A Presa

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É o terceiro dia que estou aqui.

O enjoo passou, os efeitos das drogas em meu organismo também. Mas só nesta manhã. De madrugada ainda tive a proeza de vomitar o jantar "cortês" que minha hospedeira me preparou. Hospedeira. Que piada.

Abby me trouxe berinjela assada recheada com queijo vegano e tomate. Preparou um suco de laranja delicioso - ou foi isso que me disse. Sempre há a possibilidade dela ter simplesmente comprado tudo pelo ifood, mas levando em conta que essa maluca é uma psicopata antissocial e que provavelmente deve viver isolada no meio do mato, estou propensa a acreditar que foi ela quem cozinhou a porra do meu jantar.

Não trocamos mais que duas palavras depois do meu vexame em vomitar na sua frente. Ainda estou pensando em como agir, no que dizer. Qualquer passo em falso e tudo desmorona. Eu preciso ser mais esperta do que ela se quiser escapar.

Mas precisei pedir pelo controle até então inexistente da televisão, e com um sorrisinho presunçoso, como se já esperasse por isso, ela me entregou e avisou que eu tinha acesso há uma infinidade de canais de filmes, séries, esportes, além de todos os streamings existentes até o momento na face da terra, o que me fez achá-la ainda mais metida a besta e me fez pensar que essa puta deve ser rica.

Como alguém consegue dedicar tanto tempo a observar outra pessoa, a segui-la por todos os cantos, tendo que trabalhar, sei lá, pelo menos umas oito horas enfiada em algum canto imundo ou até mesmo em um escritório? Não que Abby tenha cara de quem trabalharia toda engomada sentada em frente a um computador, mas... Estou só pensando em todas as possibilidades aqui.

Além disso, observei ontem que ela veio me ver mais três vezes. Trouxe almoço, jantar e uma ceia onde ficou um tempo parada à porta, como se pensasse se deveria ou não sair, enquanto me olhava. Eu fingi estar dormindo, fiquei encolhida e coberta até o queixo, mas pude sentir seus olhos cinzentos sobre mim, quase atravessando a porra do cobertor. Perturbador.

Como alguém tem tanto tempo livre? Só um desempregado. E, se ela está desempregada, mas ainda assim tem grana para bancar todas as refeições que me trouxe, os chocolatinhos veganos de brinde a cada refeição como se tentasse adestrar um cão, então sim, essa vadia é rica.

Gargalho ao pensar que fui sequestrada por uma ricaça. Essas coisas só podiam acontecer com você, Ellie Williams.

Bom... Poderia ser pior. Eu ficaria puta se um homem asqueroso louco para enfiar o pinto em mim tivesse me trazido para seu "calabouço" e ainda por cima fosse pobre e me obrigasse a comer merdas ruins derivadas de animais.

Calabouço. Que nome ridículo. Essa mulher tem um gosto muito estranho.

— Quero conversar.

Abby ergue as sobrancelhas. Ela acaba de colocar a bandeja com meu café da manhã sobre a mesa e estava prestes a sair.

— Sério? — a ideia parece... alegrá-la.

— Sim. — respiro fundo. Tente não ser tão você e estragar tudo, Ellie. Seja... delicada. Mas como? Puta que pariu. — Sobre... o motivo de você ter me trazido aqui.

— Para conhecê-la melhor.

Ela puxa a cadeira e senta à mesa comigo.

— É, isso.

— O que tem?

— Não faz sentido, cara.

— Por quê?

— Porque simplesmente não faz. A gente podia ter se conhecido lá fora. Estávamos a caminho disso, inclusive, antes de decidir me dopar e me arrastar para cá igual uma maníaca. — cuspo as palavras antes de conseguir me conter. Ótimo!

A Caçadora [ellabs]Onde histórias criam vida. Descubra agora