Brethen sentia cheiro de fumaça.
A chama, ela podia ver, vinha de dentro de um buraco raso escavado no chão do beco entre dois armazéns decrépitos. Os prédios, feitos de tijolo vermelho com janelas estreitas e altas, em diferentes estados de conservação, se enfileiravam às margens de um riacho malcheiroso, que fazia Brethen se sentir grata pelo cheiro de fumaça.
Do telhado de um dos armazéns ela observava o movimento com atenção. Homens e mulheres, a maioria vestidos de roupas simples e com cores escuras, entravam pela porta estreita ao lado da fogueira escavada no chão. Eles entravam sozinhos, às vezes em pares, sempre com uma boa distância entre um e outro, vindos de direções diferentes. Depois de algum tempo, um homem enfiou a cabeça para fora da porta, olhou para os dois lados e jogou água sobre as fagulhas restantes da pequena fogueira. Então fecho a porta novamente. Brethen ouviu o som do ferrolho metálico sendo trancado por dentro.
Os olhos de Brethen varreram os outros telhados ao redor, identificando vultos e silhuetas empoleirados nos prédios. Um deles era Capitã Alma, chefe da guarda do palácio, outro era Capitão Jordan, chefe da guarda da Capital, o restante eram homens e mulheres que serviam sob o comando de um dos dois capitães.
Brethen levantou um braço, com um pequeno espelho aninhado na palma da mão, e girou o punho três vezes para refletir a luz da lua. Era o sinal. Imediatamente os outros vultos começaram a se mover, descendo dos telhados cuidadosamente. Brethen, por sua vez, continuou lá no alto, e saltou de um telhado para o outro até estar sobre o armazém onde acontecia a reunião da Maré Sombria.
Partes do telhado tinham colapsado em algum momento e os buracos foram cobertos por tábuas de madeira. Brethen se esgueirou até encontrar uma brecha em um dos buracos, por onde conseguia ver a reunião lá embaixo.
Deviam haver mais de cem pessoas ali dentro, amontoadas entre caixotes e sacos de estopa. Algumas poucas tochas e lamparinas espalhadas pelo local iluminavam o espaço com uma luz fraca e alaranjada. Todos olhavam para o mesmo lugar: um conjunto de caixas empilhadas no centro do salão, sob as quais estava um homem.
– Tudo está prestes a mudar! – ele bradou de braços abertos. – Em breve, faremos nosso próximo movimento no tabuleiro e tomaremos posse daquilo que é nosso por direito.
A multidão gritou em apoio enquanto o homem girava sobre as caixas para encarar as pessoas ao redor. Brethen só podia ver o topo da cabeça do homem, um emaranhado de cabelos loiros. Ela se perguntou se encontraria uma cicatriz naquele rosto, se conseguisse olhá-lo de frente.
– Cada um de vocês será primordial nesta próxima etapa. – o homem continuou. – O tempo de nos esconder em cavernas e armazéns escuros está chegando ao fim. Amanhã, o novo rei será coroado, mas não será aquele que todos esperam. O homem que hoje usa a coroa e carrega o título de rei não merece o trono que ocupa, assim como o antigo não merecia.
A respiração de Brethen ficou presa na garganta, mas ela não se moveu.
– Nós lutaremos para merecer o poder, e o sangue em nossas mãos será usado para escrever nossos nomes na história. – o homem girou outra vez, apontando para as pessoas que o assistiam em meio a exclamações de apoio. – Pratória finalmente viverá sua verdadeira glória e vocês, todos vocês, finalmente terão a recompensa que merecem.
Mais uma onda de gritos e aplausos sacudiu o armazém, e a mão de Brethen se moveu lentamente para a parte de trás do cinto.
– Vocês serão os novos Lordes e Ladies desta terra, e subjulgarão aqueles que ousarem se opor a nós. – ele seguiu, ainda entre os gritos de apoio. – E nosso novo rei, que os deuses o protejam, nos guiará através da escuridão. Viva o Rei Sombrio!
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A Maré Sombria
FantasyBrethen não tem medo de nada. Ou, ao menos, de muito pouco. Treinada desde a adolescência em uma academia de guerreiros e assassinos, ela foi selecionada a dedo pelo príncipe Arian para ser sua Campeã. A partir daquele dia, Brethen se tornou a somb...