07: Sendo paga.

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Esther

A principal diferença entre mim e a minha mãe é que ela é loira. E a principal diferença com o meu irmão gêmeo é que ele obedece o nosso pai cegamente. No fim, a única que realmente me entende é a banguela.

Faço faculdade de artes. Não que eu ache que artes vai me dar dinheiro, mas a mãe me fez fazer algo que eu realmente quisesse fazer. Depois é depois, eu poderia fazer um cursinho de economia.

Mas passo a maior parte do tempo na biblioteca estudando como conseguir dinheiro. Por isso deixo tantos livros acumularem.

Sento na última carteira. A professora de anatomia é uma verdadeira desgraçada maníaca que se diverte à custa do sofrimento alheio. A mulher divorciada aparenta estar sempre bem.

É como ver um esqueleto ambulante. E não, não estou exagerando:
— Silêncio!

Fico reta, arrumando a postura. Ninguém tinha feito barulho. Esse é o problema.

— Quero que prestem bastante atenção. — Ela pego o pincel e começo a desenhar na lousa. Eu poderia criticá-la por horas, mas não quando ela desenhava.

Os traços do rosto. Fez uma base com círculos e linhas para direcionar as sombras. Logo foi tomando forma. Uma cabeça de uma estátua grega. Demoro um pouco.

Se viro:
— Quero isso. Uma escultura, na minha mesa, na próxima semana, com um modelo vivo, qualquer parte do corpo, tragam uma foto também para mais comparações.

Ela adora criticar e jugar o trabalho dos outros. Mas se falar mal do dela, vai ter que fazer melhor. Explico melhor como queria e tiro algumas dúvidas.

[ … ]

Espero na calçada no horário marcado. A Paris parece estar atrasada. Confiro as horas no meu relógio de pulso, eu arrumei um bico de barman em uma festa de uma tal de Lola. A minha amiga disse que me daria carona para poder beber todas.

8:50.

Suspiro. O farol cegante da sua moto me faz tapar os olhos com as mãos. Pego o capacete e subo na garupa antes que ela fale alguma coisa sobre a minha roupa. Blusa rasgada, estilo zumbi e maquiagem escura. Short curto, dá até para ver a minha tatuagem na coxa esquerda: uma pistola atirando pétalas. Também tenho outra nas costas.

A primeira pessoa que me puxa quando adentro a mansão é dona da casa. Sou arrastada para trás de um balcão. Aceno para a garota que veio comigo me seguir.

— Só precisa servir as bebidas e sorrir! — A loira enfatiza a última palavra.

Paris gargalha. Franzi a testa.

— Vou ser paga por isso também?

— Com certeza.

Abri o maior sorriso que eu tinha, sustentando ele. Ela levanto os polegares para cima animada. Sai, se perdendo entre as pessoas na pista de dança.

Do outro lado do balcão tem bastante gente. Vou entregando bebida com garrafa e tudo. Alguns pedem apenas um copo da bebida. Minha amiga bebe sua cerveja, ela está em um banco rindo de mim.

Sorriu toda vez que alguém fala comigo. Aos poucos vai esvaziando. Mas as mesmas pessoas sempre voltam. Eu provavelmente não iria sorrir tanto se não tivesse uma câmera na parede apontada pra mim.

Me apoio com cotovelo na bancada, virando a atenção para o casal. Forço um sorriso:
— O que vão beber?

— Você está sendo paga? — A morena com quem já estou familiarizada fala. Ela sempre vai na biblioteca da faculdade.

— Me pagam até pra sorrir! — Faço pouco caso. — Não enrolem, digam logo.

— Água.

— Cerveja!

Concordo. Entrego suas bebidas. Seu namorado está em pé atrás dela, e ela sentada no banco.

— Ei, quero um coquetel. — Diz alguém do outro lado.

Forço outro sorriso:
— Pra já.

A única coisa que me consola é o dinheiro. Pensar no meu pagamento me faz trabalhar com mais ânimo. Estava tudo indo bem. Tudo normal. Ruan aparece assim que o casal sai, ele bate no mármore e tenho que sorrir. Tem um copo na sua mão.

— Você que fez isso? — Estende para mim.

Pego confusa. Cheiro, tem droga nisso. Eu conhecia muito bem, nunca usei, mas aprendi a diferenciar. Digamos que tem relação com o trabalho do meu pai.

— Não. Que porra é essa?

— Ok, docinho. É tudo que eu precisava saber. Me espere antes de sair. E não aceite bebidas de estranhos.

Sai sem olhar para trás. Umas garotas chamam minha atenção às três se empurram e tentam me chamar, mas nenhuma sabe meu nome. Me vejo rindo da cena, de verdade.

Poucas pessoas me conhecem realmente, para alguns sou uma bruxa, para outros uma louca. Mas sou completamente sã. Talvez um pouco má, já que toda garota inteligente tem que ser um pouquinho.

( … )

Paris está completamente bêbada. Até os cachos do seu cabelo estão embalados. Seguro seu antebraço em volta do meu pescoço, seus passos se arrastam. Eu também bebi um pouco, mas estou mais sóbria que ela.

Vou até o carro vermelho, é tão polido que posso ver o meu reflexo. Quando vejo a Aurora carregar o namorado de 2 metros com ajuda de outra pessoa, percebo que carregar uma amiga não deve ser tão ruim.

— Você quer ajuda? — Me susto com a voz ao meu lado. Viro. O loiro tem chaves na mão, ele aperta um botão é o carro ganha vida. — Sou o Vincenty.

— Ah, o Ruan te mando? — Ele olha para o nada. Parece um robô que desligo. — Você está ouvindo?

É como falar com uma porta. Abro a porta com dificuldade e ele vem ajudar. Ponhe a Paris no banco de trás. Pego as chaves do bolso dela. Estendo para o loiro.

— Quero ajuda. Pode levar a moto dela para minha casa? É só seguir o carro quando o seu amigo aparece.

Pega a chave sem responder.

Garotos cruéis! - Livro 02Onde histórias criam vida. Descubra agora