VI

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- Mariazinha dá-me um copo de àgua.

- E precisavas vir à cozinha beber àgua?

- Vim ver-te, não posso?

- A mim?  Vieste ver esta velha?  Eu conheço-te bem.

- Olá Juliette.

- Olá menino.

- Sai daqui seu safado.

Já tinha passado um mês desde que Rodolffo e Isabel chegaram.  Sempre que tinha oportunidade, Rodolffo aproximava-se dos locais onde Juliette estava.  A pretexto de uma ou outra coisa ele fazia questão de se mostrar presente.

Hoje era dia de folga dela e ele observava-a a sair pelo portão principal.

Noutras vezes já a tinha seguido para saber o que ela fazia no seu dia livre.  Habitualmente ela ia para o  parque de lazer.  Deitava-se na relva, lia um livro, comía o lanche que levava e assim passava o dia sozinha até regressar ao fim do dia.

Rodolffo avisou que ia sair com alguns amigos e não voltava para o almoço.
Pegou as chaves do carro que o pai pôs à sua disposição e saiu.

Dirigiu em direcção ao parque, estacionou e depois percorreu o espaço à procura dela.

Encontrou-a à beira do lago a olhar para uns casais de patos que ali nadavam.

- Até os patos gostam de companhia.  Porque estás sózinha?

Juliette assustou-se ao ouvir aquela voz atrás dela.

- Que susto, menino.  Eu não esperava.

- Só Rodolffo.   Desculpa se te assustei, mas porque ficas sempre sózinha no teu dia livre?

- Porque gosto, mas também não tenho amigos em Lisboa.

Rodolffo sentou-se ao lado dela e começaram a conversar.

- Devias frequentar espaços com mais gente.  Aqui não tem muita gente principalmente nas terças feiras que todo o mundo está a trabalhar.   Conhecer pessoas e fazer  amigos é bom.

- Eu gosto desta paz.  Eu sinto-me bem aqui.  Tem uma coisa que eu gostava de fazer, mas agora não dá.

- O que é?  Talvez eu possa ajudar.

- Ah, deixe.  Não vai incomodar-se comigo.

- Diz lá.

- Gostava de ver o mar e a praia.

- Nunca viste o mar?  Anda daí que esse desejo eu posso realizar.

- Não quero abusar.  Imagine perder tempo com uma serviçal?

- Juliette essa expressão eu não gosto.  É um trabalho como outro qualquer e no fundo todos somos serviçais.

- Desculpe, é força do hábito. 

- Agora levanta-te e vamos conhecer o mar.

Rodolffo conduziu durante cerca de meia hora e estacionou o carro no parque mesmo defronte para o mar.

Ajudou Juliette a sair do carro  e levou-a até à muralha.
Estavam na praia de Carcavelos, uma das maiores da linha de Cascais.

- Posso ir até à agua?

- Podes.

Juliette tirou as sandálias e correu para a areia.  Rodolffo ficou sentado na muralha  segurando o calçado dela.
Foi ao carro buscar a máquina fotográfica e tirou algumas fotos dela.

Juliette assim que sentiu a àgua molhar os seus pés, olhou para trás e chamou-o.

Rodolffo descalçou os ténis e meias, guardou-os no carro juntamente com as sandálias dela e desceu as escadas.  Naquele momento agradeceu ter vestido as bermudas em vez de calças.

- Rodolffo,  segura na minha mão.  Eu pus o pé ali à beira da àgua e a areia fugiu.

Rodolffo soltou uma gargalhada, segurou firme na mão dela e levou-a até à àgua.
Por um instante ela desiquilibrou-se quando uma onda mais forte veio e não fossem os braços fortes de Rodolffo, talvez ela tivesse sido arrastada.
Ele segurou-a firme pela cintura e ela com medo passou os braços à volta do pescoço dele.

Estavam demasiado próximos.  Juliette tinha a cara encostada no peito dele e podia sentir o bater forte do coração.   Ele baixou a cabeça e inspirou o perfume do cabelo dela.

- Vamos voltar. - disse ela.

- Senta aqui um pouco na areia.  Ouve só o barulho das ondas.  A praia está silenciosa pois não tem muita gente.  Na próxima vez trazes o biquíni para tomares banho.

- Eu não tenho.  Preciso comprar, mas eu tenho medo de entrar ali. Não sei nadar.

- E se eu entrar contigo?

- Não está certo o Rodolffo perder o seu tempo comigo.

- Eu gosto de estar contigo.  Eu quero fazer isto mais vezes, mas estou com pena porque daqui a dois meses vou  embora de novo.

- E quando volta?

- Nas férias, como agora. Ju! - vou tratar-te assim e quero que me trates por tu, pelo menos quando estamos sózinhos.

- É que depois lá em casa eu posso descuidar-me no tratamento e eu não quero ser despedida por isso.

- Não vais.  Vamos almoçar aqui na praia?  Eu ofereço.

Regressaram ao carro e lavaram os pés num dos chuveiros disponíveis.   Escolheram uma das esplanadas e por ali ficaram a comer e a conversar sobre o mundinho de Juliette na aldeia e também a cidade  suíça onde Rodolffo estudava.

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