Substancial

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A realidade pareceu operar em câmera lenta quando Lennon retornou à torre NYCZ.

Cada passo era sentido como uma pancada surda, vibrando e redirecionando força até o núcleo da terra. Era a raiva da desconfiança, mas também era do poder que emanava de cada decisão sua, e ele sabia que ninguém mais iria errar dali em diante. O que havia acontecido foi só uma amostra do que ele era capaz de fazer –e do poderio que ele colocaria a campo.

Cenas de um horror inimaginável eram exibidas em todos os aparelhos da empresa. A performance macabra executada por Bianca e Cytt tinha tons vermelhos que escorriam sobre lentes que filmavam cada pedaço do LarNova. O único som que saía dali era o de gargantas se afogando no próprio sangue, uma submersão lenta e dolorosa... E até que a vida findasse totalmente dali, levariam uns bons dias.

Os nanochips que lhes davam vida agora iriam prolonga-la a ponto de se arrependerem de tê-los dentro de si. A dádiva e a maldição da lealdade.

Lennon cruzou as entranhas de sua torre e seguiu ao seu quarto; passou o resto do dia em completo silêncio ainda que a mente mostrasse grande inquietação. Gostaria de visitar McCartney novamente, mas sabendo que ele estaria de volta à suíte número dois na manhã seguinte, optou por deixa-lo descansar apropriadamente –Estava bem protegido sob os olhos vigilantes de Smith, que a qualquer sinal de instabilidade, iria comunicar tudo prontamente ao seu mestre.

Pela madrugada resolveu dormir, já fazia um bom tempo desde o seu último sono, e mais tempo ainda desde que esvaziou a mente. Talvez reiniciar seu próprio sistema o ajudasse a não arranjar problemas, ademais, não teria que esperar mais tanto tempo acordado para ver seu aprendiz. Trocou as roupas e foi coberto pelo descanso artificial.

♦♦♦

Bem cedo já despertava com batidas na porta. Myvis havia retornado e deixava com ele o aviso de que McCartney já ocupava novamente sua respectiva suíte. Tratou de se arrumar para ir até ele. Precisava contar sobre tudo, era necessário.

A grande questão de contar a McCartney sobre o ocorrido foi um dos problemas que teve que lidar nas primeiras horas após o acerto de contas. Ruminou incessantemente sobre tudo, inclusive a natureza de seu relacionamento. A resiliência em algum momento veio a seu favor, mas não sabia se ela se faria presente também em seu aprendiz quando o deixasse ciente; uma coisa foi tê-lo assegurado proteção e recompensas ao adentrar naquela guerra, outra coisa foi fazê-lo encarar uma realidade distorcida por caprichos seus e de seus outros aprendizes que até então lhe eram leais.

Respirou fundo para encarar qualquer coisa que fosse. Lutaria por ele, mesmo sem ele.

Duas suaves batidas e já se encontrara dentro do cômodo que há muito não havia pisado, avistando seu tão corajoso aprendiz escorado na cabeceira da cama. Foi recebido com um sorriso gracioso.

-Bom dia, John.

-Bom dia. –Fechou a porta. –Como está se sentindo hoje?

-Cansado, mas bem. E você?

-Ainda muito pensativo... –Sentou-se na cama junto a ele.

-Algo a ver com o seu grito de ontem? Acho que todos ouvimos por ali. Digamos que foi bem... Preocupante.

-Sim, sim. –Suspirou. –Foi a minha reação ao saber de algumas coisas que te envolviam.

-Algo que eu fiz?

-Na verdade foi algo que fizeram a você.

-Não entendo... –McCartney balançou a cabeça em confusão. Àquele ponto a própria memória estava reduzida sobre os eventos específicos. –O que fizeram comigo?

FIXAÇÃO - MclennonOnde histórias criam vida. Descubra agora