Aquela noite estava sendo muito longa. A chuva diminuiu, porém o vento ainda uivava e o frio aumentava de maneira assustadora.
Entrou no quarto, jogou a maleta marrom sobre a cama e seguiu para o banheiro. Tirou a capa de chuva preta jogando-a no chão, em seguida lavou o punhal e as mãos sujas de sangue na pia.
Parou na frente do espelho e arrancou a barba negra postiça, em seguida puxou a peruca de cabelos curtos e os cabelos lisos desceram até os ombros.
Maldita idosa idiota! Se não fosse tão covarde ainda estaria viva. No passado a velha foi útil dedicando-se a menina sofrida e órfã que havia sido internada diversas vezes em hospitais psiquiátricos depois de perder a mãe. Mas a governanta mudou, não era mais a mesma pessoa, guardava segredos, escondia coisas. Porém a confirmação da sua deslealdade só aconteceu depois que ela pegou o garoto sem o seu consentimento e o deixou na porta do hospital. Agora ela estava morta e não iria mais interferir nas suas decisões. Quem precisava de uma governanta manca no seu encalço?
Encarou o espelho e apontou para o seu reflexo. Seria novamente Simona Gasparri, a garota que sabia disfarçar a solidão e treinava para mostrar-se descolada e sociável. Na verdade, ela nunca foi popular na escola, porém o dinheiro do pai a colocava sempre em destaque.
Quando conheceu Ravena percebeu que ambas coincidentemente se pareciam porque traziam dentro de si um deserto repleto de ausência de coisas e imediatamente ela amou Ravena. Mas com a mesma força com que com o amor chegou o ódio surgiu como uma avalanche e preencheu o seu interior não deixando espaço para nenhum outro tipo de sentimento.
Não tinha mais que fingir que era senhor Blake ou Reddington, apesar de ter passado bons momentos interpretando esses papéis. Sim, e um dos melhores foi quando senhor Blake apunhalou Lina Anderson porque a mulher falava demais e era muito bisbilhoteira.
Havia chegado a um grau de consciência sobre a sua vida que agora seria tudo ou nada. Iria recuperar o garoto de qualquer jeito e se vingaria de Ravena tirando tudo dela.
Naquele momento sua mente transtornada viu a imagem mudar e já não era mais ela quem o espelho mostrava e sim Ravena. Subitamente Simona esmurrou o espelho com força cortando a mão e espalhando pedaços de vidro pelo chão.
Em seguida sentou no chão abraçando os joelhos, enquanto pingos de sangue vindos da mão cortada formavam poças no chão.
***
Simona nunca havia pensado em ter filhos, mas quando engravidou de Paolo por ter se esquecido de usar a pílula sentiu-se estranhamente feliz e amou de imediato aquele pequeno ser que estava se formando dentro dela. Fez muitos planos para o futuro imaginando-se com a barriga enorme e pesada, parindo agachada dentro de um rio e dando o seio volumoso para o filho mamar.
Mas Ravena, que fingia ser sua amiga, se colocou entre eles para usurpar a sua vida. Ela seduziu e enfeitiçou Paolo e depois o convenceu a matar o seu bebê porque tinha inveja. E depois que Simona perdeu tudo, Ravena se casou com Paolo e teve um filho para mostrar que era superior.
Não podia aceitar que Ravena se deleitasse no prazer de ter um filho enquanto o seu estava morto e tudo por culpa dela.
***
Sabendo que não conseguiria convencê-la a interromper a gravidez, Paolo bolou um plano: na noite marcada para fazer o aborto ele a levou para passear na praia, parou o carro na areia e abriu uma garrafa de champagne. A intenção era embriagá-la e levá-la adormecida para a clínica, mas Simona se recusou terminantemente a beber por causa da gravidez. Tiveram uma briga e Paolo decidido, ligou o carro e parou na frente da clínica de aborto.
Quando Simona entendeu o que estava acontecendo tentou fugir, mas Paolo a arrastou puxando-a pelo cabelo e a entregou nas mãos do médico. Aos prantos chutando, mordendo e dando cabeçadas para todos os lados Simona lutou com o médico e com os dois enfermeiros, mas sem sucesso. Foi levada para um tipo de centro cirúrgico, amarrada na maca e deu-se início ao procedimento. Ela viu e sentiu tudo. Teve as pernas afastadas e um objeto foi introduzido nela. Em seguida tiraram o bebê já de quatro meses de dentro dela e o colocaram em um saco plástico jogando-o de qualquer jeito sobre uma bancada de inox. Naquele momento uma dor profunda rasgou seu coração e ela sentiu-se vazia e inútil.
Dias depois quando estava se recuperando no quarto pós-cirúrgico, Simona cortou os pulsos com uma tesoura que estava na mesinha de cabeceira, mas foi imediatamente socorrida e teve sua vida salva.
Alguns dias se passaram, Paolo foi buscá-la na clínica de aborto e a internou num hospital para doentes mentais. Lá, Simona tomava diariamente vários tipos de medicamentos que a mantinham dopada o tempo todo. Andava pelos corredores descabelada e fedendo, pois não controlava a urina que descia quente pelas pernas formando poças no chão.
Certo dia, foi estuprada por um enfermeiro do hospital enquanto descansava perto do lago, sentada no banco de cimento. Ele a jogou no chão e tapou sua boca com a mão para ela não gritar, mas quando terminou, enquanto ele ajeitava a roupa, ela estourou a cabeça dele com uma pedra.
Foi a primeira vez que matou alguém e sentiu um êxtase difícil de conter. Naquele momento, enquanto olhava o corpo do enfermeiro inerte no chão, parecia-lhe que a vida havia ficado mais emocionante.
Na semana seguinte matou o psiquiatra que a acompanhava, com várias furadas de caneta no pescoço depois que ele meteu a mão debaixo da sua roupa e apalpou o seu sexo. Saiu da sala cantando e dançando antes de ser pega e jogada na solitária.
Quando aconteceu a rebelião e alguém ateou fogo no pátio do manicômio, muitos internos fugiram. Depois que Simona conseguiu passar pelo portão principal foi perseguida por um guarda e o matou com vários golpes da tesoura que carregava no bolso. Mais uma vez sentiu satisfação e euforia.
Depois disso, invadiu uma fazenda próxima e roubou um telefone. Em seguida ligou para Rosita, sua governanta, que passou a lhe dar apoio e proteção.
Porém, de tudo o que já vivenciou, havia uma coisa que jamais esqueceria: a noite em que Ravena destruiu a última esperança que ela tinha de ser feliz quando ordenou que fizessem nela a maldita cirurgia.
Depois daquele dia Simona passou a conviver diariamente com um fantasma, uma assombração que a perseguia o tempo todo apontando a sua incapacidade, mostrando a sua solidão, e não importava onde estivesse aquela lembrança não a deixava em paz. Quando fechava os olhos revivia todo o martírio que passou e o ódio dentro dela só fazia crescer.
Mas o que a alimentava dia e noite era o desejo de vingar-se de Ravena.
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Mais segredos virão à tona nos próximos capítulos.
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Cobaia 52
Mystery / ThrillerEla casa com um cientista bilionário, louco e perverso, herdeiro de uma empresa farmacêutica multinacional. É mantida prisioneira numa ilha durante quatro anos, usada como cobaia em um experimento científico e tem a sua saúde física e mental desesta...