Era cedo quando Anelise saiu de seu quarto e resolveu passear pelo jardim daquele casarão. Ao menos poderia aproveitar a beleza das flores enquanto estivesse naquela prisão.
Havia passado a noite chorando e as suas angústias tinham se aprofundado ainda mais. Passeava entre as rosas para ouvir um pouco distante o som de água. Procurou de onde vinha o barulho até encontrar atrás de um muro de flores um lago, nele possuía um pato marrom com a cabeça em tons de verde. E, como se um sopro de esperança tivesse ecoado em seu ser, ela se aproximou do pier e se sentou.
— O que você faz aqui sozinho? — ela perguntou para o pato, que pareceu se achegar.
A aproximação do animal moveu o íntimo de Anelise e as lágrimas se soltaram, rolando pelo rosto. Sua sensibilidade estava ao extremo aqueles dias e o pato não entenderia mesmo suas emoções descontroladas, então se achava livre por uns instantes. Estava tão cansada de se sentir sozinha e abandonada. Parecia ser como a pobre ave a sua frente, que não tinha ninguém e vivia sozinho naquela água. Mas o lago de Anelise era o mundo.
Desde criança se viu só quando seus pais faleceram, indo parar num abrigo. Sendo acolhida com outras crianças e cuidada, de certa forma. Mas o sentimento de não pertencimento sempre esteve presente. Ao completar 18 anos já não estava sob a tutela do estado, porém foi recebida pelas irmãs Marília, Sandra e Helena que a convidaram para viver no Instituto Florence, um lugar de ensino que funcionava como um abrigo, aberto e sustentado pela igreja. Ali ela morava e trabalhava, ganhando até um salário modesto.
Naquele período, provava como Deus cuidou da sua vida, apesar de ser tão difícil. Porém, não imaginava que sofreria um golpe daquele de ser sequestrada e outra vez ali estava com o sentimento de não pertencer a lugar algum. Havia demorado anos para se estabelecer e viver de forma convicta sobre onde estava ser mesmo real. E, agora, voltou a estaca zero.
Além disso, o peso de suas más ações começaram a pesar em seus ombros. Estava agindo errado, sabia disso. Suas palavras ferinas, ações inconsequentes não pregavam em nada uma vida regenerada pelo Espírito. Onde estava sua fé? Onde estava o seu desejo de fazer Cristo conhecido? Tudo aquilo não passava de mentiras se num momento tão crítico ela agisse como qualquer outro ímpio.
— Ah, meu Deus! — Apertou os olhos e mais lágrimas desceram. — Eu tenho falhado tanto. Tenho sentido como se o Senhor, ao permitir isso, estivesse contra mim. Estou ferida no meu coração. — Orava com sinceridade. — Sinto que me perdi de Ti. Talvez o Senhor tenha permitido tudo isso para testar minha fé. Se eu te serviria somente quando as coisas estivessem boas. Me perdoe!
Ela passou as mãos entre os cachos e respirou fundo. A memória de algumas pregações voltaram a sua mente.
— Eu ouvi tantas vezes as histórias de missionários que foram presos encarcerados por amor do Teu nome. E eles foram fiéis até o fim. Eu não fui sequestrada por esse motivo, mas se estou aqui é porque tem algum propósito. Bom, eu espero que tenha — Suspirou. — Deve ter, pois sabemos que nada na vida do crente acontece se não for permissão Tua. Me ajuda a ser cristã aqui. Me auxilia mesmo nessa pior crise. Senhor, não me abandone, por favor! — Mais lágrimas caíram e ela sabia que seu coração estava em cacos.
O pato começou a fazer barulho, Anelise abriu os olhos e o vendo mais perto sorriu, conseguindo até fazer um carinho nele.
— Vamos ser amigos! — Fungou e limpou as lágrimas. — Sabe, tenho precisado de um companheiro, caro patinho. — Ela colocou a mão no queixo. — Eu vou dar um nome para você — Pensou um pouco. — Sr. Donald combina bem, não é? — Lise riu. — Eu sou a Anelise, Sr. Donald, e foi um imenso prazer te conhecer. Não se preocupe que todos os dias o visitarei. Obrigada por existir. — Se pudesse teria abraçado o animal, mas sua postura mostrava um refinamento digno do personagem do pato Donald.
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Se Ficares Aqui
RomansLonge do seu país, Anelise vê seu mundo ir ao chão quando é sequestrada pelo clã Brassard. Ela tenta de todas as formas fugir, porém seus planos são frustrados. E o único lugar em quem buscará segurança é no homem que deveria odiar. Mas muitos acont...