5- Lembranças da terra antiga

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Emergi dos corredores frios da torre, cada passo ressoando como um eco distante, carregado pelo peso de anos de isolamento. O ar lá dentro era sempre denso, pesado, impregnado pela presença de segredos e sombras. Naquela última noite, sonhos inquietos haviam me assombrado – sombras dançavam nas bordas da minha mente, sussurrando segredos que se dissolviam antes que eu pudesse compreendê-los. Meu corpo, desgastado pela rotina cruel, carregava a carga de anos de treinos e provas brutais, e a cada passo que dava, sentia a torre se desvanecer atrás de mim, como uma lembrança distante e sufocante.

Ao empurrar a pesada porta de carvalho, a luz do sol me atingiu como uma lâmina afiada, cortando a escuridão que havia envolvido minha vida por tanto tempo. Estreitei os olhos, levantando a mão para bloquear o brilho ofuscante. A claridade era quase hostil, uma lembrança cruel de que o mundo lá fora seguia seu curso, indiferente ao que se passava nas profundezas da torre. Mas havia algo de revigorante naquela luz, algo que fazia meus sentidos, antes embotados, despertarem novamente.

Quando o calor do sol tocou minha pele pela primeira vez em anos, foi como uma chama suave, queimando com uma doçura esquecida. O calor penetrou minha carne pálida e fria, me lembrando de que ainda estava vivo. A sensação, embora desconfortável, trouxe consigo um tipo estranho de prazer – uma lembrança de que, mesmo envolto nas trevas, eu ainda pertencia a este mundo. A minha volta, o ar estava impregnado com o cheiro de terra recém-molhada, uma fragrância terrosa que contrastava com o ambiente estéril da torre.

Diante de mim, uma carroça de madeira esperava, suas rodas mergulhadas na lama, como se até mesmo o veículo sentisse o peso da jornada que estava por vir. Ao lado dela, um cocheiro de rosto familiar, mas distante, quase apagado pelas brumas do tempo. Ele parecia mais uma figura espectral do que um ser humano, mas, ao focar mais no rosto deformado, as memórias começaram a retornar como um trovão distante.

Então, ouvi a voz de Draco reverberar dentro da minha mente, fria e autoritária como sempre: "Ele será seu servo durante a missão. Conhece todos os detalhes."

Draco emergiu da torre, sua figura sempre imponente, as sombras se enrolando ao redor de seus ombros como uma capa viva. Seus olhos, que sempre pareciam ver além deste mundo, agora carregavam uma intensidade que me fez hesitar. Ele trazia algo nas mãos – um presente. Uma adaga pequena, mas com um poder quase tangível. A lâmina, forjada em um formato serpentino, brilhava à luz do sol como uma criatura viva. Seu punho era feito de osso antigo, adornado com pedras preciosas que cintilavam com um brilho faminto, como se absorvessem a energia ao seu redor.

"Esta lâmina," Draco começou, sua voz um sussurro gélido, "foi forjada nas profundezas de um vulcão antigo, imbuída com o sangue daqueles que falharam nas provas. Ela será uma extensão da sua vontade, Isaac. Uma arma para aqueles que caminham entre as sombras."

Segurei a adaga, e sua frieza rastejou pela minha pele, um arrepio percorrendo minha espinha. O peso da arma era quase leve demais, como se estivesse ansiosa para ser usada, para provar sua letalidade. Eu sabia que, com ela em minhas mãos, o sangue seria inevitável. A escuridão ao meu redor parecia responder à arma, e uma conexão invisível se formou entre nós.

Olhei para o cocheiro, meus olhos estreitando-se enquanto tentava recordar onde havia visto aquele rosto antes. Então, como uma resposta a um enigma que se revela no último segundo, a memória retornou. "Retalho," murmurei, reconhecendo o homem que havia sido meu instrutor durante os dias mais brutais do treinamento. Seu rosto era um mosaico grotesco de cicatrizes e costuras, mas os olhos, sempre frios e calculistas, eram os mesmos.

"Então é você que vai me acompanhar nesta missão?" perguntei, meu tom carregado de um cinismo velado.

Retalho – ou Zathor, como ele se apresentou – sorriu, suas cicatrizes esticando-se como um mapa de dor. "Acha que deixariam você ir sozinho?" Sua voz era surpreendentemente suave, quase um sussurro, em contraste com sua aparência brutal. "Alguém precisa garantir que o trabalho seja feito."

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