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Lisboa, Janeiro de 1970

José da Costa acabava de descer do comboio que o trouxe a Lisboa juntamente com a sua única filha Juliette de 15 anos acabados de fazer.

De madrugada, ainda não se via vivalma nas ruas da aldeia de Rojas, saíram os dois de táxi rumo à estação do comboio.
Naquela noite fria de Janeiro tinha caído um nevão e a mãe de Juliette,  Ana de seu nome, aconchegava-lhe o casaco de lá que havia terminado de confeccionar dias antes.

As duas abraçaram-se a chorar numa despedida que prometeram não ser longa.

- Eu volto mãe.  Eu prometo que volto.

- Vai com Deus minha filha.  Assim que puderes, manda notícias

- Vá lá, acabem com a choradeira.  Vamos Juliette que o comboio não espera.

E foi assim que Juliette foi parar a Lisboa.  O pai, agricultor e a mãe costureira mal ganhavam para o sustento da casa.  Era preciso que Juliette arranjasse um emprego e na capital é que estavam as oportunidades.

Ela bem argumentou que ia para o campo com ele ou ficava a costurar com a mãe, mas não adiantou.  O pai queria livrá-la dos olhares do filho do padeiro.  Irineu tinha 3 anos a mais que ela e fama de mulherengo.

José tinha uma prima em Lisboa que se prontificou a ajudar a arranjar trabalho para Juliette.

Rute era casada com Fausto e não tiveram filhos.

José e Juliette bateram à porta da prima já o dia estava para terminar.  Esta estava avisada e esperava-os com um jantar reconfortante.   Bem agradecidos ficaram pois não tinham comido o dia todo desde que de madrugada tomaram uma pinga de café com um pedaço de pão.

- Prima desculpa a trabalheira.  Espero que ela se comporte por cá.

- Amanhã vou com ela a casa de uns fidalgos pois a cozinheira da casa diz que estão a precisar de mais gente. Se ele quiser e souber, trabalho não será problema.
O primo fica cá quanto tempo?

- Vou no primeiro comboio amanhã.   Tenho as hortas e os animais para tratar.  Se eu não faço ninguém faz.

Juliette permanecia calada.  Desde que saiu de sua casa e se despediu da mãe a única coisa que fez foi chorar.  Durante todo o percurso de comboio encostou a cara à janela e deixou as lágrimas cairem.

Agora em casa da prima tentou contê-las para não ter que ouvir reprimendas.   Foi ali despejada como se uma mercadoria fosse.  Em momento algum pediram a sua opinião.

Depois de jantar quis saber onde ia dormir e logo  se recolheu.  O pai ficou a conversar com os primos e a lamentar a vida na aldeia.

Sózinha no quarto  Juliette voltou a chorar mas depressa adormeceu tal era o cansaço.

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