Amina não tinha se casado por amor, Brethen sabia disso. Essa era a realidade da maioria dos nobres em Pratória.
– Quando se tem dinheiro e status, casamentos são negócios – Arian havia dito uma vez, o que levou Brethen a se questionar por que, então, com treze anos de idade, ela precisou escolher entre se juntar a uma academia de assassinos ou ter que se casar em breve com um possível desconhecido, sendo que ela não tinha dinheiro nem status.
Ao menos Brasken tinha se casado por amor, duas vezes. E os pais de Brethen também, apesar de falarem pouco sobre isso com os filhos. Ela conhecia outras histórias de amor – de vizinhos, amigos, conhecidos – mas eram mais raras do que ela gostaria. Era até difícil acreditar nos romances dos livros que ela lia.
Brethen, então, chegou à conclusão de que o casamento era usado como moeda de troca por quem tinha dinheiro e por quem precisava de dinheiro. As pessoas no meio do caminho, pessoas de classe média, com vidas confortáveis, mas sem muito luxo, eram as que mais se casavam por amor. Casamento não era uma necessidade nem uma conveniência, muito menos um negócio. Era apenas algo que acontecia na vida dessas pessoas quando elas conheciam a pessoa certa.
Amina, porém, apesar de ter sido pedida em casamento depois de ter se encontrado com Silas apenas cinco vezes, e não ter qualquer sentimento de paixão por ele na época, nutria um forte carinho por ele. Carinho que, segundo ela, se tornou amor com o tempo. Não o tipo de amor arrebatador de uma paixão intensa, mas amor ainda assim.
Naquela dia, tão cinza quanto o anterior, Amina vivia o luto duplamente. Primeiro pelo marido que partiu, e também pela criança que ela carregava no ventre sem saber.
– Acho melhor que tenha sido assim – Amina sussurrou de mãos dadas com Brethen naquele sofá ainda manchado de vinho de algumas noites antes. – Não sei se eu conseguiria fazer isso sem Silas.
Brethen pensou em contar para Amina sobre ela e Arian. Ela queria contar, mas, pensando bem, aquele não era o melhor momento. Quem sabe em alguns dias, quando a vida de Amina começasse a voltar para os trilhos. Por enquanto, Brethen estaria ali para ajudá-la naquele processo.
Naquele começo de tarde, isso significava fazer companhia à amiga para almoço, que ela costumava comer com Silas todos os dias, e acompanhá-la em uma caminhada pelos jardins, mas a chuva frustrou a segunda parte dos planos.
Pelas cortinas abertas da sala de estar de Amina, as duas assistiram ao pouco movimento no pátio molhado lá fora, com uma xícara de chá entre os dedos e um prato de torta de morango sobre os joelhos.
– Eu decidi que amanhã vou voltar a pintar – Amina continuou. – Me dei o dia de hoje para me encolher e chorar o quanto precisar, e amanhã vou transformar tudo isso em arte.
– Você pode tirar quantos dias você precisar para se encolher e chorar, Amina – Brethen disse.
– Eu sei – Amina deu um sorriso triste – Mas os últimos dias já foram cinzas o bastante.
A campainha tocou e Brethen notou que Amina hesitou alguns instantes, como se esperasse que Silas fosse sair de seu pequeno escritório no final do corredor para abrir a porta, como ele costumava fazer quando ela tinha visitas.
– Deixa que eu abro – Brethen se ofereceu, ao ver o olhar de tristesa da amiga ao se dar conta do ato falho.
Do lado de fora estava Arture, de volta em seu uniforme da Guarda. Ele ainda não tinha retornado às atividades habituais, mas fez questão de participar dos preparativos da coroação de Arian.
– Que bom que você chegou – Brethen sussurrou antes de fechar a porta – Preciso ir, mas não quero deixar ela sozinha.
– Como ela está? – Arture sussurrou, removendo o paletó do uniforme. Brethen notou que os movimentos dele eram rígidos, ainda afetados pelo ferimento do ataque. Ele tinha emagrecido ao longo das últimas semana e perdido um pouco dos músculos que preenchiam o uniforme, mas tinha voltado a fazer a barba como de costume e prendido os cabelos longos em um rabo baixo e, para qualquer olhar menos atento, parecia exatamente o mesmo Arture de sempre.
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A Maré Sombria
FantasíaBrethen não tem medo de nada. Ou, ao menos, de muito pouco. Treinada desde a adolescência em uma academia de guerreiros e assassinos, ela foi selecionada a dedo pelo príncipe Arian para ser sua Campeã. A partir daquele dia, Brethen se tornou a somb...