Fins, Justificativas e Meios

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UM MÊS DEPOIS

O aeroporto não é muito grande. Não existe nem sala VIP. O jeito é esperar pelo meu voo sentado aqui no saguão comum mesmo, dividindo espaço com muita gente e várias bagagens. Totalmente sem conforto.

Faltam apenas alguns minutos para iniciar o embarque.  Quero me ver longe daqui o mais depressa possível. Mas o que são alguns minutos para quem já esperou um mês? O anúncio de embarque da fila prioritária dá o comando para que alguns poucos idosos e casais com crianças de colo comecem a se movimentar para entrar no avião.  Logo em seguida o aviso para os demais clientes formarem fila e seguir o mesmo exemplo. Sempre odiei isso antes de embarcar.

Ah, como eu amo esperar em filas intermináveis e lidar com a burocracia irritante das companhias aéreas. Enquanto espero na fila olho para as demais pessoas e tento imaginar qual a motivação por trás de cada escolha que as levou a estarem ali hoje pegando aquele voo. Indo passar férias? Será uma viagem a negócios? Estão fugindo de algo? Começando uma nova vida?

- Sua identidade e bilhete por favor - a funcionária da companhia aérea solicitou logo assim que chegou a minha vez.

- Aqui está - eu disse entregando pra ela a minha identidade e o bilhete.

- Bom voo, Rafael.

Caminho pelo corredor do avião, apertado entre as poltronas, procurando meu assento. Assento 5A, janela. Uma vez li que as chances de se sobreviver a uma queda de avião são poucas, mas se você estiver sentado nas poltronas atrás,  na aeronave,  suas chances aumentam. Desde então eu sempre escolho as poltronas a frente, pois, se for pra morrer, que seja rápido. E é claro, na janela. Quero ter o controle da situação, se vai entrar a luz do sol ou não, se eu admiro as nuvens ou não.

Venho aprendendo na marra a ter controle da minha vida novamente. O tempo parece passar em câmera lenta enquanto esperamos pela autorização para partir. As comissárias de bordo circulam pelo corredor, sorrindo falsamente e oferecendo bebidas que ninguém quer. Enquanto isso, lá fora, o sol começa a surgir no horizonte. Isso foi um aviso de que já era dia e eu ainda não havia dormido.

A voz robótica do sistema de som da aeronave começou anunciar os procedimentos de decolagem, como se alguém realmente prestasse atenção. Alguém presta?

Finalmente, o capitão fez seu anúncio, informando que estamos prontos para decolar. As turbinas rugem, o avião começa a se mover lentamente pela pista, ganhando velocidade a cada segundo. E então, num instante, estamos no ar, voando para longe daquele lugar. O sono parece começar a vencer e a lembrar meu corpo que eu preciso de um descanso. Recosto minha cabeça da forma mais confortável que a poltrona permite e fecho os olhos.

Felicidade do dia: Em algumas horas poderei começar uma nova vida. Medo: em algumas horas eu vou iniciar um nova vida.

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30 DIAS ANTES DA VIAGEM

POV Thiago

Estou aqui, sentado no meu quarto escuro, olhando para o teto enquanto os pensamentos giram sem parar na minha cabeça. As caixas empilhadas e ocupando o espaço do que um dia foi o meu quarto só me lembram cada vez mais a merda que a minha vida tá virando.  Por que parece que tudo está contra mim?

O futuro parece cada vez mais incerto e isso é uma merda! Eu tinha apenas um único objetivo com o início do terceiro ano: entrar na faculdade de Direito, fazer direito empresarial e assumir os negócios da família.

Mas isso não rolou.

Não é justo. Mais uma vez eu estou sofrendo as consequências das estupidez de terceiros. Além da pressão de ter que trabalhar, fazer cursinho para passar no vestibular, ainda tenho que lidar com a notícia de que nossa família está falindo.

O Diário de um Podólatra 2 - O PrimoOnde histórias criam vida. Descubra agora