Capítulo 46

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Gabrielle

— O que essa mulher te fez, pelo amor de Deus. — Eu não conseguia esconder a sensação incômoda depois do que vi. — Eu só penso em quando você era criança e ia me encontrar. Essas coisas aconteciam? Alguma vez foi me ver machucado!?

— Não fique remoendo. Esqueça o que viu. Já passou...

— Não. Não vou esquecer. — Me apressei em dizer, batendo o pé formigado de medo. — As feridas estão aí e são horríveis. Sua camisa está cheia de manchas vermelhas que eu ingenuamente confundi com terra. Você não pode apenas ignorar. Alguns cortes talvez precisem de pontos. Devemos... devemos ir a um pronto-socorro, Jhony. — Suas costas era uma das coisas que não deixava de me assombrar. Eu lembrava até do último e menor detalhe. Nunca vi nada como aquilo, linhas tão profundas quanto tatuagens e causadas por alguém que deveria protegê-lo. Minha maldita mente não era capaz de entender como alguém foi capaz de carregar um bebê em sua barriga por tantos meses, para no fim maltratá-lo.
Não pude proteger e cuidar desse bebê, mas juro por tudo que mais importava na minha vida: eu protegeria esse garoto.

— Não. Não quero que ninguém veja, eu teria que dar explicações. Não devia ter mostrado nem para você.

— Eu sou a única que viu?

Jhony se abaixou, pegou uma pedrinha e a lançou pelo monte. Ele não parecia nenhum pouco feliz.

— É.

— Não mostrou nem para o seu pai? — questionei, lúgubre e insistente, apesar do seu rosto me pedir o oposto: pare. — Ele não sabe o que sua mãe te fez!? Não sabe da briga entre vocês?

— Ele tem coisas melhores para fazer, do que me dar migalhas de atenção. — A ironia foi repentina demais e nem conseguiu olhar para mim. Lançou outra pedra, dessa vez na direção de uma pomba que saiu voando mesmo sem ser atingida.

— Nenhum pai é ocupado demais para o próprio filho, ainda mais se o filho estiver na situação que você está. — Seus movimentos abruptos me encolhiam como se seus rasgos estivessem em minha carne. O agarrei pelo braço antes que lançasse uma terceira pedra em alguma ave que não teria a mesma sorte que a primeira. — Eu sei que a situação nem se compara, mas quando minha mãe morreu, conversar com o meu pai ajudou. Pode ser que falar com o seu te ajude, mesmo ele sendo um bosta, mesmo sendo ausente. Converse com ele, talvez você se surpreenda.

Por alguma razão, sua risada roncou pelo nariz como o motor de uma caminhonete e fez eu me sentir uma estúpida.

— Sabe que a relação que você tem com o seu pai, está muito longe da relação que tenho com o meu — me encarou enviesado, e depois para meus dedos firmes em seu pulso. — Não tem a menor possibilidade de ele me surpreender. Não positivamente.

— Jhony, ele ainda é seu pai — ergui um dedo por vez até soltá-lo. — Ele tem o dever de cuidar de vocês. Ainda mais agora, que sua mãe... Bem, ele não pode mais continuar ignorando os deveres de pai.

Um desvio rápido de olhos.

— Ele não se preocupava comigo nem quando eu tinha dez anos. Agora está mais preocupado em cuidar do bebê na barriga da namorada.

— Bebê? Mas que bebê? A namorada dele está grávida?

— Sim. Vão casar em breve e construir uma linda família!

Jhony Trouble Onde histórias criam vida. Descubra agora