Capítulo 49 - Abrigo tibetano

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O AR RAREFEITO GOLPEAVA os pulmões, e o sol, implacável, refletia na neve imaculada que cobria os picos montanhosos do Tibete. Uma paz ancestral pairava sobre o vale, interrompida apenas pelo som do vento uivando através das passagens estreitas entre as rochas. Aninhada entre as montanhas, encontrava-se uma pequena cabana de madeira, com suas paredes enegrecidas pelo tempo e pelo fumo das fogueiras. A fumaça que se elevava da chaminé desenhava arabescos no céu azul intenso, contrastando com a brancura da neve.

— Venha. Ajude-me a carregar a sua amiga.

A voz da velha chinesa era firme. Beatriz não ousava desacatá-la em suas ordens. Agarrou os tornozelos de Fabiana com as mãos livres e a espada celeste presa às costas por fiapos da sua roupa. Pouco depois, viu a porta da cabana ser aberta pelas mãos delicadas de uma moça loira que as recepcionou alarmada. Com seus grandes olhos azuis arregalados, ela se voltou para Caihong Chen, que pediu, esbaforida:

— Nos ajude aqui, Alex. Essa garota está muito ferida.

A de cabelos claros aparentava ter vinte e poucos anos em sua postura ereta. Possuía estatura mediana, braços definidos de musculação e corpo esguio. Tirou o casaco pesado que usava por sobre o torso antes de levantar Fabiana sozinha em seu colo. A pousou sobre uma das duas camas de madeira posicionadas dentro da residência pequena e lhe conferiu a pulsação pelo pescoço, com os dedos sobre a sua artéria carótida.

— Cuidado com o braço dela — recomendou Beatriz à loira. — A fratura está bem feia.

Houve um breve contato visual entre as duas moças que só foi interrompido com a aproximação de Caihong. A mulher segurou os ombros da jovem aprendiza de Pietra Del Cuzco e ordenou que ela se sentasse na cadeira que ficava de frente para a lareira do casebre.

— Você também está muito ferida — disse, apontando para a sua coxa esquerda enfaixada. Uma mancha de sangue parecia querer continuar se espalhando na superfície do tecido, o que denotava cuidados médicos emergenciais. — Essas contusões em seu rosto eu posso cuidar com unguentos que tenho condições de preparar em minha cabana, mas a sua perna vai precisar de pontos e, provavelmente, reconstituição cirúrgica que só um médico especialista pode fazer em um hospital.

Bia se sentou, sentindo todo o peso do cansaço daquele dia extenuante sobre os ombros. Observou o cenário ao seu redor antes de perceber que a casa modesta da feiticeira se assemelhava em tudo às histórias que Pietra costumava contar a seu respeito. Da época em que ela prestava os seus serviços mágicos ao Conciliábulo Dubhghaill.

— Podemos dar a ela um chá para liberar as suas vias aéreas. Ao que tudo indica, ela inalou algum tipo de gás tóxico que prejudicando a sua respiração. — disse a moça loira sobre Fabiana, voltada para Caihong e Beatriz. — Além disso, com os poucos recursos que temos nessa cabana, não podemos fazer muito mais por ela. É melhor que a ruiva seja levada a um hospital o mais rápido possível.

Chen fez um meneio, autorizando a outra a preparar em sua cozinha o chá mencionado por ela. Logo depois, a feiticeira apanhou algumas folhas vegetais que guardava num armário pregado numa das paredes com a intenção de preparar um concentrado fitoterápico que ajudaria Beatriz a suportar as dores que sofria. Sobre o tampo de uma mesa lateral, dividindo agora espaço com a jovem loira, a asiática movia as mãos ágeis, despedaçando e amassando as ervas a que tinha acesso.

As memórias de Bia se voltaram imediatamente para a sua estadia em Machu Picchu. Para a sua mestra peruana e o seu conhecimento ímpar sobre plantas e folhas medicinais.

— Pietra falava muito bem de você — disse, sem pensar muito. — Ela dizia que você era uma boa amiga. Que as duas eram muito próximas desde os tempos de Conciliábulo Dubhghaill.

Rosa e Dália: O Despertar das BruxasOnde histórias criam vida. Descubra agora