LÍVIA BIANCHI
Assim que chegaram de volta à mansão, o silêncio se estendeu entre eles. Filipe estava visivelmente cansado, a expressão séria enquanto tirava o terno e se dirigia à cozinha. Lívia o observou de relance, sentindo a adrenalina correr por suas veias, não tanto pelo cansaço, mas pelo que havia feito mais cedo. Sem que ele ou De Luca percebessem, ela havia esbarrado no mafioso durante a reunião, e num ato quase inocente – mas deliberado – havia deslizado o relógio dele para a própria bolsa.
Lívia nunca havia pensado que teria "mãos leves", como diziam, mas o ato foi surpreendentemente fácil. Agora, ao voltar para a mansão, o peso daquele pequeno objeto no fundo da bolsa parecia queimar, enchendo-a de um misto de satisfação e nervosismo.
Ela se sentou no sofá da sala, enquanto Filipe voltava da cozinha com um copo de uísque na mão. Seu olhar a atravessou por um breve momento, antes de ele se sentar numa poltrona em frente a ela. Lívia percebeu que Filipe estava exausto, mas algo na sua expressão dizia que ele ainda estava avaliando o que havia acontecido na reunião.
— Algo aconteceu? — Ele perguntou, com sua voz baixa e contida, enquanto tomava um gole do uísque.
Lívia deu um pequeno sorriso, mas havia algo no ar, uma tensão sutil. — Não, nada de errado. — Sua resposta saiu mais rápido do que ela pretendia, como se quisesse despistar o verdadeiro motivo de sua inquietação.
— Você estava estranha na reunião — Filipe observou, seus olhos estreitados. — Distraída.
Ela balançou a cabeça, dando de ombros. — Talvez eu não me encaixe nesse tipo de ambiente.
— Talvez. — Filipe tomou mais um gole, mas a observava com intensidade. — Ou talvez tenha algo mais que você queira me contar.
O coração de Lívia bateu mais forte. Ele sabia? Não, não havia como ele saber. Ela havia sido cuidadosa, e Filipe não estava por perto quando o incidente ocorreu. O sorriso inocente dela se manteve firme, enquanto ela se recostava no sofá.
— Não há nada, Filipe. — Ela respirou fundo, tentando soar casual. — Só não estou acostumada com o seu mundo... ainda.
Filipe a encarou por mais alguns segundos, como se estivesse tentando ler algo nas entrelinhas de suas palavras. Então, balançou a cabeça, como se não quisesse prolongar a conversa.
— Certo — ele disse, finalmente. — Espero que você se acostume logo.
Lívia desviou o olhar por um momento, suas mãos nervosas mexendo-se sobre o colo. Ela sabia que, em algum ponto, Filipe descobriria o que ela tinha feito, mas parte de si também ansiava por esse momento. Ela queria ver sua reação, queria saber o que ele faria quando percebesse que ela havia roubado algo tão importante de um homem como De Luca, tudo para chamar sua atenção.
O som de algo caindo suavemente no chão trouxe Filipe de volta ao presente. Ele franziu o cenho e olhou para o objeto – o relógio de De Luca –, que agora descansava aos pés de Lívia, exposto como uma confissão silenciosa.
Filipe se levantou lentamente, pegando o relógio, observando-o com uma mistura de surpresa e irritação.
— O que é isso? — Sua voz saiu controlada, mas havia uma fúria contida em suas palavras.
Lívia engoliu em seco. Não havia mais como esconder.
— Eu... roubei. — Ela se ajeitou no sofá, tentando parecer indiferente, mas a tensão em sua voz a traiu.
Filipe segurou o relógio entre os dedos, sua expressão dura. — De Luca. Você roubou o relógio de De Luca. — Ele parecia estar processando a situação, mas seus olhos faiscavam de incredulidade.
Lívia deu de ombros, cruzando os braços em uma postura desafiadora. — Ele nem percebeu. Não é grande coisa.
Filipe riu, mas não havia humor em seu riso. Ele caminhou até ela, ficando de pé bem à sua frente, sua presença imponente fazendo-a sentir um arrepio.
— Você não tem ideia do que acabou de fazer. — Sua voz saiu em um tom perigoso, baixo, mas carregado de advertência. — Se ele descobrir, você estará morta. E não será eu quem vai te salvar dessa vez.
Lívia sentiu uma mistura de medo e excitação percorrer seu corpo. Parte dela sabia do risco, mas outra parte não conseguia deixar de se sentir satisfeita por ter conseguido realizar o ato. Tudo para ter a atenção de Filipe.
— Ele não vai descobrir — ela disse, desafiando-o com o olhar. — A menos que você conte.
— Eu não tenho que contar — Filipe respondeu, seu rosto mais próximo do dela agora, sua voz sombria. — Se ele der falta desse relógio e suspeitar de qualquer coisa, você já estará na mira dele. — Ele balançou a cabeça, claramente irritado. — Você é um problema que eu não esperava, Lívia.
Ela sorriu, satisfeita consigo mesma. — Eu sei que sou.
Filipe suspirou, seu rosto refletindo frustração. Ele recuou alguns passos, ainda segurando o relógio. — Não faça mais nada estúpido. — Sua voz saiu fria, cortante. — Essa foi a última vez que você se envolveu nos meus negócios desse jeito. Entendeu?
Lívia acenou levemente, tentando esconder o alívio que sentia. Ele não faria nada contra ela. Não agora.
Filipe deu mais um longo olhar para ela, antes de se virar e subir as escadas em direção ao quarto, deixando-a sozinha com seus pensamentos. O peso da noite ainda pairava sobre ela, mas havia algo mais agora – uma sensação de poder, de controle. Ela havia conseguido o que queria: a atenção de Filipe, mesmo que à custa de sua própria segurança. E, no fundo, Lívia sabia que aquele jogo perigoso entre eles estava apenas começando.
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Acordo Entre Sombras
FanfictionEm "Acordo Entre Sombras", Lívia Bianchi leva uma vida tranquila até que seu pai, Augusto Bianchi, entrega-a ao temido mafioso Filipe Beaumont para saldar uma dívida. À medida que Lívia é forçada a viver sob o domínio de Filipe, ela descobre que ele...