Nova York: 1 ano depois
A jovem mulher entrou em uma cafeteria segurando firmemente a mão do filho de três anos que abraçava um urso de pelúcia com um olho arrancado.
O homem misterioso que a seguia também entrou no café usando calça jeans e casaco com capuz, traje típico para aquele período do ano, tempo frio com chuvas finas. Vestido daquele jeito ele passava despercebido e o objetivo era exatamente esse: que ela não o percebesse até que ele fizesse o que tinha que ser feito.
Ela parou e analisou o ambiente. Ele parou também, sempre de cabeça baixa, escondendo o rosto, fingindo estar procurando alguém, um conhecido. O lugar estava cheio, ruidoso e logo ele a viu saindo. Ela parecia um pouco tensa e nervosa, sempre segurando a mão do menino, por isso ele precisava ser ágil e certeiro no que iria fazer; não havia espaço para erros.
A mulher caminhou em direção ao parque que ficava próximo às ruas 48 e 51, sentou no banco, ajeitou o garoto no mesmo e depositou ao lado as sacolas de compras das lojas de roupas por onde havia passado.
O homem ficou sentado em um banco do outro lado da praça onde a podia ver com facilidade. De cabeça baixa fingia ver mensagens no celular, mas o seu olhar estava direcionado a ela e ao menino; não podia perdê-los de vista depois de esperar tanto por aquela oportunidade. Tudo o que precisava era do momento exato para agir.
***
Sentada no banco do parque a jovem mulher olhou o rostinho inocente do filho por alguns instantes e respirou fundo para absorver o ar puro do ambiente. Estava um pouco incomodada, mas atribuía aquele desconforto ao isolamento que havia imputado para si e também para o garoto.
Olhou ao redor tentando relaxar. O lugar estava tranquilo e com pouca gente. Havia pessoas sentadas sobre toalhas comendo e conversando numa espécie de piquenique, outras tiravam fotos, buscando sempre os melhores ângulos. Porém, quem mais se divertia eram as crianças que corriam com liberdade sobre a grama verde com os cabelos emaranhados ao vento, sem se preocuparem com coisa alguma.
Voltou a olhar para o filho; Lucas tinha sempre o olhar perdido. Ele não era como as outras crianças e ela teve que se reinventar desde o dia em que recebeu do neuropsiquiatra o diagnóstico atestando que seu filho era diferente, especial.
Olhou no relógio de pulso e percebeu que já eram 17h35. Saiu do parque e buscou um caminho com pouca gente por onde pudesse andar livremente sem esbarrar nas pessoas. Era a primeira semana de dezembro e as festividades natalinas em Nova York estavam apenas começando, contudo, por causa da época mais movimentada do ano a maioria das ruas estava abarrotada.
Caminhava segurando fortemente a mão pequena do filho, com as sacolas penduradas nos dois braços e foi quando sentiu que ele havia diminuído o passo. Voltou-se para observá-lo e percebeu que os olhinhos do garoto estavam fixados na árvore de natal gigante do Rockefeller Center. Naquele momento a pressa dela acabou e sentou com o filho em um dos bancos diante daquele espetáculo de luzes coloridas. Não tinha nada de urgente para fazer em casa mesmo, então ia ficar ali com ele, feliz pelo filho ter demonstrado interesse em alguma coisa.
Tudo o que ela tinha de mais precioso na vida estava naquele garotinho de cabelos castanhos e lisos e por ele seria capaz de fazer qualquer coisa.
Observava atentamente o semblante do garoto que não desviava os olhos da árvore de natal, no entanto não percebia emoção alguma, mas ela o conhecia bem e sabia que eram raras às vezes em que ele se interessava por algo, mesmo que não soubesse demonstrar.
Naquele momento não conseguiu deixar de pensar na sua vida conturbada. Era a primeira vez que caminhava no meio de uma multidão depois que fugiu da ilha, há um ano. Desde então, escolheu viver isolada com o filho, sem ter vida social e quando necessitava de algo, ligava e pedia para que entregassem na sua residência.
Trabalhava em casa como tradutora para uma editora que publicava histórias infantis, portanto, podia exercer suas tarefas e ao mesmo tempo cuidar do filho observando o desenvolvimento da linguagem, atenção, emoções e demais fatores significativos para a sua evolução enquanto criança em desenvolvimento.
Lucas não participava de nenhum grupo para crianças especiais e também não ia à escola. Ela ainda não se sentia segura para envolver o filho num círculo social, mesmo conhecendo muitas instituições de ensino que trabalhavam com competência e responsabilidade no cuidado da criança com TEA. Na verdade, se resguardava porque tinha medo que descobrissem onde estavam.
Saiu do seu devaneio e observou que Lucas havia fechado as mãos com força enquanto jogava o corpo para frente e para trás. Estava nervoso porque o lugar começara a encher. Era hora de ir embora.
Naquele momento o telefone tocou dentro da bolsa. Ela virou para o lado ficando de costas para Lucas. O número era desconhecido, mas resolveu atender porque na editora havia os estagiários que passavam os recados da editora-chefe.
— Alô? — ela falou.
— ? — Silêncio do outro lado da linha.
— Alô? — falou mais alto por causa do barulho.
Insistiu mais um pouco tentando ignorar os ruídos ao redor e por fim desistiu guardando o telefone na bolsa. Levantou segurando as sacolas e virou-se para Lucas, mas...
Ele não estava lá.
Largou as sacolas no banco e começou a andar aflita ao redor chamando alto o nome do filho. Havia muita gente na praça e ela não estava conseguindo vê-lo em lugar algum. Perguntou para as pessoas que estavam sentadas próximas, mas ninguém o tinha visto, então saiu como louca, empurrando quem passava, gritando o nome dele, correndo de um lado para o outro.
Circulou ao redor da praça, dando a descrição dele para as pessoas, dizendo como estava vestido, mostrando a foto no celular, mas ninguém o viu; não estavam interessados no problema dela. Todos demonstravam indiferença diante da sua dor.
O desespero tomou conta dela. Sentia palpitações, tremores no corpo e muita culpa por ter exposto o filho ao perigo.
Depois de vasculhar todos os cantos possíveis ao redor do Plaza ela voltou para o banco, sentou e ficou extática, olhando para frente. O que deveria fazer? Não podia procurar a polícia, seus algozes certamente a encontrariam; ou talvez já a tivessem encontrado.
Assustada, preocupada e confusa sobre o que deveria fazer, passou a noite sentada no banco em frente à enorme árvore de natal do Rockefeller Center. Estava em choque.
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Cobaia 52
Mystery / ThrillerEla casa com um cientista bilionário, louco e perverso, herdeiro de uma empresa farmacêutica multinacional. É mantida prisioneira numa ilha durante quatro anos, usada como cobaia em um experimento científico e tem a sua saúde física e mental desesta...