32: Tradição interrompida.

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Ruan

— Outra vez essa humilhação? — Vicenty está sempre bravo e com cara de paisagem.

O que não fazemos pelos amigos de verdade? ISSO deveria ser uma das principais coisas. O Enzo desistiu de tentar fugir e ligar para a namorada pedindo ajuda depois do Marcos fingir chorar, esse idiota, é tudo culpa dele. Ele se aproveita da nossa promessa.

— Eu odeio você!

— Ei, vocês tem que aceitar. Fazemos isso todos os anos. Ok, ano passado não rolou. Mas esse ano é para compensar o outro. — Mata-lo seria pouco. Você sempre fica em cima do muro quando o assunto é ele, ou você gosta dele ou odeia.

Ele faz a gente lavar carros vestidos de mulher, e essa nem é a pior parte: As vezes são fantasias. O dinheiro vai para uma instituição de caridade e o lugar sempre lota no fim do mês.

— Vocês ficam ridículos assim, é impagável. — Para e ri da nossa cara. — Junta pra fotinha! — Pega o celular no bolso já botando na câmera.

— Por que ainda somos amigos dele mesmo? — O Enzo aponta, olhando do loiro para mim.

Fico calado. Ele fez o que ninguém penso em fazer, ele salvo a gente. Suspiro negando, puxo os dois para a foto. O tema da vez foi bailarina, ele sorteia um antes de nos arrumarmos na minha casa. Tiramos a sua foto.

— Enzo, sua faixa tá torta! — Aviso antes de saímos. Tem uma flor no meio.

— Que droga. Vamos logo, se a Aurora me ver assim não sei o que vai ser do nosso relacionamento. — Resmunga.

— Se ela te ver assim, ela vai rir. E nunca mais vai conseguir desver. — O Marcos se diverte com essas brincadeiras.

Abro a porta, o silêncio toma o lugar. Encerrando a discussão. Esther parada na minha porta segurando a sua irmã me lembra que promete cuidar dela. A cuidadora está de folga e ela ia fazer uma consulta na ginecologista.

— Você é garoto de programa agora? A sua mãe te deserdou por acaso? — Ponhe uma mão na cintura, enquanto segura a Laurinha com a outra. — Ruan, se você me trair eu quebro as suas pernas!

Puxo a faixa da minha cabeça, passo a mão no tutu negando apressado.

— Não, não docinho, eu nunca trairia você, eu juro. É uma tradição. O Marcos que inventou.

— O maconheiro? Tinha que ser! — Nega.

— Ei, é senhor maconheiro pra você!

— Vai cuidar dela? — Muda de assunto. Deixando os ombros caírem, casada demais para se importar. Faço que sim apressado. — Aqui, toma. Te mandei uma mensagem explicando tudo direitinho.

Pego com cuidado, se cair, pronto. Me entrega uma bolsa também. Deixa um selinho na minha boca, um beijo na bochecha da irmã e vai embora. Fecho a porta depois de vê-la sumindo na calçada.

Me viro para eles:
— Alguém sabe cuidar de uma criança?

( … )

Deixo ela na cama. Trocamos de roupa revezando para ver quem olha ela e fingimos que nos importamos com a tradição tanto quanto o Marcos, fomos salvos. Já vestidos com nossas roupas, ficamos encarando a pequena na cama tentando engolir a própria mãozinha.

— O que a gente faz com isso? — O loiro se vira para mim e os outros dois fazem o mesmo.

— Cuida, sei lá. E não chama ela assim!

— Se ela chorar? — Marcos levanta uma sobrancelha.

— Você deixa ela puxa o seu cabelo, para se sentir melhor! — Pego o celular e vejo as orientações, leio em voz alta. — Ela está aprendendo a andar, tem uns dentes que faltam nascer ainda e se ela chorar pode ser dor. Tem tudo que precisa na bolsa. Deixa ela com o mordedor de borracha.

Pego a bolsa e procuro. Vejo uma estrela do mar rosa de borracha. Estendo para ela. Os três ficam só olhando. Laurinha pega e logo morde.

— Se precisarmos pegar ela no colo?

Nego, pegando o celular:
— Não. Se ela quebrar? Tem que ter muito cuidado. A Esther aviso aqui que ela gosta de se jogar pra frente.

— Tem razão.

— Verdade.

— Podemos só deixar ela aí. — Enzo sugere.

Largo o mordedor e começo a chorar. Simples assim, sem motivo nem um. Nos entreolhamos sem saber o que fazer. Eles podiam ter ido embora, mas ainda estavam aqui.

— Olha o resto da mensagem. — Marcos aponta, nervoso.

Ligo o aparelho de novo:
— É… ela não gosta de ficar muito tempo sentada. Tenta brincar um pouco com ela no tapete. De tarde ela dorme mais rápido.

— Pega ela então!

— Eu?

— Não combinamos que ela iria ficar aí? — Vincenty franzi a testa.

Sacudo os ombros. Ela está chorando, e lógico tentar fazer alguma coisa. Vamos fazer o que adultos fariam.

— Pedra, papel, tesoura. Melhor de três. — Marcos sugere.

Um tempo demais seu choro só aumenta. Vincenty perdeu, ele pega a bebê como se fosse uma boneca. O idiota ri levantando ela no alto.

— Ela não pesa nada!

— Você sabe fazer outra igual? — Pergunto nervoso.

— Espera, escuta… — Enzo aponta. — Ela paro de chorar.

Marcos estende os braços para o loiro:
— Deixa eu segurar também?

Seguro a vontade de bater na sua mão. A Esther vira o capeta se acontecer alguma coisa com a sua irmã. Esses idiotas estão pior que eu. Ela logo volta a chorar. O Vincenty para a bebê para o Marcos, e ele passa para o Enzo.

— Aqui, a cunhada é sua, você segura! — Seguro com os dois braços.

— Ela não chorava assim com a Esther! — Ando um pouco com ela pelo quarto. — Olhem o celular, se não tiver nem uma mensagem sobre isso. A gente liga.

( … )

Era fome. Deixamos a pobrezinha sem comer até descobrir. Tinha uma mamadeira pronta na bolsa menor térmica.

— Eu vou ser um pai horrível! — Enzo comenta.

Alimento ela. Estamos na sala, sentados no sofá. Descemos para procurar alguma coisa para ela comer, até achamos a mamadeira.

— Já eu, vou ser melhor! — Vincenty declara. Caímos na risada. Esse cara é tão engraçado. — É sério, seus cuzões!

— Sei, é capaz do Marcos ser melhor que você.

Marcos paro de rir:
— Isso aí não é elogio, não.

Concordo rindo. Meu celular toca do meu lado. O nome da minha irmã pisca na tela. Vincenty atende e deixa no viva voz.

“Alô?”

“Ruan, ele…”

Garotos cruéis! - Livro 02Onde histórias criam vida. Descubra agora