Mr. Beauchamp

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Encarava o juíz, um homem de meia idade, com cara de cansado e infeliz no casamento, provavelmente um alcoólatra nas horas vagas e um pai ausente que comprava os filhos. O julgamento se estendia para as três horas, do lado de fora o alvoroço de repórteres e imprensa ainda faziam barulho. Nova York tinha parado no dia de hoje para acompanhar o julgamento de Josh Beauchamp, no caso, meu julgamento.

Tráfico de drogas, fraude de documentos, roubo de armas, lavagem de dinheiro, contrabando, organização de facção criminosa, eram os crimes que eu estava sendo acusado.

— Depois do assassinato da família, o senhor Beauchamp desapareceu do mapa, não há registros na empresa e há apenas um documento, onde supostamente ele teria passado o cargo para Jacob Kyle, que não passa de outra identidade falsa de Joshua Kyle Beauchamp. - a voz do advogado me acusa- Por que ele inventaria uma identidade falsa logo depois do assassinato da família? Por que se mudou para Nova York e então assumiu o papel de Thomas Shelby, que por sinal, é outra identidade falsa! -ele ri astuto- Josh Beauchamp está cheio de mentiras, segue fugindo e se esgueirando pelos cantos, fazendo seja lá qual sujeira ele faz!

— Protesto! -Noah diz alto se levantando e o juíz concede- Quem aqui neste tribunal, se sentiria seguro quando toda sua família foi brutalmente assassinada, na sua frente?! Onde está sua humanidade?! Meu cliente, sofreu um trauma que muitos de nós jamais saberemos a dor, e depois disso, foi forçado a se esconder pelo risco que sua vida sofria.

— Protesto!

— Protesto negado, prossiga Urrea.

— Josh Beauchamp é acusado de muitas coisas, mas nenhuma delas são esses crimes. -ele mantém sua postura- Além de cliente, ele é amigo próximo, e afirmo a cada um de vocês que não há dor e frustração maior, do que ver alguém que você ama, sofrer por tudo que ele sofreu... na noite de domingo, 28 de maio do ano passado, Josh foi brutalmente atacado ao sul da Escócia, enquanto tentava aproveitar viagem em família e com a até então parceira, causando sérios danos a ele... nem em outro continente ele estava a salvo, sua família sofreu várias ameaças diárias após o drástico acontecimento na família e ele fez oque qualquer um aqui faria, ele protegeu aqueles que amava.

Todos prestavam atenção nele, Noah tinha aquele dom de saber jogar com as palavras, fazer pessoas se emocionarem, repensarem, ele era o melhor naquilo que colocava para fazer. Eu confiava minha vida de olhos fechados a ele.

— Então sim, Josh Beauchamp é acusado de assumir nova identidade para sua própria salvação.

Depois de mais uma hora, tivemos um intervalo, fui encaminhado para uma sala sozinho, precisava digerir tudo que estava acontecendo na minha vida, tentar descobrir onde é que deu errado, porque eu nunca imaginaria que eu, o alfa, um dos homens mais poderosos e temidos do mundo, chegaria ao fundo do poço por causa de amor. Se eu afundasse, todos afundariam e existiam mais preocupações além de uma traição para eles, por traz de cada homem naquela máfia existia uma família que dependia de nós, por traz de cada um existia uma vida que sempre sonharam, a vontade de apagar um passado sombrio. Talvez não fosse certo oque fazíamos, mas os The Wolfs salvaram muitas vidas, tanto como destruíram outras... mas é oque é, e eu não me arrependia de nada.

Sentado escutando meu próprio julgamento, todo o peso da culpa, do fracasso e da perda pareciam cair sobre meus ombros, eu estava esgotado. A farsa para disfarçar que ainda não sentia meus ossos doendo, dor que aguentei por ela, para manter a sanidade quando tudo que eu queria era perguntar o porquê, porque ela me traiu daquela forma, quais foram suas motivações e razões para estragar tudo, que demoramos para construir. Eu sabia que sairia inocentado disso tudo, porém uma parte de mim, preferia a morte do que encarar uma vida onde Any Gabrielly seria minha eterna inimiga.

Horas e mais horas, Noah estava dando seu melhor, mas May tinha muitas explicações e evidências para suas acusações. Talvez fosse isso, talvez fosse esse o fim, na manhã seguinte o jornal nacional anunciaria que Josh Beauchamp, herdeiro dos Beauchamp, era na verdade o maior criminoso do país e o dono da máfia mais temida no mundo e por mais que isso assustasse a todos, eu estaria conformado em morrer atrás das grades, não existia mais nada que eu quisesse lutar para sobreviver. Eu tive e tenho tudo, fui a lugares mais lindos e desejados do mundo, conquistei oque nenhum homem já conquistou e fiz oque poucos fizeram... meu nome seria história de inspiração para futuras bocas e lição de moral em escolas. O grande e poderoso senhor Beauchamp, o grande final.

— Testemunha Any Gabrielly, você promete diante de Deus a dizer a verdade e somente a verdade? -o juíz declara e meus olhos vão até a cacheada.

Era a segunda vez que eu a via, sendo a primeira, quando ela entrou na sala de interrogação pedindo para mim assumir a culpa. Ela estava lá, vestida com roupas baratas mas elegantes, a pouca maquiagem parecia tentar esconder as olheiras profundas e o batom destacava os lábios inchados de tanto morder, sua ansiedade estava no ápice.

— Senhorita Gabrielly foi parte da investigação em busca do dono dos The Wolfs, ela foi sequestrada por meses mas devolvida ilesa, meses depois saia na mídia o relacionamento dela com o senhor Beauchamp, e ninguém melhor do que alguém que esteve perto desse monstro pode confirmar as horrendas coisas que ele fez! -o acusador dizia em alto e bom tom, fazendo com que caísse todos os olhares para a moça que parecia perdida.

— Eu tive sim um relacionamento com o senhor Beauchamp, mas não diria que me senti próxima dele... -ela começa e seu olhar cai para mim- Porque o homem que eu conheci, não seria capaz de fazer tudo que estão acusando ele de fazer... Eu vi e conheci o lado mais vulnerável dele... ele foi o único que esteve comigo quando eu fui acusada por matar minha própria mãe, ele pagou advogados, me deu um lugar para ficar, mas de certo, ele não é o homem que eu pensei que ele era... -uma lágrima solitária cai do seu olho e eu queria desviar o olhar, doía tanto, eu sofria tanto- Josh Beauchamp com toda sua riqueza, com todo seu poder e influência, perdeu oque era mais valioso naquela noite onde sua família foi destruída... e eu não posso afirmar que ele é um criminoso, mas posso dizer que ele nunca foi o mesmo, nós nunca mais fomos os mesmos...

— Mas a senhorita presenciou algum ato criminal dele? Viu alguma atividade suspeita? -a voz do homem me irritava, ela estava chorando e eu a odiava tanto neste momento, mas ainda sim, queria mandar ele calar a boca e deixá-la respirar.

— Oque eu vi e oque eu sei é que Joshua é um irmão e quase pai para suas irmãs, ele protege aqueles que ama com a vida se for preciso e que o resto é só o resto para ele. Obrigada meritíssimo.

Any se levanta e a plateia vai a desordem, gritos inconformados, gritos de afirmação, os policiais do local tentavam colocar a ordem junto com o juíz mas nada disso me importava, apenas o fato de ver ela mais uma vez indo embora e ainda não compreender o porquê, me destruía mais do que eu já estava destruído. Por que ela se foi? Por que ela estava ali? Por que tentou me convencer a entregar tudo? Por que não entregou tudo? Por que ela tinha que ser assim? Por que tinha esse efeito em mim? Tantos porquês e nenhum deles havia uma resposta e eu a odiava por isso.

O julgamento foi encerrado duas horas mais tarde, fui inocentado por todos os crimes, de menos lavagem de dinheiro, mas isso resultou em uma multa que pagaria e não afetaria nada em minhas financias.

Para sair do fórum tive que ter minha própria escolta, mais uma vez jornalistas se amontoavam encima de mim querendo apenas uma faísca de atenção, achavam que eu era uma cópia da minha mãe, que sorria e acenava com elegância; mas eu os odiava mais do que podia imaginar.

Voltando para a casa, Noah e os outros comemoravam o fato de mais uma vez a máfia estar intacta, festejavam e bebiam mas na minha mente, a imagem de Any me assombrava e eu queria arrancá-la dali, queria arrancar meus pensamentos, meus sentimentos, meu coração, porque tudo isso pertencia a ela. Infeliz o dia em que eu decidi amar aquela mulher, infeliz o dia que meu coração decidiu se entregar para ela e maldita seja minha lealdade, porque mesmo depois de tudo, a promessa de que eu sempre cuidaria dela e sempre estaria ali, ainda estava intacta e eu era um grande tolo, eu era um homem soberbo e cheio de si, mas burro em meus sentimentos e escolhas de amar a ela