Capítulo 44

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Jhony

A sombra de tons frios tornou-se um sol amarelado e acalentador roçando subitamente meus ombros quando saí daquela sala fúnebre sem calcular antecipadamente o meu destino. Dobrei as mangas da camisa nos cotovelos tão logo reparei que me enganei a respeito do tempo. Eu que contava com uma tarde chuvosa, me deparava agora com um céu azulado e quente.

Ou, quem sabe, não tenha sido um engano meu, de fato, e sim o clima que estava tão volátil quanto minhas emoções. Enquanto ele não se decidia entre sol e chuva, eu nutria um sentimento igualmente confuso a respeito das últimas horas.

Um incômodo que não conseguia digerir.

Meus pensamentos estavam uma bagunça e um vazio interminável me rodeava nesse momento. A imagem que vi naquele caixão, não queria me largar. Não importava o quanto eu me distanciasse pelo cemitério.

Eu esperava que os sentimentos ruins partiriam com a minha mãe, no entanto, o meu emocional estava muito longe de uma comemoração. Mesmo depois do que ela fez comigo, eu me sentia estranho por pensar que nunca mais a veria.

"A armadilha do ódio, é que ele nos prende muito intimamente ao adversário". Onde é que li isso?

Não podia deixar de me perguntar se era o que estava acontecendo comigo. Pois a maior causadora dos meus medos estava morta, e sua ausência, por alguma razão, me infligia o máximo de desconforto.

— Jhony? — Quando virei minha cabeça, dei de cara com Carlos segurando um lindo ramo de flores brancas. Eram as flores mais lindas que eu tinha visto. Ele se aproximou. — Olá, meu garoto.

— Oi, tio...

— Desculpe, chegamos tarde demais? Nós perdemos o velório? Tive que resolver um problema de última hora na academia e acabei nos atrasando. 

Meu rosto inteiro se contorceu enquanto eu olhava para o ramo em sua mão.

— Acho que você ainda consegue deixar as flores no caixão antes de levarem minha mãe para... cremar — minha voz falhou de leve.

— Ah, bem, isso é para você. — Não escondi a reação de surpresa. —  A Gabs insistiu em te trazer flores. Disse que sua mãe provavelmente ganharia muitas, mas ela quis trazer especialmente para você. Eu me senti sem jeito de vir de mãos vazias para a sua mãe, mas a menina fez a minha cabeça, você sabe como ela é. Pegue — estendeu o braço com as flores perfumadas e de pétalas pequenas. Lembravam uma margarida, mas o que eu entendia de flores para afirmar...

— Para mim? —  Um pequeno sorriso apareceu em meus lábios.

— Sim. Ela tem a teoria de que quem fica, deve ser tratado com o mesmo carinho de quem se foi. E pelo seu sorrisinho, ela estava certa.

Exigi que meus dedos agissem e peguei o ramo. Por que Gabrielle comprou flores para mim? Eu não merecia ser consolado. Achei que ela tivesse entendido quando ontem tentei me jogar da ponte de tanta culpa que carregava.

Olhei ao redor obsessivamente.

— Onde... Onde ela está?

— Bom, ela teve um mal-estar e assim que chegamos correu para o banheiro. Deve voltar logo.

— Um mal-estar?

Jhony Trouble Onde histórias criam vida. Descubra agora