sala para o trote e o novato acompanhou o colega de sala indicado por Caio. Os dois foram para uma praça perto da faculdade junto com boa parte da sala e Bruna se aproximou de Heitor dizendo:

– Seja bem-vindo, Heitor! Se cansar de ficar perto dos garotos, pode me procurar.

Heitor começou a separar os materiais que seriam usados no trote quando viu um rapaz se aproximando, olhou para ele com mais atenção e então sentiu algo que nunca havia sentido. Era algo muito mais intenso e totalmente diferente de tudo o que já havia experimentado por qualquer pessoa até então, incluindo Flávio e Natalie. Era uma mistura entre a sensação ardente que, em um passado bem recente, havia sentido por Flávio e o carinho e a parcela do desejo um dia dedicado à Natalie.

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