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CHRISTOPHER UCKERMANN

A minha mãe é bipolar.

Demorou anos para receber o diagnóstico correto, porque o transtorno era confundido com outras doenças mentais com sintomas semelhantes, o que afetou a vida dela pra caralho.

E, por consequência, a minha.

Ela oscilava entre períodos depressivos e episódios de mania, que ocasionavam mudanças comportamentais abruptas. Ia de euforia à profunda tristeza em uma velocidade alarmante. Como resultado, não conseguia se manter em nenhum emprego nem cultivar relacionamentos duradouros.

Engravidou aos dezoito anos e saiu da casa dos pais, cortando por completo o contato com eles, para viver com o namorado. Não conheço o meu pai biológico, porque a relação não durou nada, assim como as que vieram depois.

Havia um padrão. Ela conhecia um homem, se apaixonava loucamente, os primeiros meses eram tranquilos, até os problemas começarem. O amor virava ódio e o cara desaparecia das nossas vidas.

Nunca ficavam tempo suficiente para que criássemos um vínculo.

Quando eu tinha sete anos, ela engravidou novamente. Como aconteceu comigo, Poncho também não conheceu o pai. Eu mesmo não consigo me lembrar do rosto do sujeito, só que se chamava João e que às vezes me levava para tomar sorvete.

O nascimento do meu irmão foi agridoce. Fiquei feliz por ter alguém para brincar, mas, ao mesmo tempo, assumi uma responsabilidade para a qual não estava preparado. Nos períodos sombrios da minha mãe, cabia a mim cuidar dele.

Uma criança cuidando de um bebê.

Vivíamos como nômades. Sempre que tinha um episódio de euforia, Alexandra achava que a oportunidade da sua vida estava em outra cidade, arrumava as nossas malas e pegávamos a estrada.

Sem qualquer planejamento.

Já passamos a noite em rodoviárias, em casas de estranhos que ela conhecia aleatoriamente e ofereciam abrigo temporário, em pensões precárias. Já fui dormir com fome quando o dinheiro acabava antes do previsto.

As mudanças constantes me impediram de fazer amigos e só consegui terminar a escola porque gostava de estudar e era dedicado.

A vida era um caos até Rubens Lacerda aparecer.

Ele conheceu minha mãe no hospital e, segundo o homem, foi amor à primeira vista. Embora fosse psiquiatra, não era o médico dela, mas buscou informações sobre a mulher, conversou com o colega que a estava acompanhando e foi o primeiro a desconfiar da bipolaridade.

O tratamento e os remédios corretos estabilizaram a saúde mental de Alexandra e foi a primeira vez que a vi equilibrada, serena, demonstrando controle sobre as próprias emoções.

Mas o estrago já havia sido feito.

Poncho tinha oito anos e um irmão mais velho que fez o possível para blindá-lo, por isso quase não foi afetado. Eu não tive a mesma sorte. Viver quinze anos em um ambiente tão instável me transformou em um moleque cheio de inseguranças, traumas e com a mente fodida.

Só me sentia tranquilo se tivesse cada passo do meu dia calculado, se soubesse o que aconteceria do momento em que acordasse ao que fosse dormir. Se qualquer coisa, por menor que fosse, não saísse conforme o planejado, eu afundava em crises de ansiedade que evoluíam para síndromes de pânico.

O diagnóstico veio rápido: TAG, Transtorno de Ansiedade Generalizada.

Rubens, na época somente namorado da minha mãe, foi às consultas e acompanhou cada etapa do tratamento de perto, que envolvia remédio, terapia e mudança no estilo de vida.

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