A claridade do início da manhã começa a atravessar as minhas pálpebras fechadas e me desperta aos poucos. Sinto um peso opressor em cima do meu corpo e isso faz com que eu tenha dificuldade para respirar. Tento me mexer para me livrar desse incômodo, mas reparo que meus braços estão presos, então abro olhos para ver o que está acontecendo.
A luz do sol está se infiltrando timidamente pela cabine do Capitão e consigo escutar poucos barulhos do lado de fora, como o som das ondas e de alguns passos ecoando pelo convés. Olho para baixo para descobrir o que está me esmagando e meu queixo esbarra em um ombro.
Durante a noite, Vane deve ter me confundido com um urso de pelúcia, pois só isso explicaria a posição que estamos agora. Metade de seu corpo está em cima do meu e nossas pernas estão totalmente emaranhadas. Há um braço embaixo do meu pescoço e outro cruzando o meu corpo, prendendo meu braço em um abraço muito apertado. Viro meu rosto e encontro algo que nunca havia visto antes.
O rosto do Vane dormindo.
Até esse momento, não havia percebido que nunca o vi dormir, pois sempre apagava primeiro e era a última a acordar. Observo sua expressão serena, os lábios levemente abertos e escuto o ressonar baixinho que saí pela garganta. Meus olhos vagueiam pelo seu rosto e então descem, passam pelo seu ombro e param logo abaixo, quando percebo que sua tatuagem está descoberta.
Meu peito se aperta de um jeito desconfortável. A sensação que tenho é a de que não deveria olhar para ela, como se fosse algo proibido. Vane sempre utiliza uma tira de couro para cobri-la e é visível a diferença de tom de pele da região ao redor da marca para o resto do corpo
Essa tatuagem não vê a luz do sol há anos.
Aos poucos consigo soltar meu braço do seu aperto sem acordá-lo e então, com suavidade, traço as linhas da marca tatuada com a ponta dos dedos. Elas estão tortas e imprecisas, as pontas têm alturas diferentes e alguns trechos estão quase totalmente apagados.
Vane deve ter a amado muito para ter feito algo assim e a dor de perdê-la deve ter sido devastadora.
— Eu posso cobrir ela se isso te incomoda.
Recolho a mão rapidamente, como se tivesse tocado em brasa. Meu coração dá um pulo dolorido e não consigo me impedir de guinchar igual um rato.
— Quando acordou? — Viro o rosto e me deparo com os olhos de Vane, ainda sonolentos, me encarando com atenção.
— Quando você soltou seu braço. — Sua mão segura a minha e a leva aos lábios para depositar um beijo casto nos nós dos dedos — Quer que a cubra?
— O que? Não! Eu... — tomo um tempo para ajeitar os pensamentos — Eu nunca pediria para fizesse algo assim. Essa garota foi alguém importante na sua vida e, infelizmente para você, já não está mais aqui. Não há motivo para ter que apagar essa parte da sua vida.
— Sabia que diria isso — um sorrio leve aparece em seu rosto — Mas queria que soubesse que faria qualquer coisa para que não ficasse incomodada sobre isso.
— Ah Vane, eu não sou esse tipo de pessoa. Estamos juntos, não estamos? — Ele acena — Para mim, isso basta.
— Eu tive tanta sorte em me apaixonar por alguém como você — ele murmura, antes de subir em cima de mim e cobrir meu corpo com o seu. Vane inclina a cabeça e beija meu pescoço — "Infelizmente para você"?
Seu corpo se sacode inteiro enquanto segura o riso e só então percebo o que falei.
— Aí, pela Deusa. Não foi exatamente isso que eu quis dizer. É triste que você a perdeu, mas olhando pelo meu lado... não isso também está horrível — começo a ficar em pânico e escutar sua risada aumentar não ajuda em nada.
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Entre Mares e Feitiços
RomanceLyssandra é uma bruxa do Frio que está presa à cidade de Perterin por causa de sua dívida com Vane, o temido capitão do navio Kanramarur. Essa dívida aumenta toda vez que ele vem à cidade e Lysandra se vê sem saída. Porém tudo muda quando Vane ofere...