Capítulo 16

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As luz do sol entrava pelas janelas do restaurante enquanto Carrillo, Steve e Javier conversavam sobre coisas aleatórias na mesa. O cheiro da comida, o jeito em que as vozes de fundo ficavam abafadas, me levavam diretamente para quando eu tinha cinco anos.

Estávamos os três em um restaurante simples, não tínhamos uma vida luxuosa ou qualquer coisa parecida, mas aquele restaurante já havia se tornado um tipo de tradição familiar. O que eu mais adorava em estar com meus pais naquele lugar era que os dois podiam ser eles mesmos, podíamos ser uma família normal sem nenhum problema pessoal por algumas horas.
Aquela tarde foi quente, era verão em Bogotá e me lembro muito bem de irmos até uma das melhores sorveterias da cidade para nos refrescar. Minha mãe com o sorriso estampado no rosto, feliz por estar com meu pai em um momento de paz, e eu uma criança tão energizada que sequer desfrutei daquele momento o quanto deveria.

Tentei buscar mais memórias daquela tarde juntos, das broncas que minha mãe dava no carro, ou do jeito que ela olhava para mim como se eu fosse a pessoa mais preciosa do mundo. Eu queria poder voltar no tempo, conseguir ouvir a última respiração dela ou conseguir receber um último beijo de boa noite.
As memórias daquele dia me atormentavam, eu podia sentir a dor esmagadora em meu peito, a respiração descompensada, as lágrimas quente escorrendo pela minha bochecha. O cheiro das roupas que estavam no armário onde eu me escondia ou até mesmo o barulho do chute na porta.

A figura do homem alto entrando no quarto, os gritos exasperados atrás de meu pai — que não estava em casa aquela noite — e o choro da minha mãe soavam como demônios sussurrando em meu ouvido. Depois de anos eu acho que finalmente entendia o medo que minha mãe sentiu aquela noite, principalmente o medo que ela tinha de algo acontecer na minha frente.
E como tudo na minha vida era fora do normal, presenciar a morte dela por dezena de tiros contra seu corpo, não seria diferente. O homem que havia entrado em casa para matar meu pai, mudou de ideia e matou minha mãe, e só não fez o mesmo comigo porque não conseguiu me encontrar.

O grito preso em minha garganta, os olhos completamente embaçados pelas lágrimas, o tremor que tomava conta do meu corpo. Tudo isso era resultado de uma cena brutal cometida na frente de uma criança.
Cada vez que eu entrava na minha mente, ou sempre que minhas memórias me sabotavam e me levavam de volta aquele armário, era como se as horas passassem rastejadas assim como foi naquela noite. Junto com todo aquele medo que me perseguiu durante quarenta minutos, a dor de ver meu pai chorar aos pés de minha mãe também me consumia.

A desgraça começou a perdurar em minha vida de uma forma incessante, e tudo o que eu havia me tornado nesses últimos anos, era só um jeito de conseguir me safar de todos esses sentimentos cruéis.

"Louise, está tudo bem, querida." Meu pai dizia entre um sussurro e outro "Vai ficar tudo bem."

Sinto meus olhos queimarem e minha garganta arder enquanto eu tentava dizer alguma coisa.

— Louise, está tudo bem? — Javier sussurra em meu ouvido e me traz de volta para a realidade.

— Sim. — Percebo que os três me olhavam preocupados.

— Estamos te chamando faz uns dez minutos e você não respondeu. — Steve comenta.

— Vai ficar tudo bem. — Sinto meu estômago revirar ao dizer essa frase. — Eu só não estou legal hoje.

— Pode tirar o resto do dia de folga, acho que não temos nada muito específico, eu assumo seus relatórios. — O loiro sorri na tentativa de me confortar.

— Não precisa, eu vou trabalhar normalmente.

— É melhor ficar em casa descansando. — Javier diz baixinho enquanto acariciava minhas costas.

Monster in me - Javier PeñaOnde histórias criam vida. Descubra agora