Capítulo 21

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O barulho da caixa batendo contra o chão me assustou. Era apenas meu pai deixando a última coisa da mudança no apartamento de Javier. Ainda com as mãos na cintura, ele observava cada canto do apartamento fazendo uma cara impagável.

— Sabe que pode voltar para casa, se quiser. — Sua voz soa alta o suficiente para que eu ouvisse.

— Eu sei, mas lá também está ficando sem segurança. — Me aproximo dele com um copo de água da na mão. — Peguei água para você.

— E qual a segurança você tem aqui? — ele apenas pega o copo sem dizer nada.

— O Javier. — Digo tranquilamente. — Estamos juntos o tempo todo, e eu tenho um quarto separado aqui, vai ser bom.

— Você tem a mim em casa, e prefere o Javier? — O olhar dele ofendido chegava a ser engraçado.

— Por que te incomoda tanto eu gostar de estar com ele?

— Não me incomoda, só penso que poderia estar na sua casa, com seu amado pai, mas você prefere seu namorado. — Os ombros dele balançam fingindo não se importar.

Penso em insistir dizendo que Javier não era meu namorado, mas desisto.

— Faz anos que eu não moro com você, já deveria ter se acostumado com isso.

— Eu não vou me acostumar nunca.

Observei ele virar o copo de água de uma só vez e colocar sobre a mesa de centro da sala.

— O Gaviria autorizou que meu grupo de busca faça mais ataques. — Tinha algum tipo de animação na voz dele. — Em algum momento vou conseguir colocar as mãos naquele homem, e eu vou acabar com ele.

— Faça isso, e só assim vou conseguir dormir em paz. — Caminho pela sala e me sento no sofá. — Você não se sente sufocado?

— Como assim?

— Não podemos dar um passo sem sermos vigiados, e a cada pessoa fraca que encontramos no caminho, morre. Isso não tem tirado seu sono, ou te feito sentir que vai morrer sem que ninguém precise te matar? — Senti uma falta de ar repentina.

— Eu não me sinto bem, sei que muitas pessoas inocentes tem morrido por conta das nossas atitudes, mas não temos escolhas. No meio de uma guerra se vão pessoas boas e ruins, faz parte do processo. — Ele me observou com calma. — Se acha que você não pode fazer isso, eu posso dar um jeito de te tirar.

— Eu posso. — O respondo rapidamente. — Se eu não fizer isso, qual vai ser o sentido da minha vida? Eu nunca pensei em nada além dessa vida que eu já levo, pretendo ir até o final.

No fundo, eu sabia que esse sentimento era algo normal, principalmente quando se trabalhava com o mesmo que eu. E talvez eu nunca me perdoaria por tudo o que aconteceu, mas não era hora de parar.

— Ótimo, isso é ótimo. — O desconforto na voz dele era nítido.

Me encostei no sofá e fechei os olhos, esperando que quando os abrisse tudo aquilo tivesse sido apenas um sonho de mau gosto.

*

  A mesa de reuniões era composta por troca de olhares tensos. Javi encarava os mapas impressos sobre a mesa, enquanto Steve analisava cada foto do seu painel do cartel de Medellín. Permaneci sentada, bebericando meu café, apenas escutando as conversas que eles tinham.

  Os atentados de Escobar estavam ficando cada vez pior, e agora além de matar pessoas, ele usava bombas para matar ainda mais pessoas. E para tentar evitar a guerra, tudo que Gaviria nos deu era o máximo que ele podia fazer. As consequências estavam sendo devastadoras para os dois lados.
  O problema da guerra é que ela é ruim para os negócios, e quando você tem alvo nas costas, seus rivais ficam ousados. Pablo havia passado a se encontrar com Pacho, sim, Pablo e o cartel de Medellín não eram os únicos na cidade. Pacho era um dos quatro líderes do cartel de Cali.

Monster in me - Javier PeñaOnde histórias criam vida. Descubra agora