CAPÍTULO 3 - Sussurros

17 5 1
                                    

O cômodo do palácio conhecido como "sala secreta" ficava no topo de uma das torres. Como o próprio nome dizia, era um local desconhecido pela maioria dos moradores e funcionários do palácio, com exceção de Brethen, do rei e da rainha, da princesa e de Fausto. E de Arian, claro. Afinal, aquela sala era o local onde o príncipe escondia seus maiores segredos.

Praticantes de Magia Negra não eram bem vistos em Pratória, mesmo que um desses praticantes seja o futuro rei. Havia uma longa história de conflito entre magos – praticantes de Magia Negra – e os monges – figuras religiosas e praticantes de Magia Branca – que, deixou uma mancha na reputação dos praticantes das artes ocultas, mesmo depois do fim de tais conflitos.

Arian aprendeu a apreciar a Magia Negra com a avó, mãe da rainha, uma senhora que Brethen conheceu brevemente quando chegou ao palácio. A mulher já estava velha e muito doente, e faleceu poucos meses depois, mas deixou um legado forte em seu neto. Arian praticava Magia desde os quatorze anos, como aprendiz da avó. Brethen acreditava que, se alguém ousasse tirar a Magia do príncipe, ele desmoronaria.

A sala secreta era um espaço amplo, de teto alto, com paredes de pedra crua e janelas estreitas. O centro do espaço era tomado por uma longa bancada coberta de tubos, potes, livros e papéis. Nos cantos, estantes abarrotadas de livros iam do chão ao teto, além de armários cheios de frascos de vidro com os mais variados conteúdos.

Sob uma das janelas ficava uma escrivaninha, e foi ali que Brethen encontrou Arian.

Desde que os dois se conheceram pela primeira vez, Arian não havia mudado muito. Ele perdera um pouco dos traços infantis, os ombros estavam um pouco mais largos e o cabelo mais longo, o suficiente para conseguir prender quando necessário. Fora isso, era o mesmo príncipe de sempre.

Arian estava debruçado sobre um livro e cercado por dezenas de outros. Seu paletó estava pendurado no encosto da cadeira, o colete aberto e as mangas da camisa dobradas até os cotovelos. Alguns fios escapavam da fita que ele usava para prender os cabelos, e os óculos de leitura redondos escorregavam pelo nariz reto do príncipe.

– Acabei de fazer a ronda com Fausto. – Brethen disse ao fechar a porta – Não encontramos nada fora do normal.

Arian ergueu os olhos do livro e se virou para encarar Brethen.

– Ainda não sabem por onde ele entrou?

– Temos algumas suspeitas. – Brethen se aproximou dele. – Mas seria preciso um planejamento muito cuidadoso para conseguir evitar todos os guardas, além de conhecer muito bem o mapa do palácio.

– Acham que ele teve ajuda de alguém de dentro?

– É bem possível.

Brethen parou atrás de Arian e se apoiou no encosto da cadeira para ver o livro sobre a mesa. Imediatamente identificou o síbolo da Maré Sombria em um dos cantos da página.

– Achei que seu pai tinha dito para você não se meter nessa história. – ela disse.

– Claro – ele deu uma piscadela. –, mas eu nunca disse que iria obedecer.

Brethen sabia muito bem disso. Teria ficado surpresa se não encontrasse o príncipe completamente mergulhado naquilo que alguém pediu para ele não tocar.

– Descobriu algo interessante? – Brethen se debruçou sobre o ombro de Arian.

– Nada que explique a invasão de ontem, mas a sua teoria sobre os saqueadores faz sentido. – Arian virou algumas páginas e puxou o livro para Brethen ver mais de perto. – A Maré Sombria era formada por vários braços, por assim dizer, espalhados por todo o reino. Cada braço tinha certa independência e precisava encontrar seus próprios meios de se financiar. Alguns desses braços contavam com membros da nobreza ou comerciantes ricos, que arcaram com os custos da organização, mas outros braços não tinham a mesma sorte, e tinham o hábito de cometer saques, como o que aconteceu na sua vila.

A Maré SombriaOnde histórias criam vida. Descubra agora