Capítulo 11

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Jhony

Era domingo à tarde e vovó finalmente aceitou fazer as panquecas de banana que implorei a manhã toda. Elas eram deliciosas e desde ontem eu não queria saber de comer outra coisa. Quis panqueca na janta, no café da manhã, em qualquer refeição eu tentava enfiar panqueca com geleia.

Talvez eu tenha viciado.

Joana sacudia as pernas gorduchas na cadeirinha de refeição atrás de mim e grunhia alguma coisa incompreensível conforme se deliciava com a banana que ganhou em troca de ficar quietinha enquanto vovó cozinhava e eu assistia atentamente.

Vovó era como uma grande luz na escuridão daquela casa. Uma flor desabrochando em terra seca. Sua presença me deixava tão seguro, que eu não me obrigava a ficar com a Joana nos braços para sair correndo em caso de emergência. Não tinha cobranças penduradas em meus ouvidos, nem o peso das responsabilidades em meus ombros. Eu consegui dar liberdade a minha irmãzinha, e essa liberdade deixou seu rosto, pescoço e a gola da camiseta com pedaços de fruta e muita baba. A mãozinha que tentava guiar a banana até a boca, era um trem desgovernado que a deixou uma sujeira só, mas ela estava se divertindo conhecendo a capacidade do próprio corpo. Estava feliz.

Feliz como eu, por termos por perto alguém para cuidar de nós. Por termos outra vez o calor inofensivo aquecendo as paredes de casa, o cheiro da infância entrando pelas janelas que nunca mais tinham sido abertas. Tudo era confortável com nossa avó por perto.

Tudo era como deveria ser. Inocente.

— Se continuar em cima de mim desse jeito, vou acabar fazendo coisa errada. Parece uma sombra, eu hein — reclamou vovó em um timbre suave, me olhando por cima do ombro conforme seus dedos descascavam a segunda banana. Ela tinha algo especial nos olhos toda vez que me olhava. Eles se iluminavam como se vissem algo bom em mim.

— Quero aprender — respondi, agora observando-a amassar as bananas em uma vasilha com garfo.

— Aprender? — perguntou em um tom entediado.

— É. Quando eu for na casa da minha amiga, quero fazer para ela.

— Uma amiga? — animou-se, pegando os dois ovos em cima da pia. Os quebrou na quina da pia e juntou às bananas amassadas. Em seguida, jogou uma colher de açúcar e começou a bater com o garfo. — Você tem uma amiga menina?

Confessei que sim.

— Geralmente garotos da sua idade não têm muita paciência para garotas e suas brincadeiras. Bonecas, casinha, essas coisas.

— Essa não quer saber dessas brincadeiras não. Ela é... diferente.

— Diferente? — girou a vasilha enquanto batia.

— Eu que pareço uma menininha perto dela — respondi na lata, dominado pela frustração. — Ela é toda corajosa e durona. Eu sou todo medroso e preocupado. — Tirei os olhos da vasilha e ergui para seu rosto. — Será que ela vai rir de mim por fazer panqueca para ela?  Ai, meu Deus, vou parecer uma garotinha brincando de casinha!?

A boca da vovó tremeu com uma gargalhada alta, afundei naquela gargalhada feliz. Um som bonito que queimava meu coração, diferente dos gritos que mamãe dava quando eu a irritava.

Jhony Trouble Onde histórias criam vida. Descubra agora