Capítulo 1

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Mirabel nunca tinha saído daquela vila, então não fazia ideia de onde era Londres ou até mesmo aonde estavam agora. Perguntou para a mulher quanto tempo até chegarem, ela sorriu e disse "Chegaremos na pousada logo logo, querida. Londres está a mais de um dia de nós."

Por algum motivo, parecia que Mirabel não conseguia interagir com aquelas pessoas. Passou a vida toda sendo reduzida a uma formiga, que receber todo esse carinho e atenção a estava deixando sufocada. Mal perguntou o nome daqueles desconhecidos, apenas permaneceu quieta e parada como uma rocha. Tinha medo de que se abrisse a boca, mudassem o jeito de falarem com ela de uma hora pra outra e tudo aquilo que parecia ser uma mudança de vida fosse mentira.

Chegou a passar em sua cabeça que aquilo era tudo encenação e que seu irmão a havia vendido. Mas Alexander não é homem que aceita ser mandado e provavelmente nunca levou um tapa como aquele na vida... não, não tinha como aquilo ser mentira.

Colocou seu rosto próximo a parte aberta da carruagem, observando o sol se pondo ao longe e tentando processar toda a situação em que foi colocada de uma hora para a outra.

De manhã, ela estava coletando ovos e alimentando animais. Agora, quase 19 horas da noite, estava em uma carruagem com pessoas que se vestiam como nobres. Como entender algo se não tinha coragem de perguntar nada?

- Você está muito quieta, está se sentindo enjoada? Quer que paremos um pouco? - Sua supostamente tia, estava olhando para ela preocupada. As rugas já trazidas pela idade ficavam bem expressas em sua testa, mostrando que a preocupação é real. Desconcertada, tossiu antes de responder.

- Não, senhora. Só estou...deslocada, nunca saí de onde cresci.

A mulher olhou para ela com muita curiosidade, um misto de compreensão melancolia passava por seus olhos. " pobre menina", ela pensava.

- Temos muito a conversar, Mirabel. Você foi omitida de muitas coisas. - Agora era a vez de Mirabel franzir a testa.

Tomando fôlego e vencendo a timidez, tomou coragem para lhe perguntar o seu nome.

- Oh, meu nome? Esqueci até mesmo de nos apresentar... - Ela parou de falar e pensativa pegou as mãos da jovem nas suas. - Que nome disseram a você que é o seu ?

Estranhando aquela pergunta, Mirabel a olhou estranho. Começou a pensar se essa mulher é louca.

- Mirabel, senhora. Desde que nasci.

- Mas o seu nome não é somente Mirabel, querida. Não não, você carrega o meu sobrenome, isso é algo que não queriam que você soubesse. - Mirabel não estava estendendo nada daquela conversa.

- Sinto em dizer que não estou a compreendendo, senhora.

A mulher olhou triste para ela, percebeu que Mirabel nem mesmo desconfiava de quem eram e o que faziam ali.

- Minha queria Mirabel, me chame de tia Beatriz. Você me perguntou quem sou, sou a duquesa de Belmonte e você, querida, é minha sobrinha. O homem quem foi falar com você, é seu tio Antony, irmão de seu pai e general do exército de Vossa alteza Real. O outro homem é seu primo, se chama Albert,  está sob comando de meu marido e é nosso filho. -  Mirabel nunca nem mesmo havia ouvido esses nomes na vida. Fazia sentido ela não ter vindo com mais ninguém para protege - lá se isso realmente fosse tudo verdade, para que escolta se tinha o general do exército e um soldado ao seu lado ? Por isso seu irmão nem mesmo pensou em resistir.

Não segurando a dúvida que a assolava, falou sem rodeios.

- Acredito que a senhora se confundiu. Eu não passo de uma menina que nasceu no campo e se tornou órfã. Meus pais morreram de varíola quando eu tinha 10 anos. Eu não sou ninguém especial, senhora.

Uma lágrima rolou pelo rosto da tia, que respirou fundo e virou o rosto para olhar para a frente.

- Mais tarde você entenderá tudo, vejo que acabamos de chegar na pousada. Graças aos céus, estou faminta! - Segundos depois, a carruagem parou de andar e Mirabel assustada olhou pela janela.

Havia várias carruagens de modelos bonitos e refinados paradas a frente de um estabelecimento. Ela nunca tinha visto algo como aquilo, estava totalmente perdida, mal sabia em que olhar.

Com a ajuda de um dos homens, desceu da carruagem e juntos foram até a recepção da pousada. Pouco tempo depois, já estava na área de refeição, com uma mesa farta exposta a sua frente.

Assim que entraram na pousada, dúzias de empregados tinham surgido pegando seus casacos, lhe oferecendo serviços e mostrando onde deveriam ir para comer. Mirabel estava tonta com tanta informação em tão pouco tempo.

Tinham comidas ali que Mirabel sequer imaginou que existissem. Estava acostumada a comer ovos, carne de porco e leite. Até mesmo caviar tinha ali, mas ela não saberia disso.

- Coma, minha sobrinha. Não se preocupe, seremos bem recebidos aqui. - O homem, que reconheceu como sendo o tio Antony, a encorajou.

Sem saber o que fazer, imitou o seu primo, que se assentou e pediu para lhe servirem uma grande porção de lagosta. Ela só sabia o que era porque na cidade sempre via pessoas ricas comprando de feirantes afortunados bichos desse tipo. Ela tinha medo só de olhar aquele bicho enorme exposto para venda, mas como não sabia como reagir, pediu a mesma coisa.

Seu primo olhou para ela e sorriu.

- Gosta de lagosta, senhorita? - Ela demorou um pouco para perceber que ele se referia a ela, estava preocupada olhando para toda prata e ouro expostos na mesa em forma de talheres e louças. Mal sabia qual dos vários talheres ali deveria usar para comer.

Sorrindo timidamente, passou a mão pelos longos cabelos castanhos claros.

- Receio em te dizer, senhor, que nunca coloquei um pedaço na minha boca de algo que não fosse cultivado na minha antiga casa. - Albert olhou como pena para ela, sabendo que a prima com certeza sofreu muito. Ele engoliu em seco e lhe deu um sorriso sem graça.

- Lamento ouvir isso, minha prima. - Ela ainda não havia se acostumado com ouvir lhe chamarem de sobrinha e prima, não tinha entendido como eles eram seus parentes. Muito menos entendido como ela poderia ser linhagem nobre ao invés de uma menina que mal tinha onde cair morta.

O casal se sentou junto a eles na mesa e após serem atendidos pelos empregados perguntaram sobre o que conversavam. Albert, evitando constrange - lá, disse somente que falavam de comida.

- Seu primo ama comer, não sei como se mantém em forma para servir no exército com Antony.

Albert apenas ignorou a fala da mãe, começando a comer a lagosta que foi servida para ele e logo em seguida para Mirabel.

Ela olhou para o prato, sem saber nem mesmo pro onde começar a comer. Não sabia ao menos o que era comestível, na verdade. Enquanto seus tios conversavam sobre algo que ela não conseguia prestar atenção, observava discretamente o seu primo comer e o imitava.

Quando comeu o primeiro pedaço, sentiu que ia explodir de felicade. Nunca havia comido algo igual, não mesmo.

Após comerem, seus tios voltaram a atenção para ela.

- Agora que estamos satisfeitos, podemos colocar Mirabel a par da situação. - Seu tio começou a falar, a esposa o encorajando. - Seus pais, os verdadeiros, morreram a cerca de 3 meses atrás, Mirabel. Antes de minha irmã morrer, ela me confessou algo que eu nunca imaginei na minha vida. - Ele tomou um gole de seu vinho, antes de continuar. Albert apenas os observava, sem interromper.

Vendo que seu marido ficou abalado, sua esposa continuou a falar.

- A sua mãe, contou a Antony que quando era nova, engravidou de seu pai antes de se casarem, como era muito jovem e tinha medo de que sua reputação fosse arruinada, entregou a bebê para a empregada cuidar assim que você nasceu, pouco tempo depois do casamento. Porém, ela pretendia simular uma gravidez e depois assumir você, mas a empregada sumiu e nunca mais soubemos a seu respeito. - Ela passou a mão pelos olhos lacrimosos.

- Até pouco tempo, quando seus pais faleceram e falaram que estava a anos com suspeita de que você estava morando com aquela família no vilarejo. Seus pais verdadeiros também sucumbiram a varíola, mas antes de morrerem conseguiu nos contar as informações necessárias e te achamos. - Antony finalizou.

- Bem vinda a família, prima ou melhor, Lady Mirabel Belmonte. - Completou Albert, sorrindo para ela.

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