O Inominável - Capítulo 37

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Era um dia bonito em Asshai.

Embora muitos de outros cantos de Essos ainda ousassem murmurar maldosamente sobre a cidade, dizendo que "aquele lugar estranho sem sol" não poderia ter qualquer beleza, ou que só o mal residia ali, quem realmente conhecia Asshai sabia que havia muito mais do que sombras e trevas. Havia um lar.

Mas havia outra metade que os respeitava, claro. Assim como Asshai respeitava outras religiões e crenças, tanto que havia uma diversidade imensa e abundante de tradições e culturas que eram ensinadas no Acampamento da Lua Sangrenta.

Ah, o Acampamento da Lua Sangrenta... outro que também estava lindo sob a fria manhã. Lindo, mesmo que não fizesse tantas luas desde a terrível guerra que assolou a cidade. As ruínas e danos que marcaram tanto a fortaleza quanto outros cantos da cidade foram restaurados, e o ínfimo tempo gasto na reconstrução foi graças ao uso ━━ ainda que discreto ━━ de magia.

Agora, Merikh estava recostada em um pilar de ébano polido, seu olhar interessado deslizando pela espaçosa sala de aula. A Anciã Ahren transitava suavemente entre os alunos atentos, que estavam acomodados em elegantes cadeiras de madeira escura. Cada estudante vestia um uniforme preto impecável, adornado com o símbolo dourado do Acampamento da Lua Sangrenta, e sobre os ombros, capas vermelhas vibrantes que caíam em cascata até o chão.

Merikh sentia falta de usar aquele uniforme.

Era aula de cura com magia ━━ a especialidade da Anciã Ahren ━━ desde os tempos em que Merikh fora uma estudante e talvez até muito antes. Para a prática, precisavam de cobaias, então haviam sido retiradas das florestas mais sombrias de Asshai, como Stygai, criaturas peculiares que serviriam para a tarefa.

Ahren observou atentamente enquanto uma aluna de cabelos escuros concentrava-se sobre um pequeno escorpião que sangrava sobre a mesa de ébano. O escorpião se contorceu dolorosamente e, apesar dos esforços da jovem, logo jazeu inerte diante dos olhares ansiosos dos demais alunos.

A mulher aproximou-se, sua presença calma e controlada, como sempre. Então, tomou o lugar da aluna e ergueu suas próprias mãos longas e pálidas sobre o corpo pequeno da criatura.

━━ Você colocou pressão demais no fluxo sanguíneo. Está tentando forçar a cura sem sentir o ritmo da vida.
━━ A voz da Anciã era suave, mas firme.

Os alunos ao redor observavam em silêncio enquanto Ahren fechava os olhos por um momento, se concentrando na arte que dominava com a mesma facilidade a qual respirava.

━━ É preciso sentir, não impor. Não forçar.
━━ continuou ela, movendo as mãos em um padrão lento, quase como uma dança.
━━ O sangue é vida, mas se tentarmos moldá-lo à nossa vontade, ele se rebela. Deve-se guiá-lo, fluindo como um rio. Nem demais, nem de menos. Apenas o suficiente. Direcione a vida apenas para onde a vida precisa ir.

Merikh quase esboçou um sorriso ao observar as expressões das crianças. Os olhares arregalados, grandes e amendoados, maravilhados com a habilidade da Anciã que, sem esforço algum, fez o escorpião erguer-se novamente. A criatura deslizava agora pela mesa da menina anterior, cujos lábios se abriram em pura surpresa.

Se lembrava de como Thaelor, Miraak e Saphira detestavam essas aulas no tempo em que foram estudantes. Mesmo com paciência em cada suspiro, a Anciã Ahren já havia golpeado os três com um livro, um aviso para que não dormissem mais durante suas explicações. Merikh e Astraea, por outro lado, absorviam cada detalhe, fascinadas desde as criaturas mais belas até as mais peculiares.

Astraea sempre soubera equilibrar bem a graciosidade com a brutalidade, algo que era impressionante ao mesmo que... Merikh não sabia como descrever.

Mas a Velaryon, desde criança, sempre teve algo diferente naqueles olhos, algo que Merikh nunca vira em outrem; como se escondesse sob sua pele de anjo o que realmente habitavam seu ser.

𝗡𝗜𝗚𝗛𝗧 𝗘𝗠𝗕𝗘𝗥 ☄Aemond Targaryen Onde histórias criam vida. Descubra agora