Capítulo 26

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Depois de chegar na casa de Rute, tomar um banho quente e vestir uma roupa confortável, fizemos bolo de limão com cobertura. Sr. Manuel veio até nós com sua cadeira de rodas, depois todos juntos comemos bolo acompanhado de um café de coador de pano.

Chovia forte naquela tarde, ocasionando algumas quedas de luz. Ajudei Rute a acender algumas velas pela casa. Sem muito o que fazer, jogamos cartas e dominó até minha tia me buscar. 

Ela continuava estranha, sem falar muito, parecia aérea. No carro, quase ultrapassou alguns semáforos, esquecia constantemente da seta, e não freava nas lombadas.

Antes mesmo de entrarmos em casa, o telefone estava tocando. Minha tia pediu para que eu atendesse, dirigindo-se ao seu quarto.

—Alô?

—Filha? — era a voz da minha mão chorando.

—O que aconteceu?

—A nossa casa... essa chuva. Caiu uma árvore — ela não conseguia concluir a frase, porém compreendi o que acontecera.

—Estamos indo aí.

De maneira automática, sem pensar muito, joguei várias roupas dentro de uma mala. Nada estava organizado, apenas correndo de um lado para o outro

Entrei no carro junto com minha tia. Por poucos segundos, trocamos um olhar significativo, sem dizer nem uma palavra, deixando que o silêncio nos confortasse.

A chuva caía forte na estrada, e escutando as notícias do rádio, haveria probabilidade de granizo.

O caminho parecia mais longo e os minutos corriam com pressa. Minhas mãos suavam e minha respiração ofegava. Não via a hora de estar junta de minha família.

Pensava em tudo o que vivi na minha casinha de madeira, no quanto minha mãe estava feliz com a reforma, e tudo fora destruído. Por pouco tempo, olhei para o céu, questionando novamente se Deus existia e o motivo de deixar aquilo acontecer.

Por volta da uma da manhã chegamos em casa. Vovô estava com meu pai cobrindo algumas coisas com lona. Alguns vizinhos estavam junto carregando pedras. Pude ver de longe minha mãe sendo consolada pela tia Dulce.

Meu coração estava apertado de vê-la chorando tanto.

No meio de tantas pessoas que um dia conheci, e tornaram-se estranhos, me sentia perdida. Continuei encostada no carro, disfarçando o olhar para o chão.

Estava completamente molhada pela chuva. Meu corpo tremia com o vento gelado batendo em minha pele. As lágrimas que começaram a cair disfarçavam-se com as gotas que vinham do céu.

Com um forte suspiro, encorajada pela profusão de sentimentos que surgiram de maneira súbita, corri até o abraço de minha mãe. Os fortes passos batiam contra a lama, que espirrava por todos os lados, enquanto o ar frio quebrava contra meu corpo, contudo, dissipava-se através do calor de emoções que há tempos foram desconhecidas.

Todos os anos tentando calar e encobrir o que eu sentia. O medo, a saudade, a angústia, a solidão, a tristeza, e buscando insaciavelmente cobrir o vazio de maneira errada. Maquiando quem eu realmente era, fingindo que o passado era inexistente apesar das feridas que ainda ardiam. Assim como minha verdadeira casa, tudo em mim desmoronou.

Dentro dos braços de minha mãe, pude escutá-la dizendo que ficaria tudo bem, todavia, ela ainda chorava tentando acreditar nas próprias palavras. Ao lado dela, tia Dulce passava a mãos em meus cabelos, igualmente fazia há anos todas as vezes que me encontrava triste pela escola.

—Eu preciso ver a Bolinho e a Lili — disse entre soluços.

Caminhei até o curral, e soltei o ar aliviada ao encontrá-lo inteiro. Abri a porteira e as abracei como nunca havia abraçado antes. Bolinho já estava em uma idade avançada, cada memória com ela eu guardava eternamente.

Desenhos de uma SinaOnde histórias criam vida. Descubra agora