Jhony
A mãe ergueu a mão para me bater outra vez, mas alguma coisa ou alguém a impediu.Eu ainda tentava me recuperar do tabefe na bochecha, quando ouvi meu pai dizer:
— Para com isso, Cláudia. As pessoas vão ouvir e ver. Feche essa porta, Jhonathan!
Eu fechei nervosamente, ainda sem qualquer explicação por ter apanhado. Minha bochecha ardia tanto, que parecia queimada. Mas não afaguei por receio de fazer qualquer movimento e apanhar de novo.
— Esse moleque é um mentiroso e merece apanhar para aprender a não contar mentiras! — Ela acusou possessa. Seu vestido, completamente ensopado, pingava sobre seus pés descalços. Os cabelos escuros e ralos gotejavam nos ombros. A impressão que dava, era a de que ela caiu em uma piscina, mesmo sem termos uma. — Você sabe que ele é maldoso, Humberto. Sabe que quer virar todos dessa casa contra mim!
— Pai? — o chamei. Precisava que alguém contasse o que fiz de errado.
— Sua mãe disse que não foi ela quem fez aquela bagunça na cozinha — respondeu, sem saber para qual de nós olhava. Como ela, ele também estava molhado, só que apenas na manga da camisa e um pouco nas pernas. O que aconteceu entre eles? — Que a culpa foi sua.
Paralisei. Culpa minha? Meu pensamento rugiu, enquanto minha garganta não emitia som nenhum. Olhando para ela, via-se uma frieza quase paralisante. Mamãe não tinha sombra de remorso ou a vergonha de quem mentia descaradamente. Pelo contrário, sua postura era tão confiante, que cheguei a pensar que o mentiroso era eu, que me encolhia inteirinho.
— Foi ele! Foi ele — acusou com o dedo apontado na minha cara. Suas bochechas rosadas como se atacadas por amoras. — Ele me fez fazer isso e agora não admite. Não admite. Esse moleque não vai descansar até acabar comigo, foi para isso que ele nasceu. É o mau encarnado, ouça o que eu digo. O quero bem longe de mim. Leve ele daqui. Leve. Leve agora — ela repetia sem parar.
— Tudo bem, calma. Respira fundo — papai colocou as mãos em seus ombros e usou um timbre baixo. — Onde seus remédios estão? Você não tem tomado?
Balançando a cabeça, vociferou:
— NÃO PRECISO DE REMÉDIO. PRECISO QUE ESSE MOLEQUE PARE DE TENTAR ME MANIPULAR. — Tamanho era o ódio que entortava a sua cara.
— Eu darei uma lição nele — respondeu, a todo instante tentando acalmá-la —, mas você precisa tomar seus remédios primeiro. Está bem?
Lição em mim? Tomei um gole de saliva.
— Pai, eu não fiz nada — desgrudei os lábios e busquei seus olhos com ressentimento. Eu tinha contado a verdade para ele, confiei que estaria do meu lado e agora, para a minha indignação, apanharia da única pessoa que achei que cuidaria de mim. Que me acolheria e protegeria de tudo.
— Não fez nada!? — Os olhos marrons da mamãe fisgaram os meus, mas logo se desviaram do meu rosto até o do papai. — Olha como ele é mentiroso. Eu ouvi a voz dele mandando eu fazer aquilo ou não diria onde a minha filha está. Era a voz dele! Por que ele mente???
— O que? — Quando dei por mim, havia questionado. Eu não entendia porque estava me acusando. — Não fiz isso, pai.
— Por que não admite!? Seu mentiroso. Mentiroso! — Com gritos secos, ela empurrou meu pai pelo peito para afastá-lo e, com uma ira que eu podia reconhecer só de olhar, deu passadas largas na minha direção.
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Jhony Trouble
RomanceFamiliarizado com a culpa, com o ódio dos pais e atormentado pelas últimas palavras da irmã desaparecida, Jhony só queria um recomeço para cuidar da pequena família que restou: a irmã caçula que foi abandonada sob seus cuidados ainda bebê. No enta...