Capítulo 27

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O inverno chegou ao palacete como uma fera indomável. A neve se acumulava, implacável, nas janelas, e o jardim, que antes era um refúgio de tranquilidade, agora estava soterrado sob uma camada espessa de branco. Sair de casa era impensável, e o vento que uivava lá fora parecia determinado a nos manter presos entre essas paredes antigas. O mundo além do portão parecia distante, quase inexistente.

Eu acordava todos os dias nos braços de Lucien. Seu corpo quente me envolvia com uma posse doce, como se, mesmo dormindo, ele precisasse me sentir perto para ter certeza de que eu ainda estava ali. Era engraçado pensar em como o toque dele se tornara tão natural, tão necessário. No início, eu me encolhia, sempre esperando o pior, mas agora… Agora, o calor de sua pele era o que me ancorava nas manhãs frias.

— Dormiu bem? — a voz dele era rouca, os olhos, ainda fechados, pareciam sorrir antes mesmo de me encarar.

— Sim… — Eu me espreguiçava, sentindo os músculos relaxarem sob o cobertor pesado. — E você?

— Sempre durmo bem quando você está comigo — ele murmurava, me puxando para mais perto.

A neve lá fora parecia eterna, os dias se fundiam uns nos outros, mas aqui dentro, algo muito mais vivo acontecia. A nossa rotina, construída a cada manhã, era o que nos mantinha sãos. Passávamos as tardes na biblioteca, ele lendo em silêncio enquanto eu folheava algum livro antigo, ou apenas observava as chamas dançarem na lareira. À noite, quando o frio se intensificava, o calor do corpo de Lucien era minha única âncora contra o inverno que rugia lá fora.

Ele mudou. Eu via isso claramente. O monstro que eu temia na primeira vez que o vi parecia adormecido, controlado. Ele se alimentava de mim com regularidade, e aquela sede avassaladora, que antes o deixava à beira de perder o controle, agora era apenas uma necessidade fisiológica. Eu sabia exatamente quando ele precisava. Seus olhos escureciam ligeiramente, seu corpo ficava mais tenso, mas ele nunca dizia nada. Ele sempre esperava.

Na primeira vez, eu me encolhi, o medo do desconhecido ainda presente, mas agora, a mordida dele era uma dor suportável, quase familiar. Eu me acostumei a ela, e Lucien sempre era cuidadoso. Eu sabia que, no fundo, ele detestava me machucar, mesmo que fosse necessário. Mas a mordida já não importava tanto. O que importava era a forma como ele me segurava depois, o toque dele reconfortante, como se estivesse me pedindo desculpas sem palavras.

— Está tudo bem? — eu perguntava, mesmo quando sabia a resposta.

— Sim, tudo bem — ele sempre respondia, beijando minha pele suavemente onde havia mordido, como se pudesse apagar a dor.

Esses momentos de intimidade eram só uma parte do que nos unia. As noites eram intensas, cada toque dele me fazia perder o fôlego. Eu não podia negar o quanto o desejo crescia dentro de mim. A forma como ele me possuía, com tanta firmeza e ao mesmo tempo com uma ternura surpreendente, me deixava ansiosa por mais. Mas não era só o físico que nos ligava. Nas noites em que o silêncio da casa nos envolvia, conversávamos. Lucien me contava sobre o passado que o atormentava, sobre os anos de solidão que ele carregava como um fardo. Eu, por minha vez, falava dos meus pais, do que perdi, dos meus sonhos que pareciam tão distantes agora.

— Você sente falta da sua vida de antes? — ele perguntou uma noite, enquanto passava a mão pelos meus cabelos, os olhos fixos no teto.

— Às vezes — eu respondi, honestamente. — Sinto falta da liberdade, da minha forja, das armas que fazia. Mas… não sinto falta da solidão.

Ele ficou em silêncio por um momento, como se pesasse minhas palavras.

— Você não está mais sozinha, ma belle. Nunca mais.

The BelleOnde histórias criam vida. Descubra agora