Voltando ao trabalho, os bolos eram vendidos sem demora. Recebi muitos elogios, e alguns conhecidos vieram me cumprimentar.
Os bolos acabaram em apenas duas horas de festa. Após organizar a barraquinha, guardei todo dinheiro arrecadado e entreguei para minha tia.
A quadrilha dos jovens fora anunciada e, com tamanha afobação de meus amigos, já estávamos posicionados antes mesmo de tia Dulce trazer o resto do pessoal. Por entrar na frente, o nervosismo tomava conta, assim como a animação.
Sem permissão, certas memórias inquietas voltaram de forma sorrateira. Apertei os olhos com força tentando expulsá-las, contudo, o choro da pequena Aurora fora mais alto.
Havia uma enorme fila de meninas para falar com a organizadora da festa junina. Em alguns anos eu tinha a sorte de tia Dulce a responsável, só que, daquela vez, fora uma das professoras da escola municipal da vila.
Em 1987, com meus cinco anos de idade, sempre quis ser a noivinha da quadrilha. Junho era um dos meus meses favoritos, e logo que começavam a mencionar a festa junina, eu criava coragem para pedir para puxar a quadrilha.
Quando juntei toda a coragem que eu tinha, decidi enfrentar a fila das meninas para falar com a organizadora. A maioria estava ali para pedir o mesmo que eu.
—Vai tentar pedir de novo para puxar a quadrilha? Cê nem vai conseguir mesmo — dizia Luiza rindo.
—Cê também nunca foi — respondi cruzando os braços.
—Por que iriam escolher uma menina feia e burra? Não acha que a noivinha tem que ser bonita e inteligente?
—O que você está fazendo, Luiza? — perguntou Isabela encontrando a irmã.
—A Aurora quer pedir para ser noivinha de novo — respondeu rindo.
Em um súbito movimento impensado, chutei sua canela fazendo-a chorar. A professora que estava tomando conta, levantou-se de sua mesa furiosa, perguntando o que estava acontecendo aos berros.
—A Aurora chutou minha irmã, professora. Só porque ela também queria ser noivinha este ano — respondeu Isabela sem deixar que eu me defendesse.
Meus olhos encheram de lágrimas, e antes mesmo que eu pudesse dizer o que aconteceu, a professora começou a gritar comigo.
—É deste jeito que quer ser noivinha? Chutando sua amiga?
Eu voltei correndo para casa e chorei sozinha em meu quarto sem coragem de contar para minha mãe.
Bento acabou descobrindo enquanto caminhava e escutou o ocorrido assim que passou pelo campinho.
—Pinguinho, cê está escondida? — disse entrando no meu quarto.
—Não quero conversar.
—As meninas me chamaram para ser o noivinho da quadrilha das crianças.
—Cê vai?
—Claro que não pinguinho. Alguma vez já dancei sem você?
Sem responder, abracei Bento que sorriu.
No ano seguinte, tentei novamente e os mesmos comentários me atormentaram, mas não desisti, já que tia Dulce era a organizadora.
As meninas diziam que minha mãe não iria ter dinheiro para o vestido, diziam que eu não sabia dançar, e diziam que eu as faria passar vergonha. Todas as palavras foram suficientes para que eu desistisse e novamente voltasse aos prantos para casa.
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Desenhos de uma Sina
RomanceAurora é uma jovem que cresceu sem saber a verdade sobre seu passado. Encontrada entre as folhas, diante do amanhecer. Bento fora seu melhor amigo, seu confidente, e muitas vezes seu herói. Viver todos os dias entre o conflito do medo e da coragem...