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Hesitei em pôr a chave na tranca da maçaneta. Não sei exatamente o que houve com o meu corpo, meu braço simplesmente ignorou todos os comandos do meu cérebro.

Fiquei imovel por cerca de trinta segundos na frente da porta de entrada de nossa casa, a chave pendendo no ar, pendurada por um cordão amarelo, a poucos centímetros da maçaneta.

- Está tudo bem, querida? - Perguntou Nicole em minhas costas - Quer ajuda para isso?

Eu balancei a cabeça, tentando expulsar aquele sentimento de pânico que se instaurou em meu peito. Suspirei e introduzi a chave no trinco. A porta se abriu com suavidade e, ao olhar para o interior, pude finalmente sentir-me aliviada.

Agora que o pânico passou e eu estava em casa, tive uma ideia do que poderia ter acontecido com o meu corpo: Eu estava com medo.

Medo do que encontraria ao entrar naquela casa; por um breve momento pensei que Hugo estaria me esperando em pé nos pés da escada, com um sorriso vitorioso em seu rosto e os braços abertos para me dar um abraço.

Ele provavelmente diria que eu demorei a voltar, mas que sabia que uma hora eu iria retornar. E então, eu cairia novamente naquela teia de medo e abusos constantes, sendo estrangulada pelo que Hugo chamava de amor verdadeiro.

Era o primeiro sábado do ano, o que significava que eu não voltava aquela casa havia duas semanas inteiras, desde o natal, para ser mais específica; mesmo assim, ao entrar, não senti o pingo de vontade de voltar. Ainda havia muitas lembranças. Eu ainda sentia muito medo.

A verdade é que nunca gostei realmente daquela casa, era enorme e fria demais para duas pessoas conviverem ali. Mesmo depois da decoração e dos móveis estarem em locais estrategicamente pensados para diminuir a sensação de solidão, as palavras ainda ecoavam pelas paredes brancas e frias quando falava. Era horrível.

Encontrei o interior exatamente como havia deixado na noite de natal. Subi as escadas e fui em direção ao nosso quarto; Nicole estava me acompanhando de perto, sem dizer muita coisa.

Se eu pudesse nunca mais retornaria, mas era preciso. Depois de duas longas semanas fora, a minha empresa necessitava de mim, a marca Fatal! estava começando a esfriar. Eu era o rosto desta campanha, além do mais, os patrocinadores começaram a fazer perguntas.

Em meio a confusão do natal, enquanto Hugo debulhava-se em lágrimas na porta e eu organizava a mala para ir embora, não pensei no meu trabalho; deixei tudo para trás, meu notebook, a highlight, minhas maquiagens e meu celular do trabalho. Tudo. Agora que estava pronta para voltar, necessitava deles e, para isso, tinha que retornar a casa.

Aproveitei e peguei mais algumas roupas, tinha levado apenas o que coube em minhas malas para a casa de Nicole.

Entramos na suite principal em completo silêncio, era a primeira vez que Nicole visitava essa parte da casa, ela deu um suspiro impressionante e caminhou lentamente até o banheiro. Podia ser minha amiga mas o espírito de fofoqueira dominava mais do que o respeito. Eu não liguei, até sorri.

- Está exatamente como deixei - eu disse, encarando a cama meio arrumada e uma das malas aberta sobre ela - O que significa que Hugo não dorme aqui desde o natal.

Nicole voltou do banheiro, encostou o ombro na quina da porta e cruzou os braços.

- Acha que ele vai querer voltar?

- Sem mim? Não.

Não houve um dia, desde a nossa briga, que Hugo não tentou falar comigo. Ligava toda hora. Eu deveria tê-lo bloqueado a tempos, pouparia a montanha-russa de sentimentos que me atingia toda vez que eu lia o seu nome na tela.

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