Capítulo 22 - Cosmic Love

574 100 101
                                    

Um campo de pedra vulcânica, regido por um nevoeiro num silêncio perturbador. Juliette não via seu fim. Caminhava na friagem sem raciocinar claramente sobre onde estava ou aonde iria. O odor do enxofre a enjoava e um torpor desagradável apoderava-se de seu corpo. Sentia-se exausta, pesada. Massageava as têmporas, exigindo-se ordem mental.

Era como se estivesse num mundo plano que virava-se para a outra face reta cada vez que ela sentia-se aproximar do fim. Uma espécie de labirinto sem fim que se repetia, se repetia, atormentador. Mas sua sensitividade estava atiçada, algo estava acontecendo ou iria acontecer ali a qualquer momento. A sensação mais incômoda era a falta de noção temporal, já que a falta de noção espacial era tenebrosa demais para formular qualquer pensamento coerente sobre ela.

- Socorro! - Um grito soou. A voz de alguém muito assustado, mas uma voz tão suave quanto uma brisa de outono. E Juliette conhecia perfeitamente seu dono.

- Por favor, me ajudem! - Não. Era impossível. A noção temporal estava finalmente atingindo-a. Ele estava morto. Não poderia ser Kaique.

- Juliette! Minha Rainha! - Sim! Era Kaique! Seus olhos marejaram imediatamente. Virou-se esbaforida, procurando por ele. Estirado há metros de distância, seu rei agonizava em espasmos violentos.

Juliette correu em sua direção. Não importa se ele deveria estar morto, nada mais importava. Ele estava ali. Ela iria salvá-lo a qualquer custo. Correu cegamente, desesperadamente! Seus saltos entortaram, arrancou as botas e avançou descalça pela aspereza nociva da pedra. E quanto mais corria, mais distante aparentava. Mais desespero. Quantos desesperos mais Juliette ainda conseguiria suportar?

Finalmente, como se uma parede invisível espatifasse diante dos seus olhos, estava conseguindo se aproximar. Notou que uma luz frágil pairava sobre ele, enquanto o mesmo ainda gemia de dor no chão frio. Ela o estava alcançando. Ela iria salvá-lo. Tinha que salvá-lo!

- Dama Escarlate! - A voz de uma menina misturou-se à voz de Kaique e ecoou em seus ouvidos com tanta angústia incrustada, que Juliette deteve sua corrida. Apertou os olhos com força, seus pés latejavam. Andou apressada, mas não conseguia mais correr. A voz persistia.

- Dama Escarlate! - Tontura. Juliette sentiu que poderia desabar a qualquer momento. O grito sôfrego de Kaique sumira, agora só havia a voz de Sarah Andrade. Uma voz que a estava ferindo. Porém, Sarah não estava ali, enquanto Kaique continuava a debater-se em agonia. Ignorou todas as dores e a voz da princesa, avançou, avançou. A luz sobre Kaique piscava enlouquecida, a névoa a sua volta estava cada vez mais densa e obscura.

- Dama Escarlate... Juliette... Não... - A voz de Sarah veio num fio.

Juliette estava perto o suficiente e a visão seguinte a destruiu.

O rosto e o corpo de Kaique estava se transformando no dela. Os cabelos escuros começavam a substituir o curto cabelo loiro, os olhos azuis esverdearam lentamente. Notou que as mãos de Sarah eram tão compridas quanto as de seu rei, logo, tornaram-se apenas mais delicadas e finas. Seu corpo esguio transparecia na roupa masculina, a única coisa que manteve-se intacta fora o vestuário. Lágrimas lentas desciam pelo rosto, encontrando os lábios trêmulos. Choque. Agora a rainha estava de pé diante dela, sem ação, completamente estática. E os olhos...

Ah, os olhos...

As esmeraldas encontraram as avelãs antes de esbugalharem e o grito morrer na garganta da princesa, até as pálpebras fecharem-se subitamente e sua cabeça tombar no chão, num único baque. Seu corpo inérte. Sua palidez.

Dive (Sariette)Onde histórias criam vida. Descubra agora