38_ Último pedido

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O caminho até minha casa foi estranho e silencioso. Trevor e eu não sabíamos exatamente o que falar, acho que porque não sabíamos o que estava rolando ali. Ambos sabíamos de nossos sentimentos. Ele sabia que eu estava apaixonada por ele e eu sabia que ele estava ao menos afim de mim. Mas, não sabíamos o que era aquilo que tínhamos. Devia ser só uma amizade, mas não parecia.

Ele parou o carro quando chegamos na rua da minha casa, dessa vez, ele parou em frente ao portão e desligou o carro. Era agora. O momento de enfrentar a situação e decidir o que iria acontecer.

Senti minhas pernas estremecerem só de pensar em qual solução chegaríamos. Queria que fosse menos complicado. Por que eu não me apaixonei por alguém mais fácil? Por algum vizinho, por exemplo? Não, eu precisava me apaixonar pelo cara que vai para mais de dez mil quilômetros de distância daqui um tempo. Na verdade, nem sei quando ele vai.

ㅡ Você... Já tem uma data marcada para voltar pros Estados Unidos? ㅡ Iniciei a conversa com uma pergunta péssima. Puxei o ar apertando a mochila em meu colo, ansiando pela sua resposta.

ㅡ Sim. ㅡ Sua resposta me fez murchar no banco. Não me importei dele ter percebido. ㅡ Viajei para cinco países nos últimos seis meses. No dia dezoito do mês que vem eu volto pra casa.

ㅡ Dia dezoito? ㅡ O olhei. ㅡ Isso é um dia depois do casamento da Mônica.

ㅡ Eu sei. E ela sabe disso também. Disse que vai considerar sua festa de casamento como minha festa de despedida também. ㅡ Só de ouvir a palavra " despedida " o meu coração se partia em dezenas de pedaços.

ㅡ Como é a sua vida nos Estados Unidos? ㅡ Tentei enrolar. Não estava nem um pouco afim de entrar em casa e deixa-lo ir embora.

ㅡ Tranquila e agitada ao mesmo tempo. Lá não sou apenas aluno, como também professor de dança na CA matriz. Pela fama do meu pai, as pessoas já imaginam que eu tenho o talento no sangue e sempre me jogam responsabilidades. Com relação ao meu trabalho, minha vida é agitada, mas com relação a minha pessoal, é tudo bem tranquilo. Sou vizinho da minha mãe e só tenho um amigo. Convivo mais com meus cachorros, que levo para todo lugar. ㅡ Ele sorriu observando o volante. ㅡ Cresci lá. Nunca nem mudei de bairro. Só comprei a casa ao lado para deixar a dos meus pais apenas para minha mãe.

ㅡ Deve ser muito legal. ㅡ Encarei a rua vazia pelo parabrisa. ㅡ Você trabalha com o que gosta e fica perto das pessoas que ama. ㅡ Ele me olhou e eu acabei o olhando também.

ㅡ Eu queria que as coisas fossem diferentes...

ㅡ Eu também. ㅡ Abaixei a cabeça.

O silêncio dominou o carro mais uma vez, até Trevor se virar para trás e puxar do banco uma caixa de sapato.

ㅡ Toma. ㅡ Fiz uma careta segurando a caixa, mas abri antes de perguntar. Era um tênis. Um belo de um nike branco. ㅡ Comprei pra você no dia da chuva, mas esqueci de te entregar.

ㅡ Eu não... Eu não posso aceitar, eu...

ㅡ Você vai ter que aceitar. Não tenho o que fazer com um tênis tamanho 35. ㅡ Ele riu e indicou o seu pé, possivelmente tamanho 42.

ㅡ Obrigada. ㅡ Fechei a caixa novamente. ㅡ Então.... Nós... ㅡ  Eu não sabia exatamente como perguntar ou afirmar aquilo. Era óbvio que não tínhamos e nem teríamos nada, mas finalizar a migalha que estávamos tendo era tão difícil... ㅡ Digo... Amigos, certo? ㅡ Mordi o lábio inferior para evitar que tremesse.

Trevor me encarou com uma expressão que me fez crer que aquilo doía tanto nele quanto em mim.

ㅡ Certo. ㅡ Ele concordou com a cabeça e segurou o voltante com força. Abri a porta do carro e saí antes que me sentisse sufocada. Passei por trás até subir na calçada e parei na frente do meu portão.

Virei-me para ele de novo. Ele estava de moletom.

ㅡ Trevor? ㅡ Ele olhou para mim pela janela quase que de imediato. ㅡ Posso pedir uma última coisa? ㅡ Abriu a porta do carro e parou na minha frente. ㅡ Pode me dar um abraço?

Ele não me respondeu, ele apenas me puxou com pressa e me abraçou. Ele me abraçou como se quisesse ter feito aquilo o dia inteiro. E eu amei. Amei cada detalhe daquele abraço. Amei cada segundo. Aproveitei o máximo que pude a sensação de lar que aquilo me passava. Eu não o soltei e ele também não. Senti que ficaria ali a noite inteira se pudesse.

ㅡ Também posso pedir uma última coisa? ㅡ Ouvi-o falar no pé do meu ouvido e senti o meu pescoço se arrepiar.

ㅡ O que?

ㅡ Pode me dar um beijo? ㅡ Meu coração disparou. Minha respiração falhou e tudo que consegui fazer foi olhar para ele e assentir.

Trevor trouxe uma de suas mãos das minhas costas até o meu rosto. A palma de sua mão quente tocou a minha bochecha e acariciou minha pele com a ponta do seu dedão. Fechei os olhos sentindo o calor que sua mão transmitia, mas os abri quando sua outra mão apertou a minha cintura, me fazendo ficar fraca na hora.

Observei os seus olhos segundos antes de me unir a ele num beijo. Beijo que eu estava ansiosa para sentir o gosto novamente. Beijo que fizemos de tudo para durar, mas que ao final já não tinha gosto de beijo, e sim de lágrimas.

Nos separamos pela falta de ar, mas suas mãos continuaram em mim.

ㅡ Vai... ㅡ Sussurrei.

Trevor apertou os olhos com força, me roubou um último selinho e entrou no carro, batendo a porta logo depois. Sequei o meu rosto e passei pelo portão para que ele pudesse ir embora.

Era isso. Iríamos superar, certo? Com sorte nos encontraremos no futuro, felizes, com carreiras incríveis e talvez casados com outras pessoas.

Cinco dias depois...

A semana se passou e sábado chegou. Era o dia quem Íris marcou de almoçar na casa dos meus pais. Achei incrível a minha mãe ter permitido. Em geral, eu gostava dos almoços em família, ainda mais quando meus amigos estavam presentes. O que me deixava apreensiva era que Trevor também estaria presente, já que Kevin e Íris insistiram que ele fosse também.

Trevor e eu não nos falamos muito desde a segunda-feira em que decidimos que nada vai acontecer entre nós mesmo. Não sei se por medo de fazermos algo indevido ou só pelo clima estranho, mas nos evitamos quase que a semana toda.

Hoje não teríamos escapatória. Estaríamos na mesma casa e nossos amigos nos shippam. Teríamos que nos falar e agir naturalmente durante o almoço inteiro.

Eu estava sentada na frente da minha penteadeira já tinha umas meia hora tentando me sentir apresentável. Eu não era de demorar a me arrumar, mas queria naquele dia.

Passei a mão no meu cabelo, jogando os fios lisos para minhas costas e encarei o meu reflexo. Meu olhar parou na minha boca. Levei minha mão até meu rosto e toquei os meus lábios com a ponta do dedo indicador. Fechei os olhos e me lembrei da noite de segunda. Eu jurava que ainda podia sentir o gosto dos lábios dele.

Abri os olhos e observei o moletom dele pendurado na cadeira.

ㅡ Eu preciso esquecer isso. ㅡ Me levantei da cadeira. ㅡ Vou ir almoçar com a minha família, em breve sai o resultado do vídeo que mandamos pra Los Angeles, semana que vem vamos dançar no desfile cívico e eu preciso estar com a cabeça no lugar. Não vou deixar um sentimento mexer tanto comigo. ㅡ Falei comigo mesma, mas acabei rindo ao meu lembrar do dia em que pensei que eu era uma pessoa sem sentimentos por ter esquecido rapidamente do Nicolas. ㅡ Acho que eu tenho um coração, afinal.

Peguei a minha ecobag, o meu celular e mandei uma mensagem para minha mãe avisando que estava indo.

Encarei novamente o meu reflexo no espelho e assenti. Ia correr tudo bem.

•••
Continua...

Te Pedi para a Estrela CadenteOnde histórias criam vida. Descubra agora