**BÔNUS**
Trícia
Então a ruina nos alcançou.
Minha mãe tentava arrancar os cabelos caindo em si enquanto meu pai se encolhia num canto da sala.
O contador tinha terminado de nos explicar que não tínhamos mais nada, absolutamente zero. Pior que isso: estávamos devendo muito dinheiro!
Para resumir, meu pai foi ingênuo ao cair na lábia de certo amigo e investiu um valor exorbitante num investimento muito duvidoso. Se Pietro Toledo tivesse consultado qualquer um dos seus três filhos, até mesmo Raissa, a caçula de dezoito anos, teria ouvido que era muita burrice acreditar que qualquer aplicação daria um retorno tão rápido e em tão pouco tempo.
Pietro, no entanto, ao invés de ganhar sabedoria conforme envelhecia, se tornara ganancioso e supersticioso e acreditou que a sorte o privilegiaria. O resultado era que teríamos que vender nossa Mansão, todos os veículos, joias e itens de valor que possuímos para saldar a dívida e começar uma nova vida.
Eu fiquei responsável por organizar uma grande festa para que a high socity conhecesse a Mansão Toledo e logo todos sabiam do infortúnio da nossa família. E foi assim que meu mundo rosa começou a desmoronar...
Até então eu achava que meus amigos eram verdadeiros, que todos nos tratavam bem aonde íamos porque éramos boas pessoas e que vivíamos bem porque merecíamos.
Quando perdemos o dinheiro, perdemos também a simpatia de todos. E o meu "baque" maior foi na faculdade:
Estava atrasando dois meses de mensalidade e sabia que seria difícil quitar as demais, porém estava no último ano de arquitetura e era importante finalizar meu curso para poder atuar na área e ter um emprego com um salário decente. Como meu pai já havia feito doações generosas para melhorias na faculdade, assim como apoio às campanhas de bolsistas, pensei em apelar para a boa vontade do reitor Torres, que sempre me tratou muito bem e era velho conhecido do meu pai.
- Então, pode me ajudar com a bolsa? - Perguntei, depois de explicar calmamente toda a situação. Apesar de estar desesperada por dentro, eu não queria deixar transparecer.
- Então Tricia, você é uma jovem muito bonita, sabe? É claro que sabe. - Riu de um jeito estranho. - Tem outras garotas bonitas aqui na faculdade que enfrentam problemas financeiros semelhantes e trabalham como acompanhantes.
- Oi? - Pela primeira vez eu perdi a pose e arregalei os olhos.
- Eu conheço alguém, que conhece alguém, que poderia encontrar um benfeitor que pagaria muito bem pela sua companhia, entendeu?
- Quer que eu me prostitua? - Me levantei da cadeira, indignada.
- Eu não disse isso. - O reitor falou, sem tirar os olhos da minha carta de pedido de bolsa. - Só quero dizer que para as pessoas que querem estudar de verdade, sempre existem opções, principalmente quando se é uma garota bonita. - E então completou. - Não posso te dar a bolsa, Tricia porque você tem condições de arranjar o dinheiro.
- O Senhor é um ingrato! - Eu disse, entredentes. Meus olhos fuzilaram o velho homem de rosto vermelho que apenas sorria de canto como se nada que eu tivesse dito fizesse qualquer sentido. - Meu pai sempre foi um apoiador dessa faculdade...
- Ajudou a faculdade, mas não a minha pessoa em especial. É como eu disse, se mudar de ideia eu até posso ajudar a conseguir trabalho...
Me senti enojada. Poderia sair dali e ir denunciá-lo para o conselho, mas a verdade é que minha situação estava tão ruim que eu seria desacreditada. Ele diria que me negou a bolsa e que por vingança o caluniei. Eu deveria ter gravado nossa conversa!
Teria que arranjar outro jeito de conseguir dinheiro para pagar a faculdade. Tinha que vender urgentemente a Mansão Toledo!
Nos dias que se seguiram organizamos o leilão dos nossos móveis, joias e veículos. Acompanhei meu piano querido ir embora junto com as joias que herdei da vovó quando ela faleceu.
Minha irmã saiu correndo quando viu suas coisas sendo levadas pelos leiloeiros e eu fui atrás dela no jardim.
- Calma Raissa! - A alcancei e tentei abraçá-la, mas a garota me afastou com agressividade.
- Não me peça calma! Agora que chegou minha vez de ir para a faculdade eu não poderei ir porque nosso pai é um burro que destruiu nossa família. E todos ficam com essa cara de paisagem. Ninguém está brigando com ele, por quê?
- São só coisas Raissa. - Eu disse, com calma. - O importante é que estamos bem. Se recomponha e volte para dentro. Pare de agir como se tivesse dez anos.
Eu sabia como ela se sentia. Tinha aquela fúria dentro de mim também, porém me rebelar não melhoria em nada nossa situação. O melhor era reagrupar a família para saber como reagir. Voltei para dentro de casa, abandonando-a.
Eu parecia fria e melancólica, mas a verdade é que eu era calma e esperançosa. Acreditava que as coisas iam entrar no eixo porque o mundo era assim: o rio sempre encontra seu fluxo mesmo que desviassem seu caminho. O que tinha que ser meu ia ser, de um jeito ou de outro, então por que ficar desesperada?
E eis que alguns dias depois Cristian Servantes me ligou para fechar a compra da Mansão Toledo. Fiquei a frente de toda a negociação e não apenas isso, acabei me tornando sua consultora. Não podia ser melhor. Cobrei um valor alto pelos meus serviços e Cristian pagou sem pestanejar.
Talvez se as coisas começassem a voltar aos eixos novamente meus pais parassem de falar tanto em divórcio...
Telma, uma das poucas amigas que ainda me restavam, me alcançou no corredor da faculdade. Eu sorri ao vê-la. Ela me entregou um livro que pedi emprestado e depois me convidou para tomar um suco na lanchonete.
- Você não viu mais o Egberto? - Ela perguntou.
- Não. E nem quero ver. Para alguém que dizia que era apaixonado por mim, ele sumiu rapidinho quando ficou sabendo que minha família faliu. - Eu disse, como se o assunto não fosse importante. - Ele está com a Cibila. - Olhei para Telma. - Acho que fiquei mais chateada por isso, a Cibila era minha amiga desde o colégio e trocou minha amizade por macho.
- Tricia, ela sempre foi a fim do Egberto. E você não perdeu nada. Ele era um almofadinha que só sabia contar vantagem e a Cibila também era uma tremenda falsa, sempre teve inveja de você. Pense que essa situação toda foi como passar um pente fino nas suas relações.
- O pente foi fino demais, Telma.
Cheguei tarde em casa.
Na minha nova vida, uma das coisas que mais me custou foi aprender a andar de ônibus. Era muito demorado e eu tinha que tomar dois, às vezes três conduções para chegar no meu destino. Minha mãe vivia em estado constante de depressão, sentada em frente à TV ou no celular e eu me achava ingênua demais por imaginar que ela teria feito janta para mim quando eu chegasse da faculdade. Raissa vivia dormindo na casa das amigas e meu irmão mais velho foi morar num apartamento da amante. Quanto ao meu pai, fazia três dias que ele não aparecia, desde que ele e mamãe brigaram de maneira tão intensa. Eu só queria que tivesse um jeito de fazer as coisas voltarem a ser como eram antes.
Às vezes eu me deitava na cama e acordava achando que ainda estava na Mansão Toledo. Nessas horas eu ainda me sentia muito feliz...
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INABALAVEL: Me Rendendo ao Ex-cunhado
Literatura FemininaQuando Betina descobre que engravidou de Cristian, o irmão caçula de seu ex-noivo, o mundo desmorona mais um pouco. Ainda abalada com o término desastroso de seu noivado e a vergonha pela gravidez indesejada, ela só vê uma solução: fugir... Betina a...